José de Matos-Cruz


IMAGINÁRiO169
01 MAR 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

IMPÉRIOS

 

Ambicioso, carismático, Mel Gibson representa, para a indústria artística de Hollywood, um profissional de sucesso - em carreira a rondar os três decénios, repartida por diversas facetas: actor, realizador e produtor - estas últimas distinguidas com Oscars da Academia. A sua notoriedade provém, no entanto, como protagonista de culto ao espectáculo, entre a acção dramática e a comédia aventuresca. A iniciação como cineasta revelou Um Homem Sem Rosto (1993) - em drama intimista, sobre um romance de Isabelle Holand. Pela saga histórica, O Desafio do Guerreiro (1995) travou-se na Escócia do Século XIII, tudo culminando com A Paixão de Cristo (2004) sob o signo da controvérsia. Através da sua companhia Icon Productions, fundada em 1989, Gibson supera-se, ao sagrar Apocalypto (2006) - editado em DVD, com chancela Lusomundo - em pleno declínio do Império Maia, prenunciando a Colonização Espanhola. Uma época de predação agónica, violência sacrificial, trágicas premonições, esplendor crepuscular. Um paroxismo civilizacional que impele Pata de Jaguar, habitante duma tranquila aldeia saqueada, a evadir-se pelo seu destino, do desígnio individual ao resgate familiar... Imaginário e ancestralidade fundem-se num ritual perturbador, prodigioso, cuja trama vivencial em dialecto Yucatec simboliza a linguagem libertária do humanismo e da universalidade IMAG.16-62-99.

MEMÓRiA

02MAR1898-1990 - Amélia Rey Colaço: Actriz, casada em 1920 com o actor Robles Monteiro (1888-1958), tendo formado a Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro (1921-1974) - «Emocionava-se com os grandes textos, adorava os clássicos e fazia tudo isso, contra tudo e contra todos, por esta simples razão: acreditava que o teatro é fascínio» (José Mendes).

04MAR1678-1741 - Antonio Vivaldi: Compositor italiano nascido em Veneza, autor da ópera Orlando Finto Pazzo (1714).

05MAR1858-1929 - José Relvas: «Sempre que me foi possível conciliar os deveres impostos pela Revolução, e os que eram inseparáveis do meu cargo, com um princípio de generosidade, não sofreu o meu ânimo a menor hesitação para se inclinar para a generosidade e para o perdão».

07MAR1843-1897 - Dr. [José Tomaz de] Sousa Martins: «Era um verdadeiro sábio, um artista de raça, orador de rara facúndia, professor com todos os talentos que se podem desejar, funcionário exemplaríssimo, dotado de inexcedível bondade, caritativo até ao excesso, carácter diamantino, como raras vezes se haverá encontrado outro - reunia em si os mais variados talentos e virtudes, como nunca vi associados n’outro homem» (Conselheiro Silva Amado - Escola Médica de Lisboa).

CALENDÁRiO

1916-02NOV2007 - Alexandre Babo: «Era um homem absolutamente apaixonado pelo teatro, bem disposto, inteligente, culto e simpático» (Alina Vaz).

07-28NOV2007 - No âmbito da comemoração dos 200 Anos das Guerras Peninsulares, Teatro Nacional de São Carlos apresenta D. João VI e Napoleão: Música Em Tempo de Guerra, concertos de música de câmara de finais do Século XVIII e de início do Século XIX; programa com coordenação musical de João Paulo Santos e comentários alusivos de Jorge Rodrigues, sendo interpretadas obras de João de Sousa Carvalho, Marcos Portugal, Sophie Gail ou Pierre Garat IMAG.156.

19NOV2007 - Em Santarém, Eunice Muñoz é distinguida com o Prémio Santareno de Teatro - Carreira, atribuído pelo Instituto Bernardo SantarenoLIMAG.129-136-155.

ANTIQUÁRiO

07JUN2007 - A Câmara Municipal de Alpiarça perspectiva a concessão, por noventa anos, de 162 hectares da Quinta dos Patudos, para instalar um empreendimento turístico de luxo. Segundo o presidente da autarquia, Joaquim Rosa do Céu, a viabilidade económica dos terrenos em causa é «insuficiente» para cobrir as despesas da Casa dos Patudos e de todo o legado de José Relvas, sendo necessárias receitas para financiar a respectiva manutenção e os projectos de valorização, que orçam em um milhão de dólares.

 
05OUT1910 - Às nove horas da manhã, José Relvas - em companhia de João Chagas, António José de Almeida, Miguel Bombarda, Machado dos Santos e Cândido dos Reis proclama, da varanda da Câmara Municipal de Lisboa, a queda da Monarquia e a implantação da República em Portugal.

12OUT1910 - José Relvas toma posse como Ministro das Finanças, em substituição de Basílio Teles - o qual, sendo a primeira escolha do Partido Republicano para ocupar a pasta, após a Revolução do 5 de Outubro, nunca chegara a assumir tais funções.

COMENTÁRiO

AMÉLIA REY-COLAÇO



A concepção que Amélia Rey Colaço tinha do que devia ser uma companhia nacional resultou em pleno. Fará no Século XX o mesmo que Almeida Garrett no XIX.
Actuando em vários planos, estrutura, primeiro, uma companhia coesa e disciplinada, metódica e exigente. A seguir, joga na dignificação social do actor, conquistando para ele um estatuto de superioridade inovador. Organiza, ao mesmo tempo, um reportório ambicioso, diversificado, alternando contemporâneos com clássicos, estrangeiros com portugueses. Abre (e nisso foi única) as portas à dramaturgia nacional, fomentando-a, recompensando-a como ninguém mais fez depois dela.
O incentivo dado aos nossos autores fê-los conhecer, contra a Censura e o dirigismo cultural, uma época de oiro. José Régio, Luiz Francisco Rebello, Bernardo Santareno, Romeu Correia, Miguel Franco são alguns dos que, então, se afirmaram.

Fernando DaCosta
Época de Oiro (excerto)

TRAJECTÓRiA

JOSÉ RELVAS



José Carlos de Mascarenhas Relvas nasceu na Golegã, em 5 de Março de 1858, numa família de abastados lavradores, sendo filho de Carlos Relvas. Matriculado em Coimbra na Faculdade de Direito, formou-se em Letras em 1880, com uma tese sobre O Direito Feudal. Membro do Partido Republicano, a 5 de Outubro de 1910 proclamou a República em Portugal. Autor de Conferência Sobre Questões Económicas (1910). Ministro das Finanças em 1910-1911, introduziu o Escudo como moeda base do novo sistema monetário. Deputado pelo círculo de Viseu, em 1911 foi iniciado na loja maçónica Acácia, de Lisboa. Em 1911-1914, serviu como Ministro Plenipotenciário em Madrid. Entre Janeiro e Março de 1919, desempenhou as funções de Presidente do Ministério. Músico e musicólogo, violinista e viticultor, a partir de 1882, fez construir (1905-1909) na sua propriedade de Alpiarça, segundo projecto por Raul Lino (1904), a Casa dos Patudos - onde coleccionou valiosas e eclécticas obras de arte (tapeçaria, têxteis, faiança, cerâmica e azulejaria, relojoaria, pintura, escultura, mobiliário, nacionais e estrangeiros, da Idade Média à actualidade) e, legada ao Município, aberta ao público em 1960 como Casa-Museu. Aí faleceu, a 31 de Outubro de 1929.

VISTORiA

Na manhã de 11 de Outubro tive de procurar Afonso Costa para lhe falar em qualquer assunto que interessava a marcha do Governo; encontrei-o com Bernardino Machado no gabinete do Ministério das Finanças. Deram ambos por muito oportuna a minha presença, porque estavam lamentando a abstenção de Basílio Teles e reconhecendo a urgência da sua imediata substituição. Disseram que tinham deliberado confiar-me aquele posto, afirmando que naquele momento o meu nome se lhes impunha, e, como eu desenhasse um gesto de negativa, Afonso Costa alegou as circunstâncias ocorrentes, apelando para o meu patriotismo que me não consentiria a escusa de prestar um novo e relevante serviço à República (textual). Insistiu energicamente nas razões da minha escolha e, secundado por Bernardino Machado, obrigou-me a tomar um compromisso condicional, a que não era estranho o conhecimento das dificuldades que bem podiam surgir com a interinidade do Ministério. Disse-lhe que me rendia a essas razões, mas que só daria por firme o compromisso depois de pensar algumas horas e fazer o que eu chamei o meu exame de consciência. Na verdade a minha intenção foi, desde a primeira hora, tornar a aquiescência dependente do modo como o meu nome fosse recebido pelos Bancos e casas bancárias de Lisboa. Não sabia ainda bem como faria a consulta, e nisso vinha pensando ao transpor a porta do Ministério, onde encontrei Baltasar Cabral, ao tempo director do Banco Ultramarino. Comuniquei-lhe o que acabava de me ser dito pelos dois ministros, sendo bem manifesto o seu decidido e favorável acolhimento. Nem entrou no gabinete do ministro, dizendo-me que falaria imediatamente com os seus colegas e sondaria as disposições de outros elementos financeiros, convocando-me para depois duma reunião que ia promover nessa mesma tarde, prometendo a mais leal informação do que se passasse.

José Relvas
Memórias (excerto)

 

BREVIÁRiO

Âncora Editora lança O Regresso dos Partidos de Alcídio Torres e Maria Amélia Antunes; prefácio de António Almeida Santos.

A Esfera dos Livros edita Operárias e Burguesas - As Mulheres no Tempo da República de Maria Alice Samara.

Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema edita Henry King - A Câmara à Altura dos Sentimentos; organização literária de Manuel Cintra Ferreira.

Editorial Caminho lança Rogério Ribeiro - A Pintura Entre Teatros da História de Eduardo Paz Barroso.

Casa das Letras edita Porto - Da História e da Lenda de Germano Silva.

Em Memórias, Funda edita Recordações de Jacome Ratton [1736-1820] Sobre as Ocorrências do Seu Tempo em Portugal de Maio de 1747 a Setembro de 1810.

Naïve edita em CD, Concerti di Sfida de Antonio Vivaldi; pelo violinista Anton Steck, com Modo Antiquo sob direcção de Federico Maria Sardelli.

Assírio & Alvim edita A Velha e Outras Histórias de Daniil Harms (1905-1942); tradução de Nina Guerra e Filipe Guerra.

Prime Books edita No Ar - 100 Histórias da Rádio de Marcos Pinto.

Edições Asa lança Rei - um romance gráfico de António Jorge Gonçalves (desenho) e Rui Zink (história).

PRIORITÁRiO

 

 



www.antoniojorgegoncalves.com - «Esta é a minha nova casa. Ou, se preferirem, o meu estúdio aberto. Aqui encontram aquilo que fiz, aquilo que estou a fazer, e aquilo que talvez venha a fazer» - António Jorge Gonçalves - Sempre a Desenhar.




IMAGINÁRiO168
24 FEV 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

CONTEXTOS



Memórias de um crepúsculo imperial, estigmas violentos da descolonização, assombram e cintilam Lá, Em África... - a partir de um contexto nostálgico, precário de Anne Sibran que, apelando às vivências familiares volúveis, latentes, virtualmente assume a sua identidade contingente, conjuntural como mulher e ficcionista. Uma trama estilizada em quadradinhos pelo grafismo cromático e exuberante de Didier Tronchet, ao contrastar a alternativa de um imaginário exploratório, sob o signo da banda desenhada francesa, quanto às premissas do romanesco literário em Bleu Figuier. Entre Argel apelativa, reinventada por Sibran, além dos percalços temporais, sobre a independência da Argélia em 1962, e a emergência duma realidade errática, incontinente em actualidade de pressentimentos e reconciliações, através de Paris pelo traço estigmatizado de Tronchet, Lá, Em África... - com edição em álbum sob chancela das Edições Asa - consuma um testemunho artístico que não é apenas histórico e geográfico, mas sobretudo emocional e resgatador.

CALENDÁRiO

11OUT2007 - Castello Lopes estreia Julgamento de Leonel Vieira; com Júlio César e Alexandra Lencastre.

1921-16OUT2007 - Deborah Kerr: «Nunca tive qualquer discussão com um realizador, fosse ele bom ou mau, ao dirigir-me num filme».

20OUT2007 - Em Vila Franca de Xira, com a presença do Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, é inaugurado o Museu do Neo-Realismo.

1931-23OUT2007 - António Cabral: «Quando em Trás-os-Montes há / um só jogo popular, / Deus do céu espreita e diz: / oh quem me dera jogar».

23OUT-04NOV2007 - Alfândega do Porto apresenta Júlio Resende e a Pintura; exposição antológica com duzentas obras do artista, organizada por Agostinho Cordeiro.

24OUT-21NOV2007 - Organizada pelo Museu Nacional da Imprensa, está patente, no átrio da Estação do Rossio, a mostra Desigualdades, Descriminações e Preconceitos, com as obras premiadas do Concurso Europeu de Cartoon.

24OUT2007-17FEV2008 - Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva expõe Vieira da Silva, sendo comissárias Marina Bairrão Ruivo e Ana Vasconcelos e Melo IMAG.14-39-42-75-134.

25OUT2007 - Atalanta Filmes estreia A Outra Margem de Luís Filipe Rocha; com Filipe Duarte e Maria d’Aires.

