José de Matos-Cruz


IMAGINÁRiO119
16 FEV 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

 PRONTUÁRiO

 ARÁBIAS

 

Há muitos, muitos séculos, o bom califa Haroun El Poussah reinava tranquilamente em Bagdade, a muito magnífica, passando as noites embalado pelas doces melopeias orientais do seu jovem cantor Johnny Ali Bey. Entretanto, o lamentável grão-vizir Iznogoud só pensava numa coisa, mesmo que para isso tivesse que recorrer ao Djin, um demónio com poderes mágicos: «Ser califa no lugar do califa!»... Está agora a fazer quarenta e cinco anos, foi precisamente em 1962, que o genial argumentista René Goscinny culminou o talento sarcástico, exuberante, ao criar esta saga político-cómica entre o bem e o mal, com tensões, conspirações, traições e redenções, de contornos intemporais e sem limites geográficos, estilizada pelo engenho gráfico de Jean Tabary. Revelada entre nós pela Bertrand, e com um regresso auspicioso com Iznogoud, o Ignóbil (1968) sob chancela das Edições Asa, Uma Cenoura Para Iznogoud é o quarto tomo a aliciar os nostálgicos e a recrutar novas legiões de admiradores! Para além da ironia exuberante, da insolência irracional, o prodigioso sortilégio de Iznogoud persiste numa latente actualidade, e na complexa personalidade caricatural de cada uma das irresistíveis personagens.

CALENDÁRiO

1926-28OUT2006 - Artur Varatojo: «Nunca me interessou ser investigador criminal. Cada vez que o delinquente caísse nas mãos da polícia, eu ia começar a ter pena dele...»

28OUT2006 - No 17º Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora, Salazar, Agora e Na Hora da Sua Morte (Parceria A.M. Pereira) é distinguido com os Prémios ao Melhor Álbum,  Melhor Argumento (João Paulo Cotrim) e Melhor Desenho (Miguel Rocha); o galardão ao Melhor Álbum Estrangeiro contempla a Cidade de Vidro (Edições Asa) de Paul Auster, com ilustração de Paul Karasik e David Mazzuchelli.

01NOV2006-14JAN2007 - No Museu da Electricidade, está patente a exposição Star Wars, a partir da saga clássica concebida, realizada e produzida por George Lucas para grande ecrã IMAGINÁRiO12.

MEMÓRiA

 819-897 - Al-Bouhtouri: «Em cada época, um homem único / oferece o seu exemplo à humanidade.»

1904-20FEV1987 - Edgar-Pierre Jacobs: Criador de Aventuras de Blake e Mortimer (1946). Segundo o editor Claude Lefrancq, a banda desenhada era um inferno para o artista, que chegava a trabalhar dezasseis horas por dia: em esboços, aperfeiçoando as proporções, usando sistematicamente o decalque, hábito que adquirira na publicidade. Por fim, raro saía do seu refúgio em Bois des Pauvres - a cidade, Bruxelas, esgotava-o IMAGINÁRiO10.

1928-22FEV1987 - Andy Warhol: «Um artista é alguém que cria coisas de que as pessoas não precisam, mas que - por alguma razão - ele pensa que é uma boa ideia proporcionar-lhes.»

1929-23FEV1987 - José Afonso: «O que mais me prende à vida / Não é amor de ninguém. / É que a morte de esquecida / Deixa o mal e leva o bem.»

 VISTORiA


Traz outro amigo também

Amigo
Maior que o pensamento
Por essa estrada amigo vem
Não percas tempo que o vento
É meu amigo também

Em terras
Em todas as fronteiras
Seja benvindo quem vier por bem
Se alguém houver que não queira
Trá-lo contigo também

Aqueles
Aqueles que ficaram
(Em toda a parte todo o mundo tem)
Em sonhos me visitaram
Traz outro amigo também
José Afonso

O Juramento do Árabe

Baçus, mulher de Ali, pastora de camelas,
Viu de noite, ao fulgor das rútilas estrelas,
Vail, chefe minaz de bárbara pujança,
Matar-lhe um animal. Baçus jurou vingança,
Corre, célere voa, entra na tenda e conta
A um hóspede de Ali a grave, a inulta afronta.

«Baçus, disse tranquilo o hóspede gentil,
Vingar-te-ei com meu braço, eu matarei Vail».

Disse e cumpriu.

Foi esta a causa verdadeira
Da guerra pertinaz, horrível, carniceira
Que as tribos dividiu.
Na luta fratricida,
Omar, filho de Anru, perdera o alento e a vida.

Anru, que lanças mil aos rudes prélios leva,
E que, em sangue inimigo, irado, os ódios ceva
Incansável procura - e é sempre em balde - o vil
Matador de seu filho, o tredo Mualhil.
Uma noite, na tenda, a um moço prisioneiro,
Recém-colhido em campo, o indómito guerreiro
Falou, severo, assim:
«Escravo, atende e escuta:
Aponta-me a região, o monte, o plaino, a gruta,
Em que vive o traidor Mualhil, diz a verdade;
Dá-me que o alcance vivo, e é a tua liberdade!»

E o moço perguntou:
«É por Alá que o juras?»
«Juro» - o chefe tornou.
«Sou o homem que procuras!
Mualhil é o meu nome, eu fui que espedacei
A lança de teu filho, e aos pés o subjuguei!»

E, intrépido, fitava o atónito inimigo.

Anru volveu: «És livre, Alá seja contigo!»
Gonçalves Crespo (1846-1883) IMAGINÁRiO74 

 Inferno, Paraíso

Eu aceitei um encontro,
e tu respondeste
com o abandono.
Eu concordei
em humilhar-me
e tu conservaste
o teu orgulho.

O teu amor que me cativa
infligiu-me o seu tormento,
e o que em ti seduz
confundiu-me.

Eu era sem amarras
e tu, escrava;
eu fiquei agrilhoado
e tu, estás em liberdade.

Tu que me tiranizas
sem cometer crime,
a ti só pertence
a fuga possível
longe da minha servidão.

Tu és o meu Paraíso,
tu és o meu Inferno,
e o que dá prazer
destrói e corrompe-me.
Al-Bouhtouri - Hamâsa

ANTIQUÁRiO

1757 - Em Londres, John Bird constrói um primeiro sextante, por incumbência do astrónomo real, James Bradley. O sextante é o instrumento básico para a navegação celeste, e recebeu esse nome, precisamente, porque o seu arco compreende um sexto de circunferência. O sextante utiliza-se para medir a elevação dos corpos celestes sobre o horizonte. Consultando uma tábua com os dados das observações realizadas em numerosos lugares, o navegante podia conhecer a sua latitude - uma das duas coordenadas necessárias, a par com a longitude, para determinar a posição.

17FEV1780 - No Porto, entra em funcionamento a Aula Pública de Debuxo e Desenho, mais tarde Escola Superior de Belas-Artes.

21FEV1953 - Dois cientistas, o britânico Francis Krick e o americano James D. Watson, descobrem a estrutura da molécula do ADN/DNA.

OBSERVATÓRiO

http://darwin-online.org.uk - Sob o lema The Complete Work of Charles Darwin [1809-1882], reúne e disponibiliza gratuitamente o espólio (virtualmente) integral do cientista britânico, distinguindo compilações, manuscritos e biografia. Coordenado por John Van Wyhe, este projecto da Universidade de Cambridge inclui documentos e diários até agora inéditos, além de imagens de arquivo e gravações de áudio, que descrevem as ideias e as vivências desenvolvidas ao longo de décadas, em prol da teoria da evolução através da selecção natural IMAGINÁRiO16.

EXTRAORDINÁRiO

 O INFANTE PORTUGAL
Folhetim aperiódico

 Capítulo Quatro
A MUSA DOS CABELOS DE LODO - 35

 Magno assentira, fez que sim com a cabeça, compreendia-o muito bem. Pasmaceira, canalhice. Frustração versus castração. Pois, já antes, não tinha ele privado até com variegada gente de costela portucalense, da espécie simbolista de artistas e escritores que, apressados pela vida, essencialmente funestos, enfim num pujante despojamento, preferiram refrear ou cercear, tão só obstinando-se em cegueira ou paralisia?!
Continua



IMAGINÁRiO118
08 FEV 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

CONTRASTES




Um popular atleta do futebol americano, com a carreira afectada por contusão, Brandon Lang passa a consultor desportivo na agência de apostas do influente Walter Abrahams, tornando-se próximo e, logo, parceiro favorito graças a uma estranha capacidade para prever resultados desportivos. Virtualmente, uma relação no gume do sucesso rápido ou das oportunidades perdidas - vertigem excitante mas fatídica, por seres sombrios, além da cintilação emblemática, por compromissos perigosos, entre o oportunismo e o predomínio... Eis Aposta de Risco - em DVD, sob chancela Lusomundo - que D.J. Caruso realiza como um testemunho cénico, como um envolvimento de tese sobre as máscaras do ser humano, ante a fabricação de imagem e os circuitos de manipulação ou vigarice. Amizade, confiança, dependência, excesso, erosão, pontuam uma intriga volúvel, tensa, qual narrativa flutuante pelos flagrantes da realidade e da aparência, e que se adensa com elã caprichoso segundo os modelos clássicos. Eivando um insinuante nexo de pulsões dramáticas, nos emblemáticos desempenhos contrastados em Al Pacino e Matthew McConaughey. Mestre, aprendiz. Recorrência ou subversão?

CALENDÁRiO

22OUT2006 - Al Pacino é distinguido com o Prémio Carreira pelo American Fim Institute/AFI, que lhe será entregue em Los Angeles, a 07JUL2007. Segundo Howard Stringer, Presidente do AFI, trata-se de «um ícone do cinema americano».

MEMÓRiA

14NOV1906-1985 - Louise Brooks: «A grande arte do cinema não consiste em descrever o movimento do rosto e do corpo, mas nos movimentos da mente e da alma transmitidos com um sentido de intenso isolamento.»

43aC-17dC - Publius Ovidius Nasus, aliás Ovídio: «As frivolidades cativam os espíritos levianos».

1542-08FEV1587 - Mary Stuart: Rainha da Escócia - e de França, durante dezoito meses, após o casamento com François II, coroado em 1559: «No meu fim está o meu princípio.»

11FEV1847-1931 - Thomas Alva Edison: «Eu não ouço o canto de um pássaro desde os meus treze anos».

VISTORiA


E porque não ficasse no Universo
Alguma região deshabitada,
Astros, e Deoses tem o ethéreo assento:
O Mar aos peixes nítidos he dado,
Aves ao Ar, quadrúpedes á Terra.

Em tanta multidão faltava hum Ente
De pura, sublime intelligência,
Que dominasse em tudo. Eis nasce o homem.
Ou tu, Supremo Artífice, e Princípio
De mais perfeito mundo, o procreaste,
Pura extracção de Divinal Semente;
Ou a Terra inda nova, inda de fresco
Separada dos Ceos, lhes tinha o gérme;
E tu, filho de Jápeto, amassando-a
Com aguas fluviaes, copiaste n’ella
Os Entes Immortaes, que regem tudo.
As Metamorphoses, de Publio Ovidio Nasão: Poema em Quinze Livros,
Vertido em Portuguez
(1841 - António Feliciano de Castilho - excerto)

PARLATÓRiO

O Homem e o Mundo - Nesta máquina do mundo, entrando também nela o céu, as estrelas têm o seu curso ordenado, que não pervertem jamais; o sol tem seus limites e trópicos, fora dos quais não passei; o mar, com ser um monstro indómito, em chegando as areias, pára; as aves, onde as põem, não se mudam; os peixes contentam-se com o mar; as aves com o ar; os outros animais com a terra. Pelo contrário, o homem, monstro ou quimera de todos os elementos, em nenhum lugar pára, com nenhuma fortuna se contenta, nenhuma ambição, nem apetite o farta; tudo perturba, tudo perverte, tudo excede, tudo confunde, e como é maior que o mundo não cabe nele.
Padre António Vieira

TRAJECTÓRiA

EDISON





Thomas Alva Edison nasceu em Milan, Ohio, a 11 de Fevereiro de 1847. Recebeu da mãe a educação primordial, revelando-se pouco apto para a matemática. Aos doze anos, vendia jornais. De formação autodidacta, estudou telegrafia e, com a venda de acessórios, começou a ganhar dinheiro. Em 1863, trabalhava como operador na Western Union Telegraph Company. Em 1868, formalizou a sua primeira patente - um registador automático de votos. Seguiu-se um aparelho aferidor de oscilações da bolsa, que lhe valeu quarenta mil dólares. Colaborou na elaboração da máquina de escrever e do telefone, para o qual contribuiu com o microfone de carbono. Em 1876, estabeleceu-se por conta própria, instalando um laboratório de investigação em Menlo Park, Nova Jersey. No ano seguinte, anunciou o fonógrafo, capaz de recolher e reproduzir a voz humana. Em 1879, apareceu a lâmpada incandescente, o mais decisivo dos seus inventos, apresentado na Feira Internacional de Paris. Em 1882, desenvolvia em Nova Iorque a primeira central eléctrica do Mundo. Passados seis anos, criou o kinetoscopio, capaz de gerar imagens animadas a partir de fotogramas singulares. Durante a I Guerra Mundial, assessorou o Governo americano em questões navais e produtos químicos, como o fenol. Foi nomeado assessor da Presidência dos Estados Unidos. Faleceu em West Orange, Nova Jersey, a 18 de Outubro de 1931. Concebeu ou explorou mais de mil e duzentas patentes. Em 1955, a sua casa de Menlo Park foi convertida em Museu.