01NOV2007 - B World estreia Corrupção de Utopia Filmes, sendo produtor Alexandre Cebrian Valente; com Margarida Vila-Nova e Nicolau Breyner, tendo dirigido as filmagens João Botelho, sobre argumento com Leonor Pinhão.

16NOV2007-20JAN2008 - Em Cascais, Fundação D. Luís I expõe pinturaPINTURA de Manuel Amado.

01FEV2008 - Assinalando o centenário da morte de D. Carlos I, é inaugurada em Cascais uma estátua do monarca em frente à baía, ao lado da Cidadela, sua última residência oficial. Iniciativa da Câmara Municipal e da ALA / Academia de Letras e Artes, sendo autor da escultura Luís Valadares, o monumento representa El-Rei a bordo do seu último iate, Amélia II, envergando um uniforme de trabalho da Marinha, e tendo na mão esquerda uns binóculos IMAG.42-55-158-161-165.

MEMÓRiA

29FEV1908-2001 - Balthasar Klossowski de Rola, aliás Balthus: «É preciso desenhar - desenhar com os olhos, quando não se pode desenhar com um lápis».

ANTIQUÁRiO

FEV1948 - Lei do Cinema (Nº 2027): cria o Fundo do Cinema Nacional e impõe uma Licença de Exibição a «qualquer filme destinado à exploração comercial», o qual será antecedido de um Visto de Censura.

PRIORITÁRiO

www.ultravioleta-design.com - Ilustração e pintura, em janela aberta para a artista Sara Franco. O traço e o flagrante, a criação, a cor e a técnica, as referências e as mutações, o estilo e a experimentação.
Contactar: sarafranco@ultravioleta-design.com

ANUÁRiO




938-1003 - Silvestre II: Primeiro papa francês, a sua ambição era unir toda a Europa Ocidental em uma Igreja e um Estado. Antes de converter-se no Papa do Milénio, chamava-se Gerbert de Aurillac e era um monge beneditino. Realmente, foi um génio entre os homens da sua geração. Praticava a arte da dialéctica, como método para chegar à verdade, que consistia em descobrir as contradições nos argumentos do oponente - sinal de uma mente lógica e brilhante. Estudara matemáticas e astronomia em Espanha, porventura com sábios judeus e muçulmanos, muito avançados em relação ao resto da Europa. Um antigo discípulo seu, um monge chamado Richer, conta que o mestre havia construído um globo celeste e uma esfera armilar, a fim de desvendar os movimentos celestes. O Irmão Gerbert teria, pois, conhecimentos suficientes para conceber um mecanismo capaz de, por simulação, os impelir. De facto, e durante séculos, foi-lhe atribuído o mérito de execução do primeiro relógio mecânico. Mas, para o conseguir, teria necessitado de um oscilador, que estabelecesse a base temporal, e de um escape. Não se sabe que, naquela época, pudesse existir qualquer uma dessas duas peças. A Igreja tê-las-á destruído, a pretexto de provirem de infiéis (muçulmanos ou chineses) ou de algum pacto diabólico? Com o tempo, o Papa Silvestre II chegou a ser considerado um feiticeiro ou um herege. Houve que esperar duzentos e cinquenta anos para que, no Século XIII, surgisse na cena europeia o primeiro relógio mecânico.

1928 - É fundada a Lisboa Filme, sendo sócios Francisco A. Quintela e a Empresa Fabril de Vila Franca de Xira. Em 1937, instalou-se na Quinta dos Ulmeiros (Lisboa).

1938 - Carta de David O’Selznick à mulher, Irene Gladys Mayer: «Finalmente, encontrei-me com Alfred Hitchcock. É um homem bastante simpático, mas não o tipo de pessoa com quem nos apeteça acampar» IMAG.4-19-29-44-51-85-112-142-146.

1913-1968 - Maria Lalande: «O teatro e o cinema são artes diferentes, no que respeita à interpretação. No cinema há sobriedade, sente-se mais a vida; no teatro representamos de um fôlego, ajudados pela presença do público».

BREVIÁRiO

Na colecção Fitas & Factos, Apenas Livros edita Cinema Português - Fitas Sem Falas de José de Matos-Cruz.

¨Editorial Presença lança O Sonho Mais Doce de Doris Lessing; tradução de Fernanda Pinto Rodrigues IMAG.166.

¨Pen Club Portugal presta homenagem a Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004), sua sócia fundadora, com A Sophia - livro sob chancela de Editorial Caminho, incluindo dezenas de testemunhos sobre a poeta IMAG.2-18-112.

Anti/Edel lança em CD, We’ll Never Turn Back por Mavis Staples; produção e direcção musical de Ry Cooder.

Gráfica de Coimbra edita Miguel Torga (Quase) Na Primeira Pessoa de Bernardino Henriques; prefácio de Valentim Marques.

Prisvídeo edita em DVD, Dartacão e os Três Moscãoteiros; adaptação heróico-animalística sobre o romanesco de Alexandre Dumas, em série animatográfica produzida por BRB (Espanha) e executada por Nippon (Japão).

Editorial Caminho lança Luís de Freitas Branco de Alexandre Delgado, Ana Telles e Nuno Bettencourt Mendes IMAG.48-78-112-115-145.

VISTORiA

 
Zodíaco

O Zodíaco é uma zona da esfera celeste, cuja largura é de cerca de dezoito graus, na qual se acham compreendidos os planetas antigamente conhecidos, e que se divide em duas partes iguais pela elíptica, círculo máximo oblíquo ao equador, que por ele é cortado nos pontos equinociais. N’essa zona, são representados os doze signos.
O nome de Zodíaco vem de uma palavra grega, que significa animal, porque muitos dos signos ali representados foram desenhados sob a forma de animais. O Zodíaco é cortado ao meio pelo equador, e cada parte contem seis signos, chamados setentrionais ou meridionais, segundo a sua situação.
Os signos setentrionais são Aries [Carneiro], Touro, Gémeos, Cancer [Caranguejo], Leão, Virgem; os meridionais Balança, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes.
Os nomes latinos d’estes signos são os seguintes: Aries, Taurus, Gemini, Cancer, Leo, Virgo, Libraque, Scorpius, Arcitenens, Caper, Amphora e Pisces.
Sendo certo que o Zodíaco é conhecido desde remotas eras, havendo, por exemplo, sido atribuída a de 4.500 anos antes da Era Cristã ao que foi encontrado desenhado no templo de Esne, no Egipto, não se pode precisar qual o povo a que pertenceu a sua invenção: se aos egípcios, se aos caldeus.
O facto é que o ano egípcio tinha trezentos e sessenta dias, e doze meses de trinta dias, e que os mais antigos astrónomos sempre dividiram o Zodíaco em doze partes iguais, de trinta graus, cada uma das quais correspondia a um signo, que por seu turno era correspondente a cada um daqueles meses.

07ABR1897 - Diário de Notícias

 EXTRAORDINÁRiO

 O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

Capítulo Oito
A INSUBMISSA RESSURREIÇÃO - 61

 Fanático do astrolábio, era José Adamastor estrábico e chamavam-lhe Mostrengo pois que, durante o inverno, obsceno, gostava de entupir com estrume as sarjetas da Rua dos Descobridores. Sabotagem mítica? Serviço cívico?

Há tempos, estava enfeitiçado pela ingénua e esbelta Nordestina Serralho, uma pícara lírica brasileira que imaginaria o paraíso como um encanto alar, com cada pássaro a pôr por dia um ovo novo... Uma ave, nave que flutuasse o canto, qual quotidiano renascido e sinfónico.

Com souplesse, Nordestina tolerou o indevido indivíduo, que a aplaudia com furor de camarote reservado no Teatro de São Moniz, rondava-lhe camarim e, depois, ia gabarolar-se de a ter cativa - durante as tertúlias infinitas, boémias, noite adentro no Moutinho da Achada. Até que certa vez, já farto, um dos circunstantes, Jacinto Magno foi visitá-la e avisou a artista, que quase ficou sem pio.

Por fim, e depois de muito matutar, Nordestina decidiu tolher remoques, servindo-se de influências.

 Continua



 

IMAGINÁRiO167

16 FEV 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

PROSÁPIA

 
Entre o declínio dos impérios coloniais e a gestação da guerra fria, avassalou no imaginário literário e cinematográfico o fenómeno dos agentes secretos - aventureiros cosmopolitas e assassinos institucionais que, num trepidante cenário do entretenimento, forjaram a iconografia lúdica e os bastidores da política num clima de espionagem internacional, sem regras e sem escrúpulos, arrogante ou fatídico, que corresponde ao crepúsculo da civilização ocidental. Eis a matéria heróica e a atmosfera ficcional que exaltaram a imaginação de escritores como o francês Jean Bruce - que, a partir de 1949, sob a sigla OSS 117, sagrou as proezas inexoráveis ou diletantes de Hubert Bonisseur de la Bath, com inevitável transposição em grande ecrã entre 1959-1970, sendo vários os protagonistas… Tal universo intrépido e frenético ressurge estilizado mas irresistível em Agente 117 - com edição em DVD, sob chancela Lusomundo - de Michel Hazanavicius, cabendo a Jean Dujardin assumir uma postura formatada e electrizante, além dos inevitáveis curto-circuitos nostálgicos e sarcásticos, envolvendo O Cairo, Ninho de Espiões por 1955, numa trama exacerbada de sublevação e conspiração, de predações exóticas e conivências forasteiras.

CALENDÁRiO

20OUT2007 - Em Montijo, decorre a Gala de Comemoração do Cinquentenário do Cinema-Teatro Joaquim de Almeida 1957-2007, organizada pela Câmara Municipal.

26OUT2007-17FEV2008 - No Palácio da Ajuda, Galeria D. Luís I expõe Arte e Cultura do Império Russo nas Colecções do Hermitage - De Pedro, o Grande, a Nicolau II IMAG.65.

15NOV-09DEZ2007 - Teatro Maria Matos apresenta E Agora Baixou o Sol de Miguel Castro Caldas; encenação de Bruno Bravo, sendo intérpretes Anabela Brígida e Bruno Simões.

ELUCIDÁRiO

O Tesouro do Feiticeiro - 13MAI1885 - Diário de Notícias IMAG.138.

MEMÓRiA

1901-20FEV1978 - Vitorino Nemésio: «Quis ser padre, soldado e médico, mas não deu em nada. Acabei como professor e escritor. E poeta».

22FEV1788-1860 - Arthur Schopenhauer: «O laço formado com inconstância pela criação é desfeito pela morte, sendo a penosa aniquilação o principal erro do nosso ser; o grande desengano».

EPISTOLÁRiO

Isto de se falar de uma tragédia que se tem pareceu-me sempre tão vergonhoso como uma doença de pele. Há palavras vivas como sangue que me vêm à boca e eu amordaço logo. Penso-as por fora. Parecem-me literatura e deito-lhes logo por cima esta reserva fria que o tempo me ensinou...

Enfim, a coisa resume-se a isto: ou sou ou não sou capaz de reduzir durante anos a bonecos - sinais de ser - estas larvas que trago comigo desde que me conheço.

Vitorino Nemésio
Carta (1941) a Carlos Queiroz
sobre Mau Tempo No Canal

 

VISTORiA

Na desgraça, pensar em outros que são mais desgraçados, é o nosso maior consolo: é este o remédio eficaz ao alcance de todos.
Porém, como os carneiros, que saltam no prado, enquanto o carniceiro faz a sua escolha no meio do rebanho, assim, em nossas horas felizes, não sabemos que desastre nos prepara o destino, justamente nesse momento: enfermidade, ruína, loucura, perseguições…
Tudo o que defendemos, resiste-nos, tudo tem uma vontade hostil que é preciso vencer. A história diz-nos que a vida dos povos é uma sucessão de guerras e revoltas; os anos de paz não passam de curtos entreactos. O mesmo acontece com a vida do homem, em constante luta contra as penas ou o aborrecimento, males abstractos, e contra os seus semelhantes. Em todas as partes e ocasiões, temos que travar combate com um adversário.
A vida é uma guerra sem quartel, e a morte encontra-nos com as armas na mão.

Arthur Schopenhauer
Vivemos Combatendo

COMENTÁRiO

VITORINO NEMÉSIO
MEMÓRIAS E REVELAÇÕES

 

Foi um dos maiores comunicadores que passaram pelo nosso pequeno ecrã, numa altura em que tal expressão ainda não entrara em uso afectivo ou profissional. Destas duas categorias, o talento de Vitorino Nemésio seduziu-nos pela primeira e impôs-se pela última. Era amável, envolvente, terno, pasmado, repentista, senhor de um saber imenso, versátil e fluente.