BREVIÁRiO

2006 - Cotovia edita Arte de Amar de Ovídio; tradução de Carlos Ascenso André.

Quasi edita Várias Vozes e Os Anões e Outras Peças, ambos de Harold Pinter; tradução de Francisco Frazão e Joana Frazão, João Paulo Esteves da Silva, Jorge Silva Melo, Miguel Castro Caldas e Pedro Marque IMAGINÁRiO63.

Assírio & Alvim edita O Nariz de Nikolai Gogol (1809-1852); tradução de Nina Guerra e Filipe Guerra.

Prisvídeo lança em DVD, One Plus One + Sympathy For the Devil de Jean-Luc Godard, sob chancela Carlotta Films; ano de 1968, Londres, com os Rolling Stones em estúdio, a gravar Beggar’s Banquet.

Cavalo de Ferro edita Wolfgang Amadeus Mozart - Uma Vida Secreta - Selecção Epistolar; organização de Manuel Malzbender e Maria João Mayer Branco IMAGINÁRiO68.

Temas e Debates edita, com National Geographic/Círculo de Leitores, O Evangelho de Judas de Rodolphe Kasser, Marvin Mayer, Georg Wurst e Bert D. Ahrman; tradução de Artur Lopes Cardoso IMAGINÁRiO90.

Edições Afrontamento lança Peanuts - Obra Completa de Charles M. Schulz (1922-2000) IMAGINÁRiO29.

NOTICIÁRiO

Decisão - Foi concedido o privilégio por quinze anos, a Marcel Deprez e Cornelius Herr, para aperfeiçoamentos nos meios de suprimir as induções das linhas telegráficas e telefónicas.
07ABR1885 - Diário de Notícias

Licença - A Edison Gower Bell Telephone Company of Europe Limited obteve ontem licença para colocar nas estradas reais do distrito de Lisboa, postes, para o estabelecimento das redes telegrafónicas que nos termos do artigo 8 do Contrato de 13 de Janeiro de 1882, têm sido aprovados pelo Governo.
17JUL1885 - Diário de Notícias

O Fonograma de Edison - O célebre inventor deu o nome de fonograma ao seu fonógrafo aperfeiçoado. Prossegue nos seus trabalhos, a fim de obter a maior amplitude nos sons transmitidos. Já se têm realizado experiências em que seiscentas pessoas, ao mesmo tempo, têm ouvido os sons do fonógrafo.
07DEZ1888 - Diário de Notícias

Nova Invenção de Edison - A Imagem à Distância - O electricista Edison anuncia que em breve dará a conhecer um aparelho propriamente destinado a reproduzir com facilidade à distância de 1.000 milhas qualquer desenho, e isto com rapidez igual a um telegrama.
Edison é o primeiro a dizer que o invento se baseia em trabalhos já realizados. Tenciona, além d’isso, popularizar o aparelho, vendendo-o a todas as pessoas que o requisitarem, e não só a uma companhia que o monopolize.
O processo é simples: o artista faz o desenho e enrola-o a um pequeno cilindro que se encontra em cima do aparelho. Comprime-se um botão, gira o cilindro rapidamente, e a impressão é recolhida pelo cilindro de outro aparelho semelhante na estação de recepção, logo que se estabelece a corrente.
Um pequeno punção engenhosamente disposto percorre todas as linhas do desenho e estas repetem-se fielmente. Os aparelhos, além de serem pequenos, podem adaptar-se sem dificuldade a qualquer mesa de aparelhos telegráficos e telefónicos.
07JAN1897 - Diário de Notícias

ANTIQUÁRiO

1878 - Thomas Alva Edison inicia experiências que conduzirão ao aparecimento da lâmpada eléctrica, e à demonstração de um sistema de iluminação pública, a 31DEZ1879.

13FEV1937 - O King Features Syndicate principia a distribuição na Imprensa de Príncipe Valente - No Tempo do Rei Artur, em pranchas dominicais concebidas e ilustradas por Harold R. FosterL IMAGINÁRiO41.

PRIORITÁRiO




10NOV2006-14JAN2007 - No Centro Cultural de Cascais está patente, em protocolo da Fundação D. Luís I com Bancaja, El Contemplador Activo de Pablo Picasso (1881-1973). A 16 de Novembro de 1965, o artista andaluz submeteu-se, no Hospital americano de Neully, a uma intervenção cirúrgica à próstata e à vesícula, acontecimento que viria a marcar a sua obra posterior, ao entregar-se compulsivamente à criação através da gravura e do desenho - que, para ele, não eram meros meios de reprodução de imagens, mas evocação e exorcismo dos seus próprios fantasmas. Para um guerreiro cuja principal credencial era a virilidade, o fim da sua vida sexual terá representado uma adversidade terrível. Esta exposição - que congrega sessenta trabalhos, impregnados de melancolia e executados entre 1966 e 1967 - está mais carregada de humor que de amargura, produto da criatividade de quem se sentia contemplador activo e não voyeur passivo.