Nemésio possuía um raro dom ao conversar, reagia à câmara com naturalidade insólita. Revelava, instruía. Contava, entretinha. Ensinava e, sobretudo, divertia. Tinha uma personalidade autêntica - mas era, também, uma personagem. Talvez como ninguém mais, encenava com espontaneidade, improvisava com erudição. Pelas suas palavras, na sua figura, passava a experiência e palpitava o espectáculo.
Tudo isto está patente em Vitorino Nemésio - um filme de Maria João Rocha, feito com paixão e partilhado nas emoções, nas vivências. No flagrante dos testemunhos, embora em exibição póstuma, Nemésio expõe-se culto, desvenda-se magistral - com um sentido único, fascinante, de confidências, memórias e revelações, as quais convergem num pleno elã oral e visual.
Ora, para além do fenómeno de popularidade que assumiu Se Bem Me Lembro… (1969-75), através da RTP, persiste um outro Vitorino Nemésio - ou melhor, os outros que se manifestaram numa existência coerente, mas em turbilhão. Todos os que estimularam uma tão sugestiva Viagem - no sentido mais íntimo, e profundo; mais espacial, e universalista.
O Nemésio professor, ensaísta, jornalista, prosador, e sobretudo poeta. Sobre tais facetas, o homem no sentido ontológico e ecuménico. Entre o mar e a terra. Nascido em Praia da Vitória, Ilha Terceira, Açores, a 19 de Dezembro de 1901. Formado pela Faculdade de Letras de Lisboa (1931); doutorado com a tese A Mocidade de Herculano Até à Volta do Exílio (1934); em 1940, catedrático.
Leitor em Montpelier (1935), leccionou em Bruxelas (1937-39); percorreu o Brasil, como reportou em O Segredo de Ouro Preto e Outros Caminhos (1952). A sua obra maior era já o romance Mau Tempo no Canal (1944), que começa «Mas não voltas tão cedo…». Em 1932, editara Sob o Signo de Agora, onde analisa o conceito de açorianidade. E a Sapateia Açoriana (1976) culmina o estro lírico.
Na obra poética, destacam-se ainda O Bicho Harmonioso (1938), ou pela mística O Pão e a Culpa (1955) e O Verbo e a Morte (1959); como novelista, Varanda de Pilatos (1927) ou O Mistério do Paço do Milhafre (1946)… Capas dos livros, apontamentos à margem, fotografias fixas, registos sonoros, imagens animadas consolidam a pesquisa ilustrada por Maria João Rocha & Nélia Cruz.
Vitorino Nemésio - Viagem, 1901-1978 foi emitido pela RTP2, em 20 de Fevereiro de 1998 - vinte anos após a sua morte, de doença prolongada em Lisboa. Entre outros, prestam depoimento o filho Manuel Nemésio, os professores António Machado Pires, Fernando Cristovão, Fátima Freitas Morna e Margarida Maia Gouveia. Tudo por Nemésio, até ao lamento «Paro à porta de Deus e choro só».

BREVIÁRiO

2006 - Imprensa Nacional - Casa da Moeda lança Vitorino Nemésio - Obras Completas - Volume I - Poesia 1916-1940; edição de Luiz Fagundes Duarte.

GALERiA

OS ÉMULOS 007

Por meados do Século XX, o fenómeno heróico e comercial logrado por James Bond 007, além de revitalizar excepcionalmente o género de espionagem no cinema e na literatura, gerou o aparecimento, efémero ou sequenciado, de diversos agentes secretos referenciáveis por uma sigla numericamente similar. As características dos produtos e dos protagonistas eram parecidas, e as proezas decorriam sobretudo na Europa - aliás indiciando uma origem de fabrico, embora por vezes se conotassem operacionais americanos que intervinham no estrangeiro. Um dos mais populares e trepidantes foi OSS 117 (Hubert Bonisseur de la Bath), logo em fitas com Kerwin Mathews dirigido por André Hunebelle. Cabe ainda destacar OSS 77 (Robert Kent), um sucedâneo italiano, de aliciantes eróticos e exóticos. Ou 077 (George Farrell), que chegou a cumprir uma Missão em Lisboa (Espionage in Lisbon - 1965 - Fréderic Aycardy) - entre vários que em Portugal enfrentaram ameaças científicas, tráficos de tecnologia e outras crises entre as superpotências. Sem esquecer que até Bond andou por cá - na pele de George Lazenby, como 007 Ao Serviço de Sua Majestade (On Her Mejesty’s Secret Service - 1969 - Peter Hunt). O nosso cinema chegou a investir na fórmula, com destaque para Operação Dinamite (1967 - Pedro Martins) com Nicolau Breyner, e 7 Balas Para Selma (1967 - António de Macedo) com Florbela Queiroz & Sinde Filipe. Assinala-se também um outro tipo de personagens que fizeram culto, muitas vezes pela própria carisma dos intérpretes - como Michael Caine no míope e introvertido Harry Palmer (sobre romances de Len Deighton); ou Eddie Constantine no duro e insolente Lemmy Caution (segundo Peter Cheney), que Jean-Luc Godard celebrou em Alphaville (1965).

Aliás, também os americanos se deixaram envolver - entre a rivalidade heróica e a competição cinéfila. É o caso de Matt Helm - a partir de 1966, encarnado com mais devoção que eficácia por Dean Martin; ou de Derek Flint - a que James Coburn atribuiu uma personificação emblemática, mesmo nas situações mais embaraçosas. Outra experiência exemplar, já para a televisão, foi a série The Man From Uncle - cujos notórios Napoleon Solo (Robert Vaughn) e Ilya Kuriakin (David McCallum) chegaram a exibir-se nos cinemas. Voltando a Inglaterra, Richard Johnson foi um refinado Bulldog Drummond a partir de 1967, tão elitista como cosmopolita. Uma visão perturbante e realista surgira, entretanto, explorada por Martin Ritt em O Espião Que Saiu do Frio (1965), com Richard Burton, sobre a obra de John Le Carré. Foi ainda a explosão espectacular de 007 que fez saltar Monica Vitti como Modesty Blaise (1966 - Joseph Losey), a partir da banda desenhada; ou que detonou as sagas de Danger Man, Mission: Impossible, I Spy e o humor de Mel Brooks em Get Smart, pelo pequeno ecrã. Aliás, numa combinação irresistível entre dois operacionais britânicos, James Bond e Harry Palmer, Austin Powers, o Agente Misterioso (1998 - Jay Roach) celebra uma paródia irresistível aos agentes secretos, ao mundo da espionagem - estilizada entre a guerra fria, o amor livre e uma sofisticada tecnologia - enfim, aos excitantes e nevrálgicos anos ’60.




IMAGINÁRiO166
08 FEV 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

OUSADIAS

 

Em 1952, André Franquin (1924-1997) - um dos artistas mais prestigiados da banda desenhada franco-belga - revolucionou os parâmetros do imaginário em quadradinhos, quanto à natureza dos heróis e à simbologia aventurosa, em privilégio dos jovens leitores, com a criação de Marsupilami  - um animal dócil mas irreverente, amável mas ousado, descoberto por Spirou e Fantásio na floresta virgem de Palombia. Entretanto titular de saga própria, vendendo centenas de milhares de exemplares e capaz de fascinar os que o conhecem, para logo deixar todos de cabeça perdida, Marsupilami regressa sob chancela das Edições Asa - para ressurreição dos grandes clássicos - aliando a nostalgia dos fanáticos ao enleio das novas gerações: em Baby Prinz (1990), envolve-se na sublevação contra o ditador na capital Chiquito; em Fordlândia (1991), enfrenta as consequências da inauguração de Jánomolharás, a maior barragem da Amazónia; enfim, opõe-se aos garimpeiros clandestinos que raptaram o filho do embaixador ianque, em O Ouro da Boavista (1992)... Emoções e proezas primordiais, recriadas por Franquin com Batem (aliás, Luc Collin) e Yann (aliás, Pearce), e partilhadas por Marsupilami com Sarah, Bip ou Noé, ao grito Huba, hop! AhAhAh! IMAG.4-20-61.

CALENDÁRiO

OUT2007 - ABC Cine-Clube de Lisboa apresenta Evocação de Manuel Machado da Luz  - arquitecto, argumentista e crítico de cinema, falecido em SET1997.

04OUT2007 - Lusomundo estreia Fados de Carlos Saura; com Mariza, Camané, Carlos do Carmo, Argentina Santos, Chico Buarque e Caetano Veloso.

10OUT2007 - Em Estocolmo, a Academia Sueca atribui o Prémio Nobel da Literatura à escritora britânica Doris Lessing.

11OUT2007 - Associação Guilhermina Suggia apresenta, no Salão Nobre do Conservatório Nacional de Lisboa, cuja Escola de Música co-organiza, a conferência Gaudí, Guilhermina e a Música por Teresa Cascudo (crítica musical) e Ana Maria Férrin (biógrafa de Gaudí); com música ao vivo por José Carlos Araújo (órgão), Paulo Gaio Lima (violoncelista) e Paulo Pacheco (pianista).

16OUT-16NOV2007 - Movimento Arte Contemporânea /MAC expõe As Formas do Existir - Retrospectiva de Pintura 1967-1992 de Nelson Dias (1940-1993).

19OUT-04NOV2007 - Na Amadora, decorre o 18º Festival Internacional de Banda Desenhada - Amadora Bd.

MEMÓRiA

1884-09JAN1918 - Emile Reynaud: Professor, fotógrafo e desenhador, precursor do cinematógrafo, inventou o praxinoscópio, o teatro óptico e as pantomimas luminosas (desenho animado não-cinematográfico).

23JAN1898-10FEV1948 - Sergei Mikhailovich Eisenstein: «A profissão de realizador de cinema pode, e deveria ser, a mais elevada e prestimosa; que ninguém que a tal aspire possa depreciar todo o conhecimento que o torne um melhor profissional ou um melhor ser humano».

13FEV1938-1999 - Oliver Reed: «Quando chego a casa, após um dia extenuante de filmagens, gosto de ter uma mulher à minha espera e que ela me trate bem. Ou seja, que me dê banho e me ajude na cama».

11MAI1918-15FEV1988 - Richard Feynman: «Podes dizer o nome em todas as línguas do mundo; quando acabares, continuas a não conhecer nada sobre o pássaro, apenas sabes o que as pessoas lhe chamam».

OBSERVATÓRiO

Assinalando o nonagésimo aniversário de Fernando Garcia - nascido em Lisboa, a 22JUL1917 - é lançada Flora Literária, uma colectânea dos seus poemas (1942-2004) nunca publicados, e ilustrados por docentes do IADE/Instituto de Artes Visuais, Design e Marketing, do qual o cineasta foi professor de Publicidade.

ANTIQUÁRiO

 
FEV-OUT1938 - Por iniciativa do Ministro das Colónias Francisco Vieira Machado, e sendo Agente Geral das Colónias Júlio Cayolla, realiza-se a mais detalhada e exaustiva digressão de uma equipa do cinema português, fora do território continental, empreendida até à época. Carlos Selvagem foi o Chefe, António Lopes Ribeiro o Director Artístico da Missão Cinegráfica às Colónias de África - que esteve na Madeira, Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe, Angola e Moçambique, tendo sido rodados vários documentários, e ainda os exteriores da longa metragem ficcional Feitiço do Império (1940 - A.L. Ribeiro).

PARLATÓRiO


Como Aprendi a Desenhar

A linha é o traço do movimento.
E, ao fim de muitos anos, recordarei a aguda sensação da linha em sua qualidade de movimento dinâmico, de processo, de percurso.
Ela levará o meu coração a tomar, sempre, em consideração as sábias palavras de Wang Pi (Século III dC): «O que é uma linha? A linha significa movimento.»
No Instituto de Engenharia Civil, entusiasmei-me com uma matéria que pode parecer árida: a Geometria Analítica de Descartes, que trata do movimento da linhas expressas pela forma misteriosa das equações.
Apaixonei-me, entretanto, pela encenação - essa linha do caminho de um artista no tempo.
Hei-de ter sempre uma apetência, não pelo repouso, mas pelo dinamismo das linhas e pelo dinamismo do movimento, tanto no que se refere à própria linha como a qualquer sistema de fenómenos e das suas mútuas transições.
É de tais circunstâncias que nasce, talvez, a minha inclinação e simpatia por teorias que proclamam - como princípios fundamentais - o dinamismo, o movimento e a evolução…

Sergei M. Eisenstein (excertos)

 

COMENTÁRiO

OLIVER REED

Oliver Reed faleceu em Malta, durante a filmagem de Gladiador - que lhe é dedicado, e onde interpreta Proximo - sob direcção de Ridley Scott. Nascido a 13 de Fevereiro de 1938, em Wimbledon, ao Sul de Londres, Reed era um homem temperamental e um artista talentoso, tendo aparecido - a partir da década de ’50 - em uma centena de filmes, metade dos quais como figura primordial: lembram-se Mulheres Apaixonadas (1969) e Tommy (1975), como favorito de Ken Russell; ou Oliver! (1968 - Carol Reed) como Bill Sakes, e Os Três Mosqueteiros (1974 - Richard Lester) como Athos.
Naquele 2 Maio de 1999, Reed sentiu-se mal num bar de La Valleta, falecendo pouco depois numa ambulância, de ataque cardíaco, a caminho do hospital. Aliás, gabara-se de que as «cenas de álcool» tinham uma importância essencial no seu currículo - ou, pelo menos, assim comentavam os críticos de estimação. No entanto, ficaram ainda memoráveis os desempenhos em O Leão do Deserto (1979 - Moustapha Akkad) ou A Fantástica Aventura do Barão (1988 - Terry Gilliam). Em 1983, esteve em Portugal, para a rodagem de Operação Masquerade de Peter Hunt. Como sempre, provocou alguns incidentes, justificando-se: «Sou um actor, não um sacerdote irrepreensível».

INVENTÁRiO

 Bela e loira, felina e soberana no território Zambuli, Sheena foi criada - como heroina dos quadradinhos - em 1938, por William Morgan Thomas, mantendo-se em publicação durante quinze anos, sobretudo com ilustrações de S.R. Powell. Além de titular de uma série televisiva (1955) com Irish McCalla, em 1984 chegou ao cinema - através do qual se expandem os vectores fundamentais de culto: exotismo e erotismo. Assim, A Rainha da Selva - graças a extraordinários poderes telepáticos - conta com a colaboração dos animais ferozes, para combater rebeldes e facínoras em África. Como tantos paladinos, também Sheena deriva de outros universos de fantasia e transfiguração, a ponto de ser considerada - com justiça e rigor histórico - uma pioneira versão feminina de Tarzan.
Um crime fratricida, sobre o príncipe Otwani, envolve o repórter Vic Cassey, apaixonado por Sheena. A realização de John Guillermin repercutiu as virtualidades essenciais de Sheena: logo a credibilidade da paisagem, tendo as filmagens decorrido no Quénia, com um exaltante recorte paisagístico. A escultural Tanya Roberts personifica uma estilizada sedução de Sheena - em sua inserção num território primitivo, hostil e, por excelência, mítico. Em contraste plástico e metafórico com a nova saga televisiva (2002), com Gena Lee Nolin dirigida por Chuck Bowman... Enquanto herança artística e nostálgica, recuperada sobre a mais empolgante tradição em banda desenhada, Sheena, a Rainha da Selva corresponde à ostentação de um pendor naturalista e exuberante.

VISTORiA

Verde Poema

Era verde,
intensamente verde,
o meu poema;
era a relva,
era a erva,
era a árvore composta
com a fruta toda verde
pendurada:
a maçã verde,
a pêra verde,
o abrunho verde,
em verde primavera ultrapassada!
(Uma cabra tresmalhada
viu perdido um papel verde
e comeu-o:
- era o poema verde, o meu!)

Fernando Garcia

EXTRAORDINÁRiO

O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

 Capítulo Sete
CONTRAFEITOS À CONTRIÇÃO - 60

 Não, Vénus estaria confiante e, tão só, a esmerar-se na funesta candura de quem ama o amo, no desvelo de cumprir quaisquer ordens com que a instigasse, em prol de um desígnio soberano e infernal...

- Enfim, esforçam-se os neófitos e os prosélitos, embaçam-se os patetas e os peripatéticos! - rematou,  disperso, Nero Faial.

Mas, se não houvesse um Mal maior, a Suprema Entidade da Perfídia? A ser assim, Vulcão sentia-se inquieto e estupefacto, pois nesse caso, órfão, o principal responsável no nome de quem urdira, em vão, as mais ignaras atrocidades, seria ele próprio, nefando e incólume - porventura, e cerrou os dentes, um monstro inimputável.

 Continua  





IMAGINÁRiO165
01 FEV 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

ESPIRAL



O fenómeno da globalização, cada vez mais recorrente ao nível da informação e do conhecimento, alcança uma formulação perturbadora e fascinante em Babel - com edição em DVD, sob chancela Lusomundo - de Alejandro González Iñárritu, ao constituir sob uma ênfase dramática, metafórica, o destino co-envolto ou eventual de várias pessoas normais em diversas partes do mundo, aparentemente sem relação entre si, mas intrínseco numa estranha implicação de causa/efeito. Distintas línguas, choques culturais, distantes civilizações, precários protagonistas ou vítimas acidentais dum volúvel nexo subjacente à intriga narrativa - cuja dimensão funesta ou virtual se ritualiza através de perigos, desafios, tensões, transes, desaires, ameaças - reflectem-se numa vertigem determinística, precipitam-se qual paroxismo afinal transfigurador. Em tal cominação/contaminação solitária e conjuntural, separada e conjunta - com fundamentos que remontam à própria primazia humana da comunicação e da sobrevivência - ressalta a singular, plural assunção artística por Brad Pitt, Cate Blanchett e Gael Garcia Bernal.

CALENDÁRiO

06SET-28OUT2007 - No Porto, Museu Nacional de Soares dos Reis apresenta a Exposição António Xavier Trindade (1870-1935) - Um Pintor de Goa IMAG.59.

13SET2007 - Atalanta Filmes estreia China, China de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata; com Chen Jie e Chen Jialiang.

20SET2007 - Atalanta Filmes estreia O Capacete Dourado de Jorge Cramez; com Eduardo Frazão, Ana Moreira e Rogério Samora.

20SET-24NOV2007 - Galeria Diário de Notícias apresenta a Exposição Nadir Afonso - Futuro.

1923-22SET2007 - Marcel Marceau: «A música e o silêncio combinam intensamente, porque a música é feita de silêncio, e o silêncio está cheio de música».

27SET-17NOV2007 - Biblioteca Nacional de Lisboa mostra Folhetos de Cordel e Outros da Colecção de Arnaldo Saraiva.

MEMÓRiA

1399-03FEV1468 - Johannes Gensfleich Gutenberg: «Poderia arrogar-se que a genuína espontaneidade deixou de ser possível ou desejável, desde que foram impressas as pautas das maiores obras. Todos os músicos modernos são, para o melhor ou para o pior, prisioneiros de Gutenberg» (Donal Henahan).

03FEV1898-1974 - Alvar Aalto, estilista: «A forma é um mistério que desafia a descrição mas traz prazer às pessoas.

¸04FEV1918-1995 - Ida Lupino: «Adorava ver mais mulheres trabalharem como realizadoras e produtoras. Hoje é quase impossível fazê-lo, a menos que se seja uma actriz ou uma argumentista com muito poder.»

06FEV1908-1993 - Aquilino Mendes, director de fotografia: «Em cinema, é fundamental a visão de conjunto. Conseguir uma boa iluminação, um bom recorte, um estilo para o grupo, torna mais fácil ir ao grande plano, ao pormenor. Quando a acção pede, gosto dos grandes planos, não demasiado grandes, mas naturais».

06FEV1608-1697 - Padre António Vieira: «Demócrito ria, porque todas as coisas humanas lhe pareciam ignorâncias; Heraclito chorava, porque todas lhe pareciam misérias: logo maior razão tinha Heraclito de chorar, que Demócrito de rir; porque neste mundo há muitas misérias que não são ignorâncias, e não há ignorância que não seja miséria» IMAG.118-139.

07FEV1478-1535 - Thomas Morus, ou Thomas More: «Sabeis que um homem que vive na ociosidade e nos prazeres, habituado a trazer espada e escudo, a olhar altivamente para os vizinhos e a desprezar toda a gente, é pouco capaz de manejar a enxada e o alvião, de trabalhar dedicadamente por pequenos salários e má alimentação, ao serviço de um pobre lavrador» (Utopia - 1516, excerto) IMAG.41.

ANTIQUÁRiO

01FEV1858 - António Pedro e Joaquim de Almeida estreiam-se no Theatro de Variedades, em Lisboa, como actores da mágica A Loteria do Diabo de Francisco Palha & Joaquim Augusto d’Oliveira.

 

01FEV1908 - Tendo-se apeado do comboio que trouxera a família real de Vila Viçosa até ao Barreiro, e cruzado o Rio Tejo de vapor, ao atravessar de landau o Terreiro do Paço, em Lisboa, D. Carlos I e D. Luís Filipe, Príncipe Real, são assassinados por Alfredo Costa e Manuel Buíça. Dois anos depois do Regicídio, era implantada a República em Portugal.

TRAJECTÓRiA

GUTENBERG



Johannes Gensfleich zur Laden zum Gutenberg nasceu em Mainz, Alemanha, por 1399, sendo filho de um próspero comerciante. Ourives de profissão, em 1434-1444 viveu em Estrasburgo, onde conceberia uma liga para caracteres metálicos móveis na impressão de livros, ou processo tipográfico. Nesse mister, e regressado à cidade natal, em 1448 associou-se a Johann Fust, criando Das Werk der Buchei/A Fábrica de Livros; em 1455, por dissidência, teve que ceder-lhe os seus materiais e parte das obras feitas. Em 1457, efectuou nova parceria com Peter Schöffer, que desenvolveu técnicas e aplicações. Em 1465, logrou a protecção do Arcebispo Adolf II de Nassau. Faleceu em Mainz, a 3 de Fevereiro de 1468. Tendo inventado a imprensa gráfica, a utilização de tintas à base de óleo e recorrido a qualidades de papel apropriadas, entre outras obras daria à estampa um fragmento do Weltgerichtsgedicht/Juízo Final (1448), o Türkenkalender (um Calendário Astronómico - 1454), a Ars Minor de Aelius Donatus (1455), o Salmorum Codex/Salterium (1457), o Catholicon de Johannes Balbus (1460) e, por excelência, a Bíblia (1455-1458).

PRIORITÁRiO

www.apenas-livros.com - Não se encontram em exposição estratégica nas grandes superfícies. Mas atraem pela aparência das publicações de cordel, para além dos temas virtuais e variados. São Apenas Livros - uma estratégia editorial cujo Catálogo de 2007 desvenda uma teia infinita, intrincada, de temas e opções, de leituras e autores. Aliando - em colecções diversas - escritos antigos, narrativas dispersas, a textos actuais, transcrições recuperadas. Fundindo literatura e imaginário. Contacto: apenaslivrosoninet@speed.pt

BREVIÁRiO

Departamento de Cultura da Câmara Municipal de Coimbra edita Miguel Torga - O Calvário do Poeta de Soares Rebelo e Luís Carregã.

Quetzal e Círculo de Leitores editam Mulheres Que Lêem São Perigosas de Stefan Bollmann; prefácio de Elke Heidenreich.

Cavalo de Ferro edita Um, Ninguém e Cem Mil de Luigi Pirandello; tradução de Margarida Periquito IMAG.110-112.

Na colecção Dois Mundos, Livros do Brasil edita Admirável Mundo Novo (1932) de Aldous Huxley; tradução original de Mário Henrique Leiria.

Assírio & Alvim edita Os Filhos de Franz Kafka, incluindo as histórias A Sentença, O Fogueiro e A Transformação; tradução de Álvaro Gonçalves.

Guerra & Paz edita Entrefitas e Entretelas de Pedro Bandeira Freire.

VISTORiA

Padre António Vieira

A sua existência foi uma das mais activas e ilustres do seu tempo. Grande pregador, grande escritor, grande político, grande missionário, grande colonizador, esteve envolvido nos maiores negócios, tratou com os maiores personagens, e trabalhou pelas maiores ideias da sua época. Os seus magníficos sermões arrebatavam tanto a gente inculta do Brasil, como encantavam em Roma o sábio e requintado mundo dos prelados romanos. A sua fama também estendeu-se por toda a Europa. Depois de ser confidente dos reis e dos papas, de ter conhecido as grandezas do mundo e as do alto saber, morreu com a pobreza e a simplicidade de um místico, no sertão da Bahia.

Eça de Queiroz
Almanach Encyclopedico (1896)

 

ANUÁRiO

1888 - Após uma gestação de oito anos, é publicado Os Maias, romance de Eça de Queiroz em dois volumes, sob chancela da Livraria Ernesto Chandron (Porto) IMAG.60.

1898 - O Theatro de D. Maria II passa a ser administrado por uma Sociedade Artística, com a reforma de António Ennes.

1908 - Imprensa Libanio da Silva lança Dicionário do Teatro Português de Sousa Bastos; obra ilustrada com mais de 500 fotogravuras, tendo edição facsimilada por Arquimedes Livros, em MAR2006.

1948-2002 - Fernando Calhau: «A obra deste artista nunca esteve muito ao nosso alcance. De facto, e apesar duma inequívoca fidelidade formal e temática, os acidentes da sua apresentação nunca nos permitiram um conhecimento claro das suas qualidades e da sua extensão» (Jorge Molder - 2001).

1933-1968 - Cristovam Pavia: «Já me não vem a vaga tristeza do teu chamamento longínquo. Já me confundo contigo».

EXTRAORDINÁRiO

 

O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

 Capítulo Sete
CONTRAFEITOS À CONTRIÇÃO - 59

 Vai de lá e sem cautelas, a golpes de ofendida vaidade, Ofélia acercou-se lenta até Vénus e Deodato, tentando suster-lhes o fluxo sensual e, irónica, atingir o fátuo Fado em vão - farta de saber que ele era um intocável!

– Só agora, já com o espectáculo prestes a começar...?

Logo, rápido em réplica, Deodato dirimiu tal insinuação à pontualidade, com a insolência original com que aprimorava o Fado:

- Ora, quando eu chego, é que o tempo principia…

O sussurro de gargalhadas pareceria blasonar tal panaceia. Presunções frívolas. Humanos artificiais. E, tudo isto, nos resquícios dum império trágico-marítimo de rastos, feito de rostos fortuitos, consagrado na barganha e bagunça, farto em especialidades e especiarias, forjado de impropérios e prosperidades, depauperado e demérito…

- És um falso, mas tens ardor... - preconizava mentalmente Vénus, ao assistir complacente, talvez por ser novata em tais rituais, a um carismático discurso de Nero Faial, na investidura como Curador da Fundação de Artes Narcisistas.

- Uma delícia... O saber do amor, o sabor de amar. O tempero da existência, a têmpera dos ideais... - e Nero Faial embargava-se na sua própria verve, enquanto de soslaio ia tentando aquilatar a Vénus, que resplandecia entre a circunspecta abstracção dos tantos mais.

Tê-lo-ia desmascarado? Saberia quem ele era? Intuiria a extrema provação em que traiçoeiro, por cio ou por ciúme, havia decidido testá-la? Instruindo-a, atraindo-a ao melhor clímax de seu protagonismo ambíguo? Incitando-a, expondo-a ao apetite colateral dos seus piores antagonistas?