IMAGINÁRiO117
01 FEV 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

 HERANÇA

 

Revelado em Portugal com Crónicas Incongruentes (1986), Miguelanxo Prado atraiu os leitores, logo sensibilizados por uma visão crítica, irónica ou onírica. A sofisticada narrativa, o grafismo estilizado deste artista galego (nascido na Corunha, em 1958), adquiriram outras virtualidades com O Manancial da Noite (1991), de colaboração com Fernando Luna; reafirmando-se pessoalmente em O Traço de Giz (1993), surpreendente obra-prima insular; Tangências (1995), através do elã homem/mulher; Pedro e o Lobo (1995), sobre um conto de Serguei Prokofiev; até Carta de Lisboa (1995), em transfiguração estética da nossa capital. Tendo voltado ao princípio, com os três tomos de Quotidiano Delirante (após 1987) reunidos em A Vida É Um Delírio, Prado - colaborador de Neil Gaiman com The Heart of a Star em Endless Nights (2003), expansão da saga de Sandeman - regressa, sob chancela das Edições Asa, com A Mansão dos Pimpão (2005), que recebeu os Prémios ao Melhor Argumento e ao Melhor Álbum Estrangeiro no Salão do Comic de Barcelona. Em causa, uma convencional família urbana da classe média, que recebe como herança uma casa rústica, em ruínas, envolvendo-se numa teia armadilhada de burocracias camarárias e especulações económicas... Insólito, mas aliciante argumentista; caricatural, mas expressivo ilustrador, Miguelanxo Prado explora lances de aparente rotina sobre o indivíduo e a colectividade, transfigurando um imaginário contingente, em flagrantes de sarcástica actualidade.

CALENDÁRiO

30OUT2006-01JUN2007 - Na Amadora, o Centro Nacional de Banda Desenhada/CNBDI expõe O Mosquito, Uma Máquina de Histórias; fundado por Raul Correia e António Cardoso Lopes em 1936, o semanário infantil O Mosquito teve, entre outros colaboradores, Eduardo Teixeira Coelho, Jayme Cortez, Vítor Péon, José Garcês e José Ruy.

16NOV2006 - Clap Filmes estreia Viúva Rica Solteira Não Fica de José Fonseca e Costa; com Bianca Byington e Rogério Samora.

MEMÓRiA

460 aC-377 aC - Hipócrates: «O ócio e a falta de ocupação aproximam-nos do demónio.»

01FEV1937-1995 - Fernando Assis Pacheco: «como discursa uma alma enlevada / se a retórica foi bem explicada / por culto e sólido professor».

1861-05FEV1937 - Lou Andreas-Salomé: «Durante os últimos vinte e cinco anos da sua vida esta nobre mulher esteve ligada à psicanálise, que exerceu e para a qual contribuiu com valiosos escritos» (Sigmund Freud - 1937).

VISTORiA

Resto

Hei-de esquecer-me dos móveis.
Nem louças nem lençóis. Frutos
na nespereira nozes na nogueira.

A chave vai ficar com um vizinho.
Por enquanto. Dos retratos
só o dela na água do tanque.
Francisco José Craveiro de Carvalho - H/C (2006)

 
Giga das Fogueiras

Embora me escutasses nada saberás de mim
e fosses à janela
e embora olhasses não me vês que passo
e digas um adeus pequeno
e embora às vezes já sentisses náusea
e afinal te inclinas
e embora seca embora secamente
e finjo que não ligo
e embora as baças ténues luzes das
e eu por timidez sempre apagado
e embora as marés-vivas batendo
e amámos nisso o Verão
e embora lerda a caneta se apure
e tu não entendesses nada
não entendesses nada
Fernando Assis Pacheco - A Bela do Bairro e Outros Poemas (1986)

REPOSITÓRiO




Entre as séries americanas que, através do pequeno ecrã, expandiram a saga do Oeste, popularizando um horizonte mítico de aventura ou heroismo, e estabelecendo uma relação familiar com o telespectador, destaca-se Wagon Train (1957) - também conhecida como Major Adams ou Trailmaster. Inicialmente produzida pela NBA, em 1957-61, com 120 episódios (de 50 minutos cada um, a preto-e-branco), foi depois transferida para a ABC, e teve uma segunda fase em 1963, com 32 episódios (de 74 minutos cada um, a cores). Em recriação, estão histórias e vivências da colonização, para uma caravana que, por 1840, se dirige à conquista do Oeste. Wagon Train era dedicado ao público de todas as idades e, pelas tramas em conflito, pelo carácter das personagens ou pelos temas em foco, usufruía de um amplo agrado masculino e feminino. No elenco fixo, destacam-se o guia - Robert Horton e, mais tarde, Robert Fuller; e o líder, Ward Bond - a quem sucedeu, após a sua morte, John McIntire; além de Terry Wilson ou Frank McGrath. Muitas das cenas ao ar livre eram rodadas em estúdio; por outro lado, os mesmos planos repetidos - sobretudo, ligados a quatro carruagens a desfilarem numa paisagem imponente - tornaram-se convencionais para os fanáticos, e suscitaram algum anedotário complacente! O elemento mais sugestivo resultaria, entretanto, na apresentação de uma personagem diferente em cada um dos episódios - com o atractivo suplementar de, a interpretá-la, estar uma vedeta convidada. Nessa vastíssima galeria destacam-se Ernest Borgnine, Sterling Hayden, Shelley Winters, Lee Van Cleef, John Carradine, Virginia Grey, James Coburn, Virginia Mayo, Henry Silva, Bette Davis, Dean Stockwell, Ronald Reagan, Barbara Stanwyck, Martin Balsam, Burgess Meredith... Os argumentistas eram, também, muito variáveis, tendo provocado celeuma a inspiração em romanescos populares - como Grandes Esperanças de Charles Dickens, ou Orgulho e Preconceito de Jane Austen - tanto em figuras como em situações. Alguns realizadores prestigiados contribuíram com o seu talento ou a sua especialização - como John Ford, Robert Florey, John Brahm, David Butler, Aaron Spelling, Christian Nyby, Arthur Hiller, Jack Arnold, Joseph Pevney ou Tay Garnett. As expectativas que rodearam a introdução da cor não foram, afinal, compensadas em termos realistas, pois contribuíram para artificializar o carácter cénico de ambientes e envolvimentos.

PARLATÓRiO

 

 

¨Ouse, ouse... ouse tudo!! Não tenha necessidade de nada! Não tente adequar a sua vida a modelos, nem queira você mesmo ser um modelo para ninguém.

Acredite: a vida dar-lhe-á poucos presentes.