Continua   



IMAGINÁRiO164
24 JAN 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004

 PRONTUÁRiO

 OUSADIAS




Por estes dias murchos e invernosos, em que a chuva teima em alagar os passeios, transformando as ruas em rios, nada melhor do que ficar em casa, mergulhando com Mordillo na leitura de Super-Homens - em que se mesclam sátira, fantasia, ridículo e reinvenção poética. Mesmo assim, para quem continue com receio de meter (o pé na) água, a alternativa é Supermulheres - que deixa qualquer coração arfante com vontade de levantar voo... Eis personagens e peripécias que estilizam pessoas comuns - ousadas e caprichosas, sentimentais ou vaidosas dos seus dotes - em irresistíveis figuras gráficas, propostas pela BookTree, assinalando o regresso de um dos mais populares artistas do humor sem palavras, mas inspirado pelas tiradas dos famosos. Dois álbuns em que Mordillo - genial e generoso, pelo modo como observa e reinventa o nosso quotidiano, seus signos lúdicos e rituais exploratórios - extrai da realidade o melhor do imaginário. Aliando a sugestão visual de cartoons coloridos à graça e contundência dos gags, Guillermo Mordillo prova, afinal, que tanto a mulher como o homem são capazes «de proezas extraordinárias» IMAG.153.

CALENDÁRiO

1935-06SET2007 - Luciano Pavarotti: «O que interessa é ter a música na cabeça, e cantá-la com o corpo».

13SET2007 - Teatro Maria Matos estreia, com Comuna Teatro de Pesquisa, Hamlet de William Shakespeare; encenação de João Mota, sendo intérpretes Diogo Infante e Albano Jerónimo.

20SET2007 - Fundação Luso-Brasileira apresenta Impressões, exposição de pintura por Carlos Michaëllis de Vasconcellos IMAG.132.

MEMÓRiA

28JAN1898-13JUN1958 - Vasco Santana: «Nós, os actores cómicos, já nascemos para fazer rir».

1869-30JAN1948 - Mahatma Gandhi: «A indolência é um estado admirável, mas perturbador. Cabe-nos fazer alguma coisa para sermos felizes».

1502-31JAN1578 - Pedro Nunes: «Bem sey quam mal sofrem os pilotos que fale na Índia quem nunca foi nella; e pratique no mar quem nele nam entrou» (Tratado em Defensam da Carta de Marear) IMAG.20-115.

TRAJECTÓRiA

VASCO SANTANA

Vasco António Rodrigues Sant’Ana nasceu em Lisboa, em 28 Janeiro de 1898. De família ligada ao meio teatral, estudou na Escola de Arte de Representar (Conservatório de Música). Por carácter e aparência, era espontâneo, histriónico, bonacheirão. Estreou-se casualmente em palco, na revista O Beijo (1917) no Teatro da Avenida. No ecrã, despontou em Lisboa, Crónica Anedótica (1930 - Leitão de Barros). A consagração surgiu em A Canção de Lisboa (1933 - Cottinelli Telmo), culminando com O Pai Tirano (António Lopes Ribeiro) e O Pátio das Cantigas (1941 - Francisco Ribeiro/Ribeirinho). Destes, participou no argumento ou nos diálogos, bem como de Maria Papoila (1937 - L. Barros) e O Costa d'África (1954 - João Mendes), do qual também foi intérprete. O seu talento dramático registou-se em Camões (1946 - L. Barros). Fez o texto e a locução de Famalicão (1940 - Manoel de Oliveira). Em 1952, foi o Zé na série Confissões de Um Analfabeto (Carlos Marques). Outros filmes: Ribatejo (1949 - Henrique Campos), O Dinheiro dos Pobres (1954 - Artur Semedo). Ainda popular actor de rádio (O Zequinha e a Lelé, com Irene Velez - 1947-1948) e televisão (após Três Rapazes e Uma Rapariga - 1957 - Nuno Fradique), faleceu em Lisboa, em 13 de Junho de 1958.

PARLATÓRiO

Se eu pudesse dar-vos algum presente, seria o sentimento de amor à vida dos seres humanos. A consciência de aprender tudo o que nos foi ensinado pelo tempo fora. Lembraria os erros que foram cometidos, como sinais para que não mais se repetissem. A capacidade de escolher novos rumos. Seria, se pudesse, o respeito por aquilo que é indispensável: além do pão, o trabalho e a acção. E, quando tudo mais faltasse, eu dir-vos-ia um segredo. O de buscar no nosso próprio íntimo o modo de encontrar uma solução.
Mahatma Gandhi

VISTORiA




A universal máquina do Mundo divide-se em duas partes. Celestial e elementar. A parte elementar é sujeita a contínua alteração: e divide-se em quatro, a terra a qual está como centro do mundo no meio assentada, segue-se logo a água e ao redor dela o ar e logo o fogo puro que chega ao céu da lua, segundo diz Aristóteles no livro dos metheoros. Porque assim os dispôs deus glorioso e alto. E estes quatro são chamados elementos, os quais uns aos outros se alteram e corrompem e tornam a gerar. São os elementos corpos sem partes que não se podem partir em partes de diversas formas, pela mistura dos quais se fazem diversas espécies de coisas que se geram. E cada um dos três rodeia a terra por todos os lados, senão quando a secura da terra resiste a humidade da água protege a vida de alguns seres animados. E todos os outros, excepto a terra, se movem, a qual como centro com seu peso, foge igualmente de todas as partes o grande movimento dos extremos e fica no meio da Esfera.

À volta da região dos elementos, está logo a região elementar lúcida e pelo seu ser imutável é livre de qualquer mudança, têm movimento circular contínuo e chamam-lhe os filósofos Quinta essência. São nove esferas... Convém saber, esfera da Lua, do Mercúrio, de Vénus, do Sol, de Marte, de Júpiter, de Saturno, das estrelas fixas, e a do derradeiro céu. E cada uma das de cima envolve a de baixo. Tem dois movimentos o primeiro é o do derradeiro céu, e faz-se sobre os dois extremos do eixo, o polo Árctico e o Antárctico, começa do oriente e vai a ocidente e volta outra vez a oriente, este movimento divide ao meio o equinocial. O outro movimento é o das esferas inferiores, oblíquo e contrário ao primeiro, tem eixos próprios sobre o qual se faz, os quais estão afastados do primeiro de 23 graus e meio. Mas o primeiro movimento, move e leva com seu ímpeto todas as outras Esferas e num dia com a sua noite fazem à volta da terra uma revolução. E porem elas sem embargo deste movimento andam ao contrário. A oitava Esfera em cem anos um grau, e este segundo movimento parte ao meio o zodíaco, debaixo do qual cada um dos planetas tem a sua própria esfera, na qual anda com o seu movimento próprio, contra o movimento do derradeiro ceú, e em diversos espaços de tempo fazem as suas revoluções. Saturno em 30 anos, Júpiter em 12, Marte em dois, Sol em 365 dias e quase seis horas, Vénus e Mercúrio em quase em outro tanto tempo, a Lua em vinte e sete dias e oito horas.

Da Revolução do Céu

Que o céu ande de oriente para ocidente temos sinal. Porque as estrelas que nascem em oriente sempre se vão alcançando pouco a pouco até virem ao meio do céu, e ficam sempre igualmente afastadas umas das outras, e assim vão continuamente e com esta igualdade até se porem. Temos sinal que as estrelas que estão junto do polo Árctico as quais nunca se nos põem, movem-se continuamente e igualmente, fazendo as suas revoluções em redor do polo, e sempre vão em igual compasso umas com as outras. Assim que por estes dois movimentos contínuos das estrelas que se põem e das que se não põem, fica provado que o firmamento se move de oriente para ocidente.

Da Redondeza do Céu

Que o céu seja redondo há três razões. Semelhança, proveito e necessidade. Pela semelhança se prova o céu ser redondo porque este mundo sensível, é feito à semelhança do mundo arquétipo, e o qual não tem princípio nem fim. O proveito é porque de todos os corpos isoperimétricos a esfera é a maior, e de todas as figuras a redonda é a mais capaz. E, portanto o que for maior e redondo será sempre capacíssimo. Pois como quer que o mundo contenha todas as coisas, a figura redonda foi-lhe a mais proveitosa. A necessidade é porque se o mundo tivesse outra figura que não a redonda, digamos, de três faces, quatro ou muitas, seguir-se-iam dois impossíveis, a saber que algum lugar estaria vazio e que algum corpo estaria sem ter lugar, as quais coisas são ambas falsas.

E tem-se como diz Alfragano, se o céu fosse chão uma parte do chão estaria mais perto de nós que outra, convém saber, aquela que estivesse sobre a nossa cabeça. E portanto a estrela que aí estivesse nos chegaria mais que quando estivesse em oriente ou ocidente. E porque as coisas que se vêm de mais perto parecem maiores. Portanto o sol ou outra qualquer estrela, estando no meio do céu havia de parecer maior que quando estivesse a oriente ou ocidente. Mas nós vemos o contrário, que maior parece o sol, ou outra qualquer estrela, no oriente ou ocidente, que no meio do céu. E a verdade não é assim, mas a causa deste parecer é, que no inverno e no tempo chuvoso sobem alguns vapores entre a nossa vista e o sol ou estrela, e porque os tais vapores são corpo diáfano, afastam os raios visuais, de tal forma que não compreendemos a coisa em sua natural e verdadeira quantidade, como parece o dinheiro que se lança no fundo de água limpa, o qual pelos raios da vista se espalharem, parecem maiores do que a sua verdadeira quantidade.

 Da Redondeza da Terra

 Que a terra seja, também ela, redonda prova-se, porque os Signos e as estrelas não nascem nem se põem igualmente a todos os homens em todas as partes, mas primeiro nascem e põem-se as que vivem no oriente do que aos que vivem no ocidente. E a redondeza da terra causa que mais cedo ou mais tarde nasçam se ponham a uns do que a outros, o que claramente parece ser assim pelas coisas que no céu se fazem. Que um mesmo Cris da lua vemos na primeira hora da noite e os orientais na terceira. Pelo qual consta que primeiro foi a eles a noite e se lhes pôs o sol que a nós. Não há outra causa disto, salvo a redondeza da terra. Pois que também seja redonda do norte para o sul, tem sua prova. Porque aos que vivem da banda do norte, as estrelas que estão junto do polo árctico nunca se lhes põem, e as que estão junto do polo antárctico nunca lhes nascem nem as podem nunca ver. E portanto se alguém fosse do norte para o sul, tanto poderia ir, que as estrelas que sempre via já não via. E a quem fosse do sul para o norte outro tanto aconteceria, a causa é a terra ser redonda. Mais se a terra fosse chata de oriente para ocidente as Estrelas nasceriam ao mesmo tempo tanto para os orientais como para os ocidentais, o que claramente é falso. E se do norte ao sul fosse chata, seguir-se-ia que as estrelas que um sempre vê, mesmo que muito pelo caminho andasse, nunca as deixaria de ver, o que também é falso, mas a sua grande quantidade a faz parecer chata.

Pedro Nunes - Tratado da Sphera
de Sacrobosco (excerto)





IMAGINÁRiO163
16 JAN 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

IMPRESSÕES

 



A impressão de algo que já vimos, a sensação de lá termos estado, enovelam-se sob o fascínio do imaginário na persistência da realidade, em apelativa convergência entre a tradição literária e a virtualidade cinematográfica. Eis os volúveis parâmetros expostos por Déjà Vu - com edição em DVD, sob chancela Lusomundo - sobre argumento de Bill Marsilii & Terry Rossio, sagrando uma aventura empolgante e intrincada, na qual voltam a cumpliciar-se o realizador Tony Scott e o produtor Jerry Bruckheimer. Tudo se precipita após a explosão duma bomba em ferry de Nova Orleães, provocando o caos entre os inúmeros passageiros. O agente Doug Carlin é incumbido de investigar o devastador atentado, deparando-se com um cenário de vestígios que assombram o terrorismo, a par com o rosto duma mulher vitimada que lhe é conhecido. A catástrofe colectiva, a inquietação singular, forjam-se numa vertigem criminal, resgatadora em conexão ao expediente científico duma reconstituição temporal... Em tal misto de referências ou coincidências factuais e ficcionais, Denzel Washington assume o perturbador paradigma da transfiguração, sob o inextrincável ciclo entre vida e morte.

CALENDÁRiO

1928-26AGO2007 - Alberto de Lacerda: «Falta-me a necessária / Respiração terrena / Desapareço nem rápida / Nem lentamente / A tua voz sou eu / Estrangulado» (Mecânica Celeste - excerto - 1968).

31AGO-28OUT2007 - Centro Cultural de Cascais expõe Ser Português de Joaquim Carvalho.

19SET2007 - São trasladados para o Panteão Nacional os restos mortais de Aquilino Ribeiro (1835-1963), cuja obra O Malhadinhas (1922) é lançada por Bertrand EditoraLIMAG.50-128.

22-30SET2007 - Em Viseu, decorre o XV Salão Internacional de Banda Desenhada, organizado pelo GICAV/Grupo de Intervenção e Criatividade Artística de Viseu.

MEMÓRiA

1843-04SET1907 - Edvard Grieg: «Artistas como Bach e Beethoven ergueram igrejas e templos às alturas. Eu apenas queria... construir habitações em que as pessoas se sentissem felizes e em casa».

1861-21JAN1938 - Georges Méliès: «Quando realizei Viagem à Lua [1902], ainda não havia estrelas entre os artistas, os seus nomes não eram conhecidos nem estavam impressos nos cartazes ou nos anúncios».