Se você quer uma vida, aprenda... a roubá-la! Ouse, ouse tudo! Seja na vida o que você é, aconteça o que acontecer. Não defenda nenhum princípio, mas algo de bem mais maravilhoso: algo que está em nós e que queima como o fogo da vida!!
Lou Andreas-Salomé

 

Ao longo dos anos, tenho explorado em quadradinhos duas vias essenciais: o testemunho do real, embora distorcido ou paradoxal; a narração mítica, relacionada com um imaginário de culto. Teria dificuldade em distinguir qual se adapta melhor à minha criatividade, pois correspondem a tipos fundamentais de abordagem. Por um lado, reconheço uma presença muito importante da realidade imediata, do quotidiano, feita de um vínculo com o meu tempo, com aquilo que me rodeia. Qualquer pessoa que dispõe um acesso à comunicação, que é capaz de exprimir-se, de reflectir, tem essa obrigação para com a sociedade que lho outorgou. Trata-se de um privilégio restrito, que nem a todos favorece. Depois, existe o tal compromisso estético, mais pessoal, com um elã mítico, um envolvimento romanesco ou efabulativo que vai conformando, ou configurando, a cultura de uma civilização. Enquanto autor, evidentemente, prefiro esta última incidência, que tem a ver com uma referência mágica de afectividade e de sensibilidade. Porém, como homem com uma ética, uma ideologia, não posso abdicar da primeira vertente. Entre ambas, melhor, entre uma consciência crítica e uma perspectiva irónica, tento estabelecer o meu próprio testemunho artístico...
Miguelanxo Prado

BREVIÁRiO

Sete Caminhos edita Maria Dulce - A Verdade a Que Tem Direito de Maria Dulce e Luciano Reis.

Relógio D’Água edita Cânticos do Realismo e Outros Poemas / 32 Cartas de Cesário Verde; organização de Teresa Sobral CunhaLIMAGINÁRiO25.

Editorial Caminho lança Dicionário de Escultura Portuguesa de José Fernandes Pereira.

EXTRAORDINÁRiO

 O INFANTE PORTUGAL
Folhetim aperiódico

Capítulo Quatro
A MUSA DOS CABELOS DE LODO - 34

 Mas, nunca condescenderei que um patego néscio me azucrine a mioleira! – desabafou-lhe alto, intempestivo, o Condestável, deixando inquieto Magno de que o visasse directamente a ele, ou de que houvesse sabido que uma parte bastarda da ascendência sua, pelos genes paternos, era oriunda de Vinhais, na Beira Baixa.

Todavia, o Condestável Luzitano - proveniente dum desígnio ancestral, em ímpeto varonil durante a Exposição de Portugal no Mundo e emérito com promoção por mérito, bem diferente de todos aqueles justiceiros instantâneos, gerados por proveta, americanos amaricados - pugnava contra a própria ridicularia em que se ia conformando ao Pereira Dias. Abdicando lentamente, sem ruínas irreversíveis, confinado a uma rotina de mais remansos e pesares, de menos louros e lauréis...

 Continua



 

IMAGINÁRiO116
24 JAN 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

 ELEMENTAR

 

Sagrando a imortalidade dos mitos através da saga aventuresca, da iconografia de culto ao imaginário popular, o elã de Sherlock Holmes ressuscita periodicamente entre enigmas e perigos, ampliados sob a lupa inexorável ou entre as espirais de fumo do cachimbo que, emblematicamente, estilizaram o detective mais brilhante e mais famoso de todos os tempos. Além da concepção literária por Sir Arthur Conan Doyle (1859-1930), ou duma recriação da sociedade victoriana por finais do Século XIX, o cinema e a televisão revitalizaram um fascínio emulativo em que no eterno confronto entre as luzes e as trevas, o bem e o mal, pelo desígnio humano se perfila a complexa personalidade do prodigioso combatente criminal, do indivíduo solitário e exacerbado. Uma dessas versões clássicas e imperdíveis ressalta com Sherlock Holmes em O Mistério do Vale Boscombe e Um Estudo em Vermelho - sob chancela Prisvídeo - sendo protagonista Peter Cushing, e Nigel Stock de regresso como Doutor John Watson. Trata-se de dois episódios da lendária série produzida, a cores, pela BBC em 1968, e que definitivamente arrebatou os extraordinários residentes no número 221B de Baker Street, em Londres, subjugando a convencional tradição romanesca por uma empolgante realidade virtual IMAGINÁRiO17.

CALENDÁRiO

06OUT2006 - Reunida desde o dia 02OUT, a Comissão Teológica Internacional conclui que, e divergindo da opinião de Santo Agostinho no Século V, as crianças que morrem sem baptismo «ficam nas mãos de Deus misericordioso». Em virtude do pecado original, tais crianças estariam, segundo a teoria tradicional, privadas do pleno desfrute dos eleitos pela visão de Deus, face a face, gozando porém de uma felicidade natural. Agora, a Igreja Católica extingue o conceito de Limbo - um lugar de fronteira onde as crianças, segundo o Catecismo de São Pio X, «não usufruem da presença de Deus, mas também não sofrem». Pretendia-se assim salvaguardar a necessidade do baptismo para a salvação eterna, embora a Igreja nunca chegasse a considerar que se tratava de uma verdade da fé. Em 1984, Joseph Ratzinger - enquanto Presidente da Congregação Para a Doutrina da Fé - exprimiu que o Limbo era, apenas, uma hipótese teológica. A cerimónia litúrgica de entrega, ao actual Papa Bento XVI, da conclusão em causa tornou-a reconhecida como posição oficial, sem necessidade de qualquer acto formal pelo Sumo Pontífice. No entanto, sobressai ainda como doutrina inalterável que o baptismo é essencial para se alcançar o Céu.

MEMÓRiA

1899-25JAN1947 - Al Capone: «Era uma espécie de homem de palavras, um homem que gostava de falar à Imprensa, que o achava muito colorido» (Robert De Niro).

28JAN1917-1998 - Américo Leite Rosa - Realizador de cinema, comentador radiofónico: «O segredo dele era outro, abertura de alma, sensibilidade e poesia que punha em cada curta narrativa perfumada com as coisas simples da vida de gente simples como éramos quase todos.» (António Cagica Rapaz)

31JAN1797-1828 - Franz Schubert: «Durante anos, senti-me dividido entre a maior das dores e o maior dos amores. Durante anos cantei lieder. Se queria cantar o amor, para mim ele transformava-se em dor; se queria novamente só cantar a dor, para mim ela transformava-se em amor.»

ANTIQUÁRiO

23OUT1906 - No Campo de Bagatelle, em Paris, o brasileiro Alberto Santos Dumont (1873-1932) voa uma distância aproximada de sessenta metros, a uma altura de dois a três metros com seu aparelho 14-Bis, perante Ernest Archdeacon e uma comissão do Aeroclube de França, convertendo-se em pioneiro da aviação mundial.

1917 - Duas adolescentes do Yorkshire declaram ter brincado no jardim com fadas, possuindo fotografias comprovativas. Analisados os negativos pela Kodak, não foram descobertos vestígios de falsificação. Ligado ao caso, Sir Arthur Conan Doyle publicou, em 1922, um relato em que atestava tais evidências. Até que, já adultas, as implicadas confessaram tudo não ter passado de uma brincadeira. A reputação de Conan Doyle - reflectindo o seu prestígio e autoridade, perante a opinião pública internacional - ficaria abalada com o desaire, sem que tal lhe afectasse a mais profundas convicções.

1937 - Branca de Neve e os Sete Anões - Um clássico da animação, primeira em longa metragem dos Estúdios de Walt Disney. Adriana Caselotti cedeu voz à casta heroina.

RELATÓRiO

Câmara dos Pares - Moção: A Câmara considera que o Discurso da Coroa deve ser a expressão genuína da verdade, e que nenhum Governo tem o direito de iludir o augusto Chefe do Estado. Aditamento: Igualmente folgará a Câmara em que, vistas as circunstâncias, o Governo de Sua Majestade administre a fazenda pública com a mais severa economia.
23JAN1897 - Diário Parlamentar

TRAJECTÓRiA

AL CAPONE

 

Nascido em Brooklyn (Nova Iorque, 1899), Al Capone converter-se-ia - aos vinte e seis anos - no mais poderoso e implacável líder do crime organizado. Em Chicago, onde só o tráfico de álcool teria rendido - por 1925 - cerca de dois biliões de dólares. A partir do Massacre do Dia de São Valentim - 14 de Fevereiro de 1929, em que destruiu as organizações rivais, desde logo o gang de Bugs Moran - Big Al comandaria mais de mil sequazes e, para além de especular as contradições da Lei Seca, exploraria múltiplos negócios sobre a droga, as apostas, o jogo e a prostituição. Figura controversa, odiado ou sedutor, Capone nada teria de sua propriedade, e apenas foi possível condená-lo por evasão fiscal. Para a impugnação de Capone, por 1931, terão contribuído os Intocáveis - um grupo de paladinos chefiado por Eliot Ness, agente do Departamento do Tesouro, então com vinte e nove anos. Capone cumpriu onze anos de prisão, em parte na Penitenciária de Atlanta e, após 1934, em Alcatraz de onde sairia, com a saúde destruída e mentalmente abalado, em 1939, fixando-se em Miami, onde faleceu em 1947.

REPOSITÓRiO

BRANCA DE NEVE
E OS SETE ANÕES

 

Adaptação do fabuloso imaginário de Jacob Ludwig & Wilhelm Carl Grimm, Branca de Neve e os Sete Anões revelou a primeira longa metragem de animação, pelos Estúdios Walt Disney, sob a direcção de David Hand. Iniciada em 1934, envolvendo 750 técnicos, para 250 mil fotogramas, o orçamento final de um milhão e quinhentos mil dólares foi inflaccionado dez vezes, quanto à previsão original. Mas, o que Hollywood pressagiava como um fracasso, ao transgredir os modelos popularizados em curta duração, tornar-se-ia um êxito de bilheteira e fenómeno primordial de culto, obra-prima consagrada através de gerações.

Tudo, graças às raras reposições de Branca de Neve, desde a estreia em Dezembro de 1937 - a nona das quais, ao comemorar-se o respectivo cinquentenário. Aliás, a Academia logo se rendeu, tendo atribuído um Oscar especial - materializado numa estatueta normal, e sete miniaturas! Entretanto, os valores de tal exploração estratégica ascenderiam, virtualmente, a um bilião de dólares - o que permanece um recorde excepcional, neste género que a insígnia Disney celebrou, enquanto arte e indústria.

«Era uma vez uma Rainha que vivia em país muito distante. A sua única tristeza, não ter a dita de ser mãe. Mas, num dia de Inverno, em que os flocos de neve caíam como penas sobre a Terra, e enquanto bordava à beira de uma janela recortada em negro ébano, ao contemplar a brancura da paisagem, a Rainha espetou a agulha num dedo, e três gotas de sangue caíram lá fora, sobre a neve...» Assim começa Schneeweisschen - o conto dos irmãos Grimm que narra a história de uma Princesa terna e inocente, de uma Fada boa e de uma terrível Madrasta, de um Príncipe encantado e de sete fantásticos gnomos.

Como se sabe, é na clara definição do carácter e da figura de cada um desses Anões que a equipa Disney logrou um dos principais aliciantes em Branca de Neve, a qual terá exigido umas 400 mil ilustrações. Para explorar um envolvimento realista, os Estúdios dispunham já, em 1935, da truca multiplana - sistema que facilitava a decomposição dos desenhos em espectros independentes, atribuindo-lhe uma maior profundidade de campo. Dois anos depois, o ambicioso projecto - nunca tentado, sequer, ao nível dos cartoons - chegava ao feliz termo, inaugurando a colaboração da Disney com a distribuidora RKO.

O resto pertence, também, à história dos maiores sucessos nos anais do cinema. Exibida com pompa e circunstância, no Carthay Circle Theatre em Los Angeles, perante as principais vedetas da época, Branca de Neve e os Sete Anões superou todos os êxitos anteriores, apenas sendo destronada por E Tudo o Vento Levou... (1939 - Victor Fleming). Prodígio de som, cor e música, a aventura de Princesa de coração puro e alvo, vítima de uma maçã envenenada, continuou a reinar no íntimo de milhões de espectadores.

NOTICIÁRiO

A Morte Real e a Morte Aparente - Um telegrama de Viena diz que o Professor Friedrich de Elbing, acaba de descobrir uma nova categoria de Raios X, graças aos quais é possível agora resolver o problema tão difícil da morte aparente e da morte real. As novas radiações de que se trata propagam-se instantaneamente através do corpo humano e dão, por meio da fotografia, imagens absolutamente diferentes nos dois casos, segundo atravessem um cadáver ou o corpo de uma pessoa que tenha a menor parcela de vida. A Academia das Ciências de Viena, a quem o sábio professor comunicou os seus trabalhos, enviou-lhe logo as suas felicitações. Constituiu-se uma comissão para o estudo d’essas novas radiações, que Friedrich baptizou com o nome de kritikstrahlen.
25JAN1897 - Diário de Notícias

OBSERVATÓRiO

Moo Magazine - Cinema, ilustração, literatura, música, teatro e outras artes estão patentes todas as semanas, aos Domingos, neste magazine de cultura urbana minimalista, tentando «apontar às pessoas que ostracizarem-se em casa não faz parte da comum vivência humana. Nascemos para crescer dia a dia…» - em http://magazine.moo.com

BREVIÁRiO

Relógio D’Água edita Onze Aventuras de Sherlock Holmes de Arthur Conan Doyle.