22JAN1788-1824 - George Gordon Noel Byron, aliás Lord Byron: «Vivi, amei, bebi, tal como tu; morri; / Que renuncie e terra aos ossos meus / Enche! Não podes injuriar-me; tem o verme / Lábios mais repugnantes do que os teus.» (Versos Inscritos Numa Taça Feita de Um Crânio)

23JAN1928-2002 - Armando Cortez: «Não é sonho, mas utopia, todo o sonho que não se transforma em realidade».

ANTIQUÁRiO

20JAN1958 - No número 1394 de revista Pulgarcito, são reveladas as aventuras de Mortadelo y Filemón/Mortadela e Salamão por Francisco Ibañez IMAG.36.

22JAN1818 - Instala-se no Porto o Sinédrio, do qual foi iniciador Manuel Fernandes Tomaz (1771-1822), de acordo com José Ferreira Borges. Esta associação secreta nunca teve mais de treze membros, e exerceu «grande preponderância nos sucessos de 1820, influindo as suas opiniões no espírito de muitos indivíduos importantes na magistratura, no estado eclesiástico, no exército, no comércio e nas classes populares»
22JAN1897 - Diário de Notícias.

QUESTIONÁRiO

 

 

François Truffaut: Concorda com o estudo do cinema nas universidades?

Alfred Hitchcock: Sim, com a condição que se ensine o cinema desde Méliès, que se aprenda a fazer fitas mudas, porque não há melhor exercício do que esse. O cinema falado, ou sonoro, em muitos casos serviu apenas para introduzir o teatro nos estúdios. O perigo está em que os jovens, ou até os menos jovens, imaginam - com demasiada frequência - que podem ser realizadores sem saberem desenhar um cenário, ou montar um filme.
François Truffaut
O Cinema de Alfred Hitchcock

 TRAJECTÓRiA

GEORGES MÉLIÈS




Nasceu em Paris, a 8 de Dezembro de 1861, filho de um fabricante de calçado. Em 1879, concluiu os estudos liceais. Após o serviço militar em 1881, ingressou na empresa paterna - secção dos mecanismos. Durante estadia em Londres, aprendeu o idioma e interessou-se pelo ilusionismo. Em 1885, casou com Eugénie Génin, e dedicou-se a espectáculos de prestidigitação no Cabinet Fantastique du Musée Grévin e no Théâtre des Ilusions, que viria a adquirir em 1888 e a explorar como Théâtre Robert-Houdin. Em 1891, fundou a Académie de Prestidigitation, após 1904 Chambre Syndicale de Prestidigitation, e de que foi Presidente por dezenas de anos. Em 1895, assistiu à apresentação do Cinématographe Lumière; tentou em vão, maravilhado, adquirir uma câmara. Com o seu próprio aparelho, alterando um modelo adquirido a Robert W. Paul em Londres, começou por realizar Une Partie de Cartes (1896). Em 1897, construiu um estúdio em Montreuil e fundou a Star Film. A partir de 1898, dedicou-se a actualidades reconstituídas e, com recurso a trucagens, dirigiu fitas de mise-en-scène como L’Affaire Dreyfus/O Caso Dreyfus (1899) e Jeanne d’Arc/Joana d’Arc (1900). Em 1902 - ano da fantástica Le Voyage Dans la Lune/Viagem à Lua  e de Robinson Crusoé - visitou os EUA, começando a vender para o mercado americano. Seguiram-se Le Royaume des Fées/O Reino das Fadas (1903) ou Fausto (1904), entre dezenas de títulos em comédia, drama, magia, história, romance, mistério e melodrama. Em 1909, liderou em Paris o Congresso Internacional dos Fabricantes de Filmes. Em 1911, dirigiu Les Hallucinations du Baron de Münchausen/As Alucinações do Barão Munchausen, e assinou um contrato de distribuição exclusiva pela Pathé. Em 1914, com a I Grande Guerra e o declínio económico, além da recente viuvez (1913), desistiu da Star Film e criou, em Montreuil-Sur-Bois, o Théâtre Lirique des Variétés Artistiques, de que foi empresário e actor. Em 1925, desposou Charlotte Faes, de nome artístico Jehanne d’Alcy. Reconhecido, por 1928, como um dos grandes pioneiros do cinema, responsável por cerca de seiscentas produções, foi distinguido com a Legião de Honra. Em 1932, retirou-se para Château d’Orly, instituição de La Mutuelle du Cinéma, onde faleceu a 21 de Janeiro de 1938.

VISTORiA

 
Adeus

Adeus! e para sempre embora,
Que seja para nunca mais:
Sei teu rancor - mas contra ti
Não me rebelarei jamais.

Visses nu meu peito, onde a fronte
Tu descansavas mansamente
E te tomava um calmo sono
Que perderás completamente:

Que cada fundo pensamento
No coração pudesses ver!
Que estava mal deixá-lo assim
Por fim virias a saber.

Louve-te o mundo por teu acto,
Sorria ele ante a acção feia:
Esse louvor deve ofender-te,
Pois funda-se na dor alheia.

Desfigurassem-me defeitos:
Mão não havia menos dura
Que a de quem antes me abraçava
Que me ferisse assim sem cura?

Não te iludas contudo: o amor
Pode afundar-se devagar;
Porém não pode os corações
Um golpe súbito apartar.
Lord Byron (excerto)

PARLATÓRiO

Como homem honrou a natureza; como cidadão, a pátria que o diga: eu falarei por ela: entrado, depois de distintos estudos, na carreira da magistratura, desempenhados (admirável e quase incrível feito!) seus difíceis encargos com a pontualidade de um juiz-cidadão, o patriotismo de [Manuel] Fernandes Tomaz não estava satisfeito ainda com a simples prática das virtudes cívicas passivas: cabia maior esforço em coração tamanho, e maior tarefa era dada a braço tão valente: olhou para a sua Pátria, e gemeu sobre ela: a sua alma era livre, mas os seus pulsos tinham ferros; e esses ferros eram um pequeno elo de grilhão imenso que pesava sobre a pátria.
Almeida Garrett (1822)

Viagem à Lua foi a primeira grande comédia de magia em imagens animadas, que determinou de modo definitivo a entrada do cinema no caminho teatral e espectacular. Foi o primeiro grande filme de fantasia e de composição, com argumento inteiramente concebido para cinema. A acção desenrolava-se sem legendas, e era perfeitamente compreensível em todos os países. Realmente, e por excelência, foi o filme internacional.
Georges Méliès

PRIORITÁRiO

www.dominiopublico.gov.br - Lançado em novembro de 2004, o Portal Domínio Público - com um acervo inicial de quinhentas obras - coloca à disposição de todos os usuários uma biblioteca virtual, que deverá constituir-se em referência para professores, alunos, investigadores e para a população em geral. Permite a colecta, a integração, a preservação e a partilha de conhecimentos de forma equitativa, sendo seu principal objectivo promover o amplo acesso às obras literárias, artísticas e científicas (na forma de textos, sons, imagens e vídeos), já em domínio público ou que tenham a sua divulgação devidamente autorizada, que constituem o património cultural brasileiro e universal. [Fernando Haddad - Ministro de Estado da Educação]

EXTRAORDINÁRiO

 O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

 Capítulo Sete
CONTRAFEITOS À CONTRIÇÃO - 58

 No mais, e para a favorita do Vulcão, aquilo levedava em fantochada mediática, em gandulice bestial, em gabarolismo proxeneta. Porém, nada que lhes beliscasse a pompa, a prosa ou a proeza - como Rui Ruivo validava a certa distância, fingindo atender a mais uma prelecção proverbial pelo bocejante Jacinto Magno, com vagos assentimentos de cabeça, enquanto reparava mesmo na tangência oblíqua que Ofélia monitorizava até Deodato, de costas para ambos e ávido de Vénus. Se ela continuasse assim, embora implícita na pulsão de Fada, iria repreendê-la nalgum próximo transe formal, como parceiros causídicos...

  Continua  



 

IMAGINÁRiO162
08 JAN 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

ARTEFACTOS



Antigos mapas que assinalam o paradeiro de tesouros fabulosos, artefactos fantásticos que comportam a navegação nos mares e no tempo, museus de artes que testemunham a memória de épocas lendárias, o fascínio através de gerações para viver e assumir aventuras e emoções fortes... Numa actualidade virtual, três jovens amigos protagonizam Abrafaxe e a Bandeira dos Piratas, partilhando amizades e cumplicidades para desafiarem todos os perigos. Sob chancela das Edições Asa, eis O Álbum do Filme - com animação de Gerhard Hahn & Tony Power, sobre argumento por Richard Everett, Thomas Platt & Julius Grützke - lançado entre nós em DVD por Lusomundo. Em quadradinhos, o inspirado Sergio Tulipano concebeu um argumento trepidante, estilizado por Massimiliano Narciso, aliás Max, num imaginário prodigioso, pelas cores transfiguradas de Marieke Ferrari. Transferidos para as Caraíbas, no Século XVIII, Max, Alex e Califax enfrentam uma abordagem do terrível Capitão Barbenegra, acabando enfeitiçados na Ilha Tortuga, governada pela bela Anne Bonny...

MEMÓRiA

10JAN1898-1993 - Josefina Silva: «Uma belíssima actriz - e, à parte o seu talento, uma senhora excepcional, das pessoas mais humanas que conheci» (Cármen Dolores).

1924-10JAN1998 - Pisani Burnay: «…Uma referência a nível nacional e internacional em matéria de armaria, iconografia na história da arte portuguesa, evolução da indumentária na Europa, teatro antigo e contemporâneo. Possuía, sobretudo, conhecimentos profundos acerca de maçonaria, simbolismo e esoterismo» (António Valdemar - 2000).

14JAN1878-1919 - Victor Segalen: «De longe, de tão longe, venho para junto de ti, amigo, o mais querido. Os meus passos anularam a horrível distância que existia entre nós».

JAN1548-1600 - Filippo Bruno, aliás Bruno Nolano ou Bruno da Nola - frade dominicano, teólogo, filósofo e cosmólogo - aliás, Giordano Bruno: «Aquele que cruzou o espaço, penetrando no céu, descortinando as estrelas, ultrapassando as margens do mundo, faz com que desapareçam as fantasiosas muralhas da primeira, oitava, nona, décima, e tantas outras que os maus matemáticos e o beco sem saída da visão dos filósofos vulgares puderam agregar às esferas».

VISTORiA

Feliz na tristeza, triste na alegria… As velas que fiz nascer, as quais iluminarão certas sombras de ideias... O tempo dá tudo e tudo toma, tudo muda mas nada morre... Com esta filosofia, o meu espírito cresce, a minha mente expande-se. Por isso, apesar de quanto obscura a noite possa ser, eu espero o nascer do dia... Alegrem-se, portanto, e mantenham a união, se puderem, e retribuam o amor com amor.
Giordano Bruno - Il Candelaio (1582)

Sobre todas as coisas, situa-se a verdade; porque esta é a unidade que superintende a tudo, é a bondade que é preeminente a todas as coisas… Não existe deleite sem um misto de tristeza.
Giordano Bruno - Spaccio de la Bestia Trionfante (1584)

Todo o amor deriva do acto de ver: o amor inteligível, do acto de ver inteligivelmente; o sensível, do acto de ver sensivelmente… A poesia não nasce das regras, a não ser em parte mínima e insignificante; mas as regras derivam das poesias; e, no entanto, são tantos os géneros e as espécies de verdadeiras regras, quantos são os géneros e as espécies de verdadeiros poetas.
Giordano Bruno - Eroici Furori (1585)

RELATÓRiO

 

 
Documento Final da Congregação do Santo Ofício, presidida pelo Papa Clemente VIII em 21 de Dezembro de 1599

Os padres teólogos deverão inculcar, no dito frade Giordano, que as suas proposições são heréticas e contrárias à fé católica... Se as rechaçar como tais, se quiser abjurá-las, que seja admitido para a penitência com as devidas penas. Se não, será fixado um prazo de 40 dias para o arrependimento que se concede aos hereges impenitentes e pertinazes. Que tudo isso se faça da melhor maneira possível e na forma devida.

PARLATÓRiO

Certamente temem mais vocês, a Força, em pronunciar esta sentença, do que eu em escutá-la!
Giordano Bruno, excomungado e ajoelhado perante nove Inquisidores e o Governador de Roma, a 08FEV1600, na Piazza Navona, para escutar a condenação à morte pela fogueira, por não se ter retratado das suas ideias e opiniões, e abjurado

NOTICIÁRiO







Quinta-Feira de manhã em Campo de' Fiore foi queimado, vivo, aquele celerado frade dominicano de Nola, de quem se regista quanto aos autos: herético obstinadíssimo, e tendo por capricho seu formado diversos dogmas contra a nossa fé, e em particular contra a Santíssima Virgem e Santos, queria obstinadamente morrer por eles o celerado; e dizia que morria mártir e de vontade, e que não se perturbaria a sua alma ascendente com aquele fumo no paraíso. Por assim ter em ideia, dizia a verdade... Morria mártir e de boa vontade.
19FEV1600 - Avviso
(Roma, cronista anónimo)

EPISTOLÁRiO

Carta do Cardeal Angelo Sodano por Ocasião de um Congresso Sobre a Personalidade de Giordano Bruno

14 de Fevereiro de 2000 - Ao Reverendo Reitor da Pontifícia Faculdade Teológica da Itália Meridional

Com a carta de 18 de Janeiro passado, Vossa Reverência quis gentilmente assinalar ao Santo Padre a iniciativa do Congresso, que essa Faculdade Teológica celebrará nos dias 17-18 de Fevereiro do corrente ano, sobre o tema: Giordano Bruno - Para Além do Mito e das Opostas Paixões - Uma Verificação Histórico-Teológica, e ilustrou ainda o sentido que, na óptica do Grande Jubileu, se quer dar a esse Congresso.

Para a Igreja, o Ano jubilar constitui uma ocasião privilegiada para reavivar e celebrar a sua fé em Cristo: à luz da Encarnação, ela tem em vista reflectir com gratidão sobre os inumeráveis frutos de santidade amadurecidos no seu seio, no arco destes dois milénios. Contudo, isto não a dispensa de recordar as muitas incoerências que assinalaram o comportamento dos seus filhos, lançando sombras sobre o anúncio do Evangelho. É por isto que, entre os sinais do Jubileu, o Sumo Pontífice pôs o da  purificação  da  memória,  pedindo a todos  um  acto  de  coragem  e  de  humildade  ao  reconhecer  as  próprias faltas e as de quantos tiveram e têm o nome de cristãos (cf. Incarnationis Mysterium, 11).

Alguns importantes simpósios desenvolveram-se nesta direcção - como por exemplo sobre o anti-semitismo, a inquisição e João Hus - que se realizaram com o patrocínio da Santa Sé, para estabelecer no plano histórico o desenvolvimento efectivo dos acontecimentos e discernir aquilo que neles deve ser julgado pouco conforme com o espírito evangélico. Semelhante verificação parece importante quer para pedir perdão a Deus e aos irmãos pelas faltas eventualmente cometidas, quer para orientar a consciência cristã para um futuro mais vigilante na fidelidade a Cristo.

Portanto, Sua Santidade soube com prazer que, precisamente com estes sentimentos, essa Faculdade Teológica quer recordar Giordano Bruno que, no dia  17  de  Fevereiro  de  1600,  foi executado  em  Roma  na praça Campo de' Fiori, após o veredicto de heresia pronunciado pelo Tribunal da Inquisição Romana.

Este triste episódio da história cristã moderna às vezes foi assumido por algumas correntes culturais como motivo e emblema de uma áspera crítica em relação à Igreja. O estilo de diálogo inaugurado pelo Concílio Vaticano II convida-nos a superar toda a tentação polémica, para reler também este evento com espírito aberto à plena verdade histórica.

Assim, é de desejar que o mencionado Congresso, partindo dos interesses próprios de uma faculdade de teologia, possa oferecer um contributo significativo às finalidades da avaliação da personalidade e da vicissitude do filósofo de Nola que, como se sabe, recebeu precisamente em Nápoles, no convento de São Domingos Maior, a sua formação e ali fez a sua profissão religiosa na Ordem dos Pregadores.

Na realidade, também com base em actualizadas pesquisas feitas por estudiosos de diversa inspiração, parece aceite que o caminho do seu pensamento, que se desenvolveu no contexto de uma existência sobretudo movimentada e tendo como cenário uma cristandade infelizmente dividida, o tenha levado a opções intelectuais que se revelaram de maneira progressiva, sobre alguns pontos decisivos, inconciliáveis com a doutrina cristã. Compete a uma investigação ulteriormente aprofundada avaliar o efectivo alcance do seu afastamento da fé.

Resta o facto que os membros do Tribunal da Inquisição o processaram com os métodos de coacção então comuns, pronunciando um veredicto que, em conformidade com o direito da época, foi inevitavelmente portador de uma morte atroz. Não nos compete exprimir juízos sobre a consciência de quantos estiveram implicados nesta vicissitude. Quanto emerge historicamente dá-nos motivo para pensar que os juízos do pensador estavam animados pelo desejo de servir a verdade e de promover o bem comum, fazendo também o possível para salvar a própria vida. Objectivamente, porém, alguns aspectos de tais modos de proceder e, em particular, o seu final violento às mãos do poder civil, não podem deixar de constituir hoje para a Igreja - neste como em todos os casos análogos - um motivo de profundo pesar. O Concílio recordou-nos oportunamente que a verdade «não se impõe de outro modo senão pela sua própria força» (Dignitatis Humanae, 1). Por isso, ela deve ser testemunhada no absoluto respeito da consciência e da dignidade de cada pessoa.

Confio-lhe, Senhor Reitor, a tarefa de transmitir estes pensamentos aos participantes no mencionado Congresso, aos quais o Santo Padre envia a sua saudação de bênção. Queira o Senhor ajudar a Igreja do terceiro milénio, também através da recordação destes eventos dolorosos, a encarnar sempre melhor o espírito do Evangelho. O anúncio de Cristo, efectuado com fervor de fé mas juntamente com atitudes de sincero e respeitoso diálogo, torna-a cada vez mais como o Concílio a delineou, «o sinal e o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano» (Lumen Gentium, 1).

Com as minhas cordiais saudações.

Angelo, Card. Sodano
Secretário de Estado

PRIORITÁRiO

 

 

www.omeninotriste.blogspot.com - Sob chancela Grupo Extractus, incursão de O Menino Triste por J. Mascarenhas na Blogosfera. Além de referências às origens do juvenil herói em quadradinhos, incluem-se curiosidades, bandas desenhadas, animações, projectos e actividades alusivas. Comentários ou opiniões dos visitantes são bem-vindos! IMAG.65-127.

BREVIÁRiO

2007 - Tinta da China edita Tratado da Magia (1590-1591) de Giordano Bruno; tradução de Rui Tavares.

Campo da Comunicação edita A/c. M.a.(i.) - 54 Poemas de Amor e 5 de Maledicência de Salvato Telles de Menezes.



IMAGINÁRiO161

01 JAN 2008 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano V · Semanal · Fundado em 2004


 PRONTUÁRiO

 NOSTALGIA




Tendo recriado, com desencanto e sarcasmo, facetas de uma América esteriotipada, transitória ou em dissipação, Robert Altman funde lucidez e emoções, para nos revelar a mais candente representação simbólica quanto à visão global: o confronto solitário e a rotura conjuntural, expondo-se ao mundo do espectáculo ou ao desígnio do poder. As matrizes profundas, as raízes tradicionais, sagradas por Nashville (1975) sob o signo da soul and country music, voltam a contrastar-se em Bastidores da Rádio - com edição em DVD, sob chancela Lusomundo - sobre A Prairie Home Companion, um autêntico e popular programa, emitido a partir do Fitzgerald Theatre, em St. Paul (Minesota), desde 1974. Nesta noite, porém, maior tensão paira no ar, pois a estação WLT acaba de ser vendida, sem que tal deva influenciar o apresentador GK... Aliás Garrison Keillor, o real autor desse fenómeno diletante e nostálgico, e argumentista de um vibrante testemunho cinematográfico - que Altman filmou no próprio templo com o nome do escritor F. Scott Fitzgerald, dali natural - interpretado por um fabuloso painel de vedetas, como Woody Harrelson, Meryl Streep e Tommy Lee Jones.

CALENDÁRiO

14AGO2007-25SET2007 - Museu Municipal de Montijo expõe Praça de Toiros Amadeu Augusto dos Santos, 50 Anos de Tradição: Entre o Passado e o Presente.

1944-25AGO2007 - Eduardo Prado Coelho: «Sou um pouco céptico no âmbito da existência quotidiana, na medida em que muitas vezes tropeçamos no sentido das palavras e criamos conflitos onde nada os justificava» (2003 - Cartas de D. José Policarpo e EPC).

MEMÓRiA

1850-04OUT1907 - Alfredo Keil: compositor, artista plástico, poeta, arqueólogo, coleccionador de arte, autor do canto patriótico A Portuguesa, convertido em Hino Nacional, após a instauração da República em Portugal IMAG.87.

518 aC-438 aC - Píndaro: «Homem, torna-te no que és.»

1852-02JAN1908 - D. João da Câmara: «É um dos maiores dramaturgos portugueses: as suas obras ficarão no nosso teatro porque são profundamente humanas. E ele não dispõe de grandes efeitos: a sua arte não arrasta pelo tablado mantos de púrpura; pelo contrário, quase sempre traz um vestido tão coçado que se lhe vê - a alma imortal. Porque os farrapos desfazem-se, leva-os o vento: a alma não; essa é eterna» (Raul Brandão - Álbum Açoreano, 1903) IMAG.133.

VISTORiA


Para Aristomeno de Egina,
Vencedor na Luta

Serenidade, filha benévola da Justiça,
que engrandece a cidade,
tu, que tens as chaves supremas
dos conselhos e das guerras,
acolhe esta honra ao vitorioso Pítico, Aristomeno.
Tu sabes o momento exacto de proporcionar o contentamento
e de, do mesmo modo, recebê-lo.

Tu, quando alguém introduz em teu coração
o amargo ressentimento,
vais rude contra os inimigos,
colocando o poder da intemperança
no fundo do mar. Nem Porfírio escapou,
à margem de seu interesse, ao provocar-te. O ganho mais alto é
consentido, se alguém o traz de casa.

A força, com o tempo, abate o arrogante.
Tifon, o Cilício de cem cabeças, não a evitou,
nem, na verdade, o rei dos Gigantes, domados pelo raio
e pelas flechas de Apolo, o qual com a mente bem disposta
recebeu, vindo de Cirra, o filho coroado
de Xenarques, com louro do Parnaso e Coro Dórico.

Ela não é indiferente às Graças,
esta ilha que tange a cidade justa
e conheceu as famosas
virtudes dos Eácidas. Desde a origem tem
sua reputação perfeita. Aos muitos canta,
tendo nutrido heróis em lutas vitoriosas e em rapidez
eminentes nos combates.

Píndaro - Oitava Pítica (excerto)

INVENTÁRiO


LEITÃO DE BARROS
E A LUSITANIA FILM

Em 1918, já professor de desenho e jornalista, José Leitão de Barros consubstanciou, com vinte e dois anos, as ambições dos responsáveis da Lusitania Film - Celestino Soares e Luis Reis Santos - em concretizarem pequenas fitas de entrecho. Antes mesmo de concluída a remodelação do antigo estúdio da Portugalia Film, que haviam adquirido, segundo os planos que, do Porto, lhes facultara a Invicta Film.

Assim, Leitão de Barros realizou Malmequer e Mal de Espanha - o primeiro dos quais inteiramente em curso pelos magníficos jardins do Palácio de Queluz, cuja estatuária é bem explorada a condizer com a toada romântica do entrecho. Robles Monteiro encarna um nobre elegante, que se afasta das mesuras e salamaleques da pompa e danças da corte, errando para um local retirado onde, ao despetalar um malmequer, vai recordando as fases de ventura e seguinte desespero, da sua paixão por uma mulher volúvel, requestada, naqueles sítios de presente amargura. Mas estranho presságio se confirma: também ela - Alda de Aguiar - para lá se dirige, em romagem sobre um amor perdido... Além do melodrama, Leitão de Barros revela um sentido crítico à sociedade fútil e faustosa do Século XVIII, cadência narrativa e uso eficaz da sugestão visual - com os amantes desunidos descendo por escadas opostas - sublinhada pela fotografia de Manuel Maria da Costa Veiga.

Se Malmequer aflora o decadente sentimentalismo da aristocracia, Mal de Espanha é uma sátira saborosa à pequena burguesia, seus rituais de organização e continuidade, regida por invioláveis regras de preservação moral. Abúndio (Joaquim Costa), exemplar chefe de família, recusa a mão da filha Judith (Beatriz Viana) a Mário Cabral (José Azambuja), aliás um bom partido; mas deixa-se dominar pela tentação de Lola (Laura Costa), uma insinuante bailarina espanhola. Afinal, cilada bem urdida faz Abúndio deparar-se com a mulher, Atanásia (Sofia Santos), num encontro que marcara com Lola e, perante a manifesta prova de infidelidade, vê-se constrangido a aceitar o futuro genro, prometendo arrepender-se dos seus devaneios... Filmada em grande parte na Praia do Lagoal, em Caxias, sendo operador Artur Costa de Macedo, esta pitoresca curta metragem oscila entre a crónica afectiva e a crítica de costumes.

Inacabado - por falência da Lusitania Film - ficaria O Homem dos Olhos Tortos, um projecto de serial em nove partes, sob o figurino americano de aventuras, emoção e suspense. O entrecho era baseado em O Mistério da Rua Saraiva de Carvalho, um folhetim de Reinaldo Ferreira aparecido n’A Capital, e pelo próprio adaptado, embora haja quem atribua a versão fílmica a Reis Santos, que foi director artístico. Assistente geral, Álvaro Pereira também aparecia como Waldemar Frankel, abominável líder dum grupo de espiões germânicos, em vasto elenco protagonizado por António Sarmento na pele de Gil Goes, um audacioso detective português IMAG.103.

ANTIQUÁRiO

 01JAN1898 - Nova Iorque é considerada «a segunda cidade do Mundo», pois passa a incorporar Brooklyn, Richmond, Flushing, Jamaica, Long Island, City Neroton, East e West Chester, totalizando 3.200.000 habitantes (Diário de Notícias).

NOTICIÁRiO

Anarquistas - Foram ontem distribuídas umas proclamações impressas em papel encarnado, intituladas «Morra a Burguesia!». Fala em punhal, em dinamite, no petróleo, no arrasamento da sociedade e outras coisas tétricas.