Imprensa Nacional edita Poesia e Alguma Prosa de Mário Saa (1893-1971); organização de João Rui de Sousa.

Ambronay Éditons lança em CD, Miserere, Lamentations, Stabat Mater de João Rodrigues Esteves (1700-1751) pelo Ensemble Européen William Byrd, sob direcção de Graham O’Teilly.

Talento edita História da Volta de Guita Júnior, Alves Barbosa e Marçal Grilo; a Volta a Portugal em Bicicleta, de 1927 até à actualidade.

Warner lança em CD, sob chancela Rhino, Children of the World (1976) pelos Bee Gees.



IMAGINÁRiO115
16 JAN 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

 FUTUROS

 

No ano de 2415, o mundo persiste como civilização crepuscular, sob ameaça dum vírus prestes a dizimar a humanidade, apenas refeita em escassa e controlada sociedade utópica, após o antídoto descoberto por Trevor Goodchild. Desfrutando de um paraíso artificial, materialista e involuntário, na aparência sem mácula, os sobreviventes habitam a Cidadela, sob um regime ditatorial, tendo contraponto num grupo de rebeldes indomáveis, a tudo dispostos no combate em prol das liberdades. Até que a respectiva agente de elite vai, enfim, assumir a missão mais radical - eliminar o cientista responsável pela intolerável situação - em cuja cominação se desvendam perigosos segredos, sobre clonagem e reprodução natural... Sensual, implacável, eis Aeon Flux - com edição em DVD, sob chancela Lusomundo - que Karyn Kusama exacerba numa aventura estigmatizada, aparatosa, sendo protagonista Charlize Theron, a partir da série concebida por Peter Chung em 1991, e celebrada em animação para MTV. Sobrepondo os dilemas do bem e do mal, ao transfigurar a feérie cénica do próprio futuro em causa, subjugado e resistente, entre emoções e tentações IMAGINÁRiO35.

CALENDÁRiO

1936-10OUT2006 - Danièlle Huillet: Companheira e cineasta com Jean-Marie Straub - para esta categoria específica de autores visionários, susceptíveis do excesso e da ascese, a árdua criatividade funciona como um compromisso aparentemente misógino ou uma interacção recorrente e íntima.

12OUT2006 - A Academia Sueca anuncia a atribuição do Prémio Nobel da Literatura de 2006 ao turco Orhan Pamuk - que, «na busca da alma melancólica da sua cidade natal [Istambul], descobriu novas imagens para o choque e cruzamento de culturas».

12OUT2006 - Gillo Pontecorvo: «Não sou um revolucionário a qualquer preço. Sou simplesmente um homem de esquerda, como muitos judeus italianos.»

12OUT2006 - Atalanta Filmes estreia Rapace de João Nicolau; com Hugo Leitão e Lia Ferreira.

MEMÓRiA

25MAR1867-16JAN957 - Arturo Toscanini: Com dezoito anos, prestou uma audição em La Scala de Milão, perante um comité de selecção pouco interessado. Acusado de falta de respeito, perdeu o emprego, mas conquistou a admiração do empresário Claudio Rossi, com quem faria uma digressão pela América Latina. Desembarcando no Rio de Janeiro, Toscanini enfrentou uma árdua missão: garantir ensaios com a diva Nadina Bulichoff, amante de D. Pedro II, Imperador do Brasil.

1819-22JAN1887 - A.M. Fontes Pereira de Melo: «Variamos infinitamente esta calamidade pública, este vampiro do país e esgotámos o repertório sem melhor resultado e deixando as cousas no mesmo pé em que viemos encontrá-las: ele mandando sempre e V.V.Sª obedecendo sem réplica.» (Raphael Bordallo Pinheiro - António Maria) IMAGINÁRiO22.

ANUÁRiO

1957 - Principia a saga televisiva de Maverick - em 138 episódios, sob chancela ABC/Warner, até 1961 - protagonizado por James Garner, com um regresso esporádico em 1981. Em causa western, um jogador elegante, sofisticado, que escapa aos piores sarilhos de sorriso nos lábios, ou coadjuvado por um irmão e um primo; aliás, Jack Kelly e Roger Moore.

2001 - Pedro Costa realiza Oú Gît Votre Sourire Enfui? - Danielle Huillet, Jean-Marie Straub, Cinéastes.

PRIORITÁRiO

Instituto Superior Técnico/IST Press edita Tratado de Arquitectura (35-20 aC) de Vitrúvio; tradução do latim por Manuel Justino Maciel. Em 1541, por encargo de El Rei D. João III, Pedro Nunes terá feito uma primeira versão, de paradeiro desconhecido - porventura levada para Madrid, durante a dinastia filipina; em 1998, Helena Rua publicou uma tradução, a partir do texto francês de Perrault (Século VII).

Editorial Minerva lança O Verdadeiro Almanaque Borda d’Água - Reportório Útil a Toda a Gente - Para 2007 (Comum); contém todos os dados astronómicos, cívicos e religiosos e muitas indicações de interesse geral. No Juízo do Ano, Pedro Teixeira da Mota prevê que, «em 2007, acentuar-se-á o valor das pessoas e organizações envolvidas na não-violência, nos direitos humanos, no crescimento sustentável, no comércio justo, na agricultura biológica, na ecologia e energias alternativas, na educação artística, humanística e espiritual e na solidariedade contra o sofrimento, a dor e a exclusão».

Assírio & Alvim e Círculo de Leitores editam Bíblia Ilustrada - Génesis - Levítico; a primeira tradução integral em português das Sagradas Escrituras por João Ferreira Annes d’Almeida (1628-1691); o teólogo José Tolentino Mendonça procedeu à fixação do texto, Ilda David’ conferiu interpretação iconográfica à Bíblia de Almeida.