03JAN1895 - Diário de Notícias

BREVIÁRiO

Campo das Letras edita O Cinema Português Através dos Seus Filmes de Carolin Overhoff Ferreira (coordenação), Bárbara Barroso, Fausto Cruchinho, Jorge Campos, Jorge Leitão Ramos, Jorge Seabra, José de Matos-Cruz, Lisa Shaw, Luís Reis Torgal, Malte Hagener, Maria do Rosário Leitão Lupi Bello, Martin Barnier, Oliver Vogt, Paulo Filipe Monteiro, Paulo Jorge Granja, Paulo Cunha, Randal Johnson e Ronald Balczuweit.

Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema edita Roger Corman - O Anjo Selvagem de Hollywood; organização literária de Manuel Cintra Ferreira, coordenação de Luís Miguel Oliveira.

Livros do Brasil edita, no número 700 da colecção Vampiro, Memórias de Um Chauffeur de Táxi de Reinaldo Ferreira IMAG.53.

¯DGG/Universal lança em CD, Anna Netrebko & Rolando Villazón: Duets; com a orquestra Dresden Staatskapelle, sendo director Nicola Luisotti.

¨Alêtheia Editores lança A Revolução Liberal 1834-1836 - Os «Devoristas» de Vasco Pulido Valente.

¨Bonecos Rebeldes edita João Franco [1855-1929] - O Último Cônsul de D. Carlos de José Rocha Martins (1879-1923).

¨Gradiva edita Antero de Quental ou A Noite Intacta de Eduardo Lourenço IMAG.59-147.

¨Frenesi edita Carta Inédita de Camilo Castelo Branco a Arnaldo Gama (1828-1869), sobre A Caldeira de Pêro Botelho (1866); seguida de outra, a António Feliciano de Castilho IMAG. 27-31-39-41-87-111-113-145.

EXTRAORDINÁRiO

 

O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

Capítulo Sete
CONTRAFEITOS À CONTRIÇÃO - 57

 

 Génio ovante, boémio e fraldiqueiro, Deodato Roble deitava pois o Fado para trás das costas, enquanto ganhava peito, de braços abertos, com um sorriso cívico, em direcção aos circunstantes concelhios e demais vinculados à cerimónia. Entre tantos, algumas. Como que a limpar-se, o conspícuo Deodato depositou um breve beijo no rosto espicaçado de Ofélia Luna, a qual faiscou simulando uma encantada indiferença, e lesto observou o grupinho ao lado, em que vários varões rodeavam uma espécie de lambisgóia, intrigante para ele, e tiritando com ardor.

Jamais frígida, aliás, nunca Vénus reprimiria aquele entusiasmo natural, com que atraía todos os seres vivazes, em qualquer circunstância. É certo, expunha-se agora por provisória motivação, infiltrada, à cata de incautos, ilustres ou não tanto, fracos em cuja pedante pusilanimidade inculcasse o germe da imprudência, preparando pois terreno onde o omnívoro Vulcão havia de cultivar um ávido pandemónio de necessidades sem abstinências, de carências sem falácias, de ganâncias sem escrúpulos.

Continua


 

IMAGINÁRiO160
24 DEZ 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

ANOMALIAS



Era uma vez... Um cão chamado Bandido, um gato chamado Tinker, um coelho chamado Pirata. Três bichos de estimação desaparecidos, para sempre tal como eram, apesar das súplicas públicas dos inconsoláveis donos domésticos. Entretanto, sequestrados pelo Exército dos Estados Unidos, foram geneticamente adulterados, transformados em máquinas de morte sem piedade nem rendição, com armaduras biónicas e expedientes devastadores, cumprindo missões de extermínio nas guerras sujas da política e da criminalidade. Até que eles próprios se tornam obsoletos, a abater inexoravelmente, a substituir por desígnios mais monstruosos da exacerbada aberração científica, ao serviço impune e prepotente do poder exercido, pervertido além das máscaras sociais e democráticas. Porém, o íntimo tormento duma mulher compadecida permite ao extraordinário trio escapar, conquistar a sua liberdade, lutar pela última vez entre a vida e a morte, ansiando apenas regressar a casa! Concebida pelo assombroso Grant Morrison, estilizada pelo visionário Frank Quitely, a trágica e fabulosa saga de WE3 - ArNIMAIS, editada sob chancela Devir, transfigura em quadradinhos o apocalipse humano, entre os crepúsculos da civilização e os primórdios da barbárie.

CALENDÁRiO

02AGO2007 - Atalanta Filmes estreia Torre Bela (1977) de Thomas Harlan; uma herdade de dois mil hectares, no Ribatejo, pertencente ao Duque de Lafões, ocupada em 23 de Abril de 1975 pelos trabalhadores, com o objectivo de procederem à exploração agrícola de géneros de primeira necessidade.

MEMÓRiA

12MAI1907-2003 - Katharine Hepburn: «Às vezes, duvido que o homem e a mulher foram feitos um para o outro. Talvez devessem viver, apenas, como vizinhos e visitarem-se de vez em quando».

1935-16AGO1977 - Elvis Presley: «A verdade é como o sol: pode ocultar-se durante um tempo, mas volta sempre a aparecer» IMAG.20.

1889-25DEZ1977 - Charles Chaplin: «Charlot criou uma personagem que, ao mesmo tempo, pertence ao passado e vive no presente» (Jean-Louis Barrault) IMAG.6-55.

1875-28DEZ1937 - Maurice Ravel: «A música, tal como a sinto, deve ser antes de mais emocional, e só depois intelectual».

ANUÁRiO

1397-1482 - Paolo Toscanelli: Astrónomo, cosmógrafo, médico, geógrafo e cartógrafo italiano, nascido em Florença. Interessado pelas ciências geográficas e fascinado pelas narrativas de Marco Pólo, acreditava num caminho mais curto do que o Cabo da Boa Esperança para chegar à Índia. Traçou um mapa que enviou a Fernando Martina, canónico em Lisboa, tendo facultado uma cópia a Cristóvão Colombo em 1474, acompanhada de amplas referências e explicações.

ANTIQUÁRiO

11JUL1897 - O aeronauta sueco Salomon-Auguste Andrée inicia uma tentativa de travessia do Pólo Norte em balão, no aeróstato Adler. A ascensão principiou em Tromsoe, Noruega, às duas horas e meia da tarde, em condições favoráveis, tendo o aparelho subido a duzentos metros, levando uma velocidade de trinta e cinco quilómetros por hora.

BREVIÁRiO

2006 - Zig-Zag Territoires edita em CD, Bolero de Maurice Ravel pela orquestra Anima Eterna sob direcção de Jos Van Immerseel, com Claire Chevalier ao piano; inclui Pavana Para Uma Infanta Defunta, Concerto Para a Mão Esquerda, Rapsódia Espanhola e La Valse.

NOTICIÁRiO

Sábado - Sara Bernhardt, estando a representar a Teodora, caiu desmaiada nos braços do seu colega Marais. O pano veio abaixo e o espectáculo não concluiu. A célebre artista está em estado de grande fraqueza, e mais aumentado pelos repetidos ensaios da Marion Delorme IMAG.14.
25DEZ1885 - Diário de Notícias

EPISTOLÁRiO

 A Cristovam Colombo, Paulo, fisico, sauda:

Recebi as tuas cartas e agradeço-te as expressões com que me favoreces. É digno do maior louvor o desejo, que mostras, de navegar do Levante para o Poente, como se indica no mapa que te enviei, e melhor poderá demonstrar-se em uma esfera propriamente dita. Foi para mim motivo de jubilo o facto de haver sida compreendida a minha demonstração, e oxalá essa viagem, que por emquanto não saiu ainda dos limites da possibilidade, se tome real e certa, para gloria de quem a levar a cabo, e para interesse de todos os cristãos. Desses paizes só pela experiencia poderás fazer ideia perfeita, emquanto que eu a faço por boas e veridicas informações, que me teem sido fornecidas por homens ilustres e de grande saber, vindos dessas regioes a esta côrte de Roma, e por varios negociantes que ali teem traficado por longo tempo, pessoas estas para mim de toda a fé.
De modo que, quando conseguires levar a cabo essa viagem, penetrarás em poderosos reinos, em provincias e cidades riquissimas, abundantemente providas de todas as coisas de que carecemos, isto é, de todas as especies de drogas e de pedrarias em profusão. De certo ha da ser tambem muito grata aos principes e reis dessas regiões comerciarem e entreterem relações, como ha tanto tempo desejam, com os cristãos dos nossos paizes, não só porque entre eles existem tambem muitos sectarios da nossa religião que teem grandissimo empenho em tratar com os nossos sabios e homens ilustres, mas tambem porque gosam ali de grande reputação os imperios e instituiçoes dos nossos paizes.
Nao me surpreende, pois, por estas e por muitas outras coisas que sobre o assunto poderiam ainda dizer-se, que tu, que és dotado duma tão grande alma, e a mui nobre Nação Portuguesa, que em todos os tempos tem sido sempre enobrecida pelas mais heroicos feitos de tantos homens ilustres, tenhaes tão grande interesse em que essa viagem se realise IMAG.83.

Paolo Toscanelli (1474)

VISTORiA

CHARLES CHAPLIN
ÚLTIMA SEQUÊNCIA





Noite de Natal, 25 de Dezembro de 1977: Charles Spencer Chaplin falece em Corsier, região de Vevey, Suíça, rodeado pela mulher Oona, oito dos dez filhos (Geraldine telefonara de Espanha), e dos seus sete netos. Estava na cama há mais de uma semana, devido a gripe que o enfraquecera irreversivelmente. Os jornais traçam o elogio duma vida acidentada: «Era um homem rico, respeitado, adulado. Completara o ciclo biológico e a sua existência cumprira-se. No mesmo instante, um pequeno vagabundo, de botas cambadas e imensas, bengala sacolejante, sem eira nem beira, entrava na imortalidade».
O mundo escuta comovido a perda de um velho ídolo, enquanto traz ao espírito a insolente imagem de Charlot... Centenas de personalidades da arte, da cultura ou da política expandem, sobre o ilustre desaparecido, louvores originais e sensibilizantes. A 27 de Dezembro, o homem cuja memória pertence ao património universal é enterrado, em simples cerimónia particular (apenas aberta ao embaixador britânico, Allen Keir Rothnie), no pequeno cemitério de Corsier, sobre o Lago Léman. Estimados em muitos milhões de dólares, os bens de Chaplin - incluindo os direitos cinematográficos e o Manoir de Ban (avaliado em quatrocentas mil libras) - teriam sido transferidos para Oona, no princípio dos anos setenta, a fim de evitar os pesados encargos de sucessão IMAG.6-55-99.
@José de Matos-Cruz
Charles Chaplin - A Vida, o Mito, os Filmes (excerto)

PRIORITÁRiO

 MOURA BD

A importância cada vez mais significativa dos certames dedicados aos quadradinhos, em convívio e divulgação, alcança uma relevância suplementar com o lançamento de publicações alusivas que, ao consubstanciarem manifestações diversas, para agrado de visitantes e dos leitores em geral, enriquecem paralelamente uma bibliografia especializada sobre a nona arte, congregando para tal a participação dos melhores investigadores. Nesta ampla perspectiva, o Salão Internacional de Banda Desenhada - Moura Bd tem alicerçado uma intervenção exemplar, com o apoio da Câmara Municipal, de que é patente a décima sexta edição em 2007 - cujo Catálogo-Programa constitui, desde logo, um documento útil sobre os homenageados (Catherine Labey, José Abrantes, Fabio Civitelli e o fenómeno de Tex).

Superando o mero interesse dos apreciadores, O «Western» na Bd Portuguesa amplia o notável trabalho de inventariação e análise que o historiador Jorge Magalhães vem desenvolvendo, por distintos géneros, e de que Banda Desenhada e Ficção Científica era o anterior contributo. Dando continuidade aos Cadernos Moura Bd, e após o número 6 sobre Ulisses de José Batista, o mais recente é dedicado a José Abrantes, privilegiando como personagens uma expressiva afeição por gatos. Em tal dinâmica e temática, sobressai enfim Nas Garras Felinas da Sátira - um precioso álbum coordenado por Osvaldo Macedo de Sousa, a propósito de Humorgrafe, em que convergem tradição e actualidade, pelas vertentes da ilustração e da literatura. Contacto: cmmoura@cm-moura.pt
LIMAG.11-49-126-136-137-150.

EXTRAORDINÁRiO

 O INFANTE PORTUGAL
Primeira Jornada

 Capítulo Sete
CONTRAFEITOS À CONTRIÇÃO - 56

  Deodato acabou de aperaltar-se e, graças a um subtil processo de desmaterialização, atalhou caminho para o Terreiro do Paço, entre cujas colunas readquiriu a mais formal postura física e prosaica. E assim, em passo lesto, assumindo uma impermanência visível, chegou ao final do seu destino. Indiciando alegoricamente, pois que o trilho perambular dum mito que era ele em Fado tem mutações catárticas, altos e baixos, paranóia, porém nunca colapsa na inconsequência de veleidades terminais, nem sequer se interrompe em qualquer beco sem saída.

Como ali. A nata dos fantasmas públicos. Quais figuras mascaradas enxameavam de entrudo por todo o Salão Nobre - prosaicamente, reconhecendo-se e felicitando-se com uma frivolidade subjacente, que o cinismo engalanava à histeria bacoca, sob o privilégio da constância protocolar.

  Continua