TRAJECTÓRiA

GIUSEPPE ARCIMBOLDO

 

Nasceu em Milão, em 1527. Iniciou carreira como pintor, trabalhando com o pai na concepção dos cartões para os vitrais da Catedral da cidade natal. Em 1562, transferiu-se para Praga, onde fez parte da corte de Fernando I. Durante a estadia no Império Austríaco, ao longo de vinte e seis anos, serviu três soberanos - um dos quais Rodolfo II, grande coleccionador e mecenas, tendo atraído à sua corte alquimistas, engenheiros, matemáticos, artistas, ou astrónomos como Tycho Brahe e Johannes Kepler. Rodolfo II fundou, ainda, o Gabinete de Maravilhas, onde reuniu o que de mais estranho e curioso podia haver na Natureza. Assim, Arcimboldo encontrou a motivação cultural necessária para desenvolver uma obra em que as coisas, o bizarro e o inesperado estavam sempre presentes. Recriava os seus modelos humanos, entre os quais se contou o próprio monarca, em estilo de caricatura, formados por hortaliças, talos de videira, frutas, flores, animais e toda a espécie de objectos. Arcimboldo distinguiu-se como um dos expoentes máximos do maneirismo, sendo muito imitado como autor dos retratos compostos, entre os quais se destacam as séries Quatro Estações e Quatro Elementos, e o Vertumnus. Em 1568, regressou a Milão, e aí faleceu em 1593.

VISTORiA

A CIDADE DE MELINDE

 

A cidade de Melinde jaz de longe na praia em um campo raso cercado de palmares e areais; tem muitos pomares e hortas com noras, de boa hortaliça e fruta de espinho e outras prumagens. Tem o surgidouro longe da povoação, por estar em costa brava. A terra é fértil de mantimentos e criações de gado, galinhas e caça, tudo muito barato. É bem arruada; as casas são de pedra e cal e cantaria, com eirados muito formosos da banda de fora e de muito ricos lavores e pinturas por dentro. Os naturais da terra são gentios, baços, de cabelo revolto, bem-dispostos. Os estrangeiros são moiros arábios: andam nus da cinta para riba, e para baixo cingidos com panos de seda e algodão. Os nobres os usam sobraçados; nas cabeças trazem fotas com com cadilhos de seda e oiro. Suas armas são terçados, lanças, adagas, arcos e frechas. Tratam-se muito bem. Têm grande opinião de cavaleiros; contudo, naquelas partes, quando se quer dar louvor ao melhor de cada cidade, dizem «cavaleiros de Mombaça e damas de Melinde», por serem formosas, cortesãs e bem ataviadas.
Damião de Goes (1502-1574) - Crónica de D. Manuel (1567 - excerto) IMAGINÁRiO99.

BREVIÁRiO

Civilização edita O Orientalista de Tom Reiss, sobre Lev Nussimbaum (1905-1942); tradução de Michelle Hapetian.

SONY-BMG lança em CD, Modern Times de Bob Dylan; edição especial limitada com DVD LIMAGINÁRiO13.

Ésquilo edita A Felicidade e a Tranquilidade da Alma de Lucius Annaeus Séneca (4 aC-65 dC); tradução de Ricardo Ventura.

Dargil edita em CD, Música Portuguesa Para Quarteto de Cordas pelo Quarteto Lacerda; inclui obras de Vianna da Motta, Francisco Lacerda e Luís de Freitas Branco LIMAGINÁRiO48-78.

A Esfera dos Livros edita 20 Grandes Conspirações da História de Santiago Camacho.

Cotovia edita Peças Escolhidas de Henrik Ibsen (1828-1906); tradução de Fátima Saadi, Karl Erik Schollhamer e Pedro Fernandes LIMAGINÁRiO83.

ANTIQUÁRiO

 TOBIS PORTUGUESA - 75 ANOS

Em 1932, um movimento regenerador do cinema nacional - do qual faziam parte Leitão de Barros, Cottinelli Telmo, António Lopes Ribeiro e Jorge Brum do Canto - uniu esforços para a constituição de uma indústria artística e sonora. Assim surgiria, em Lisboa, a Companhia Portuguesa de Filmes/Tobis Portuguesa. A partir dum núcleo fundador - cujo Conselho incluía António Ferro, Ferreira de Castro e J. Castello Lopes - a Tobis Portuguesa (com um capital de 2.000 contos) surgiu de uma subscrição de acções «entre cidadãos humildes e anónimos», visando a construção dum Estúdio (delineado por Cottinelli) na Quinta das Conchas. Com uma área de 19.000 m2, aí decorreu a rodagem de interiores (em velhas instalações da Caldevilla Film e da Patria Film) e de vários exteriores da produção inaugural, A Canção de Lisboa (1933 - Cottinelli Telmo) - orçada em 870 contos - com equipamento fonotécnico móvel, pelo sistema alemão Tobis-Klang Film.
A generalidade do nosso cinema passou pela Tobis Portuguesa - que no pós-guerra, e para evitar conotações germânicas, se designou, temporariamente, apenas Companhia Portuguesa de Filmes.

EXTRAORDINÁRiO

O INFANTE PORTUGAL
Folhetim aperiódico

 Capítulo Quatro
A MUSA DOS CABELOS DE LODO - 33

 Para o indómito guerreiro, asseverava Magno, entre a urbe e a orbe fora uma deriva triunfal, do zénite ao ocaso. Onde então, incólume mas magoado, além da lógica do murro, o já venerando Condestável se sentia vulnerado - ao confiar-lhe:

– Bem vê, começo a ficar fraco e destrutível… Qualquer dia, apareço aí num monturo, derrotado!

– Não diga isso… – teria ousado repreendê-lo Magno – o meu caro é um batalhador!...

– Ora, ora… – lastimou-se o decepcionado Condestável – Lutar por quê, ou contra quem?

Portanto, decompunha-se a lucidez do veterano combatente - consoante, mais entradote, desterrado na permissiva Musgueira e em obsceno facilitismo, o sobressaltava a natureza corriqueira como estro humano. A ele que brandira - entre as luzes e as trevas - a mística da raça, o afã formidável da esfera armilar!

 Continua



IMAGINÁRiO114
08 JAN 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

REINCIDÊNCIA

 Como em longa panorâmica quanto às afeições e às revelações de infância, os clássicos da banda desenhada franco-belga desfilam actualmente em colecções monográficas que - permitindo uma estimativa crítica ou nostálgica em relação aos heróis que nos emocionaram e divertiram, às séries que fixaram o culto por géneros e filiaram a sequência de alternativas - suscitam em paralelo uma reavaliação sobre os criadores, argumentistas ou ilustradores, e seus colaboradores ou continuadores, e sobre a evolução da arte em quadradinhos, segundo os parâmetros estéticos e narrativos afins à recorrência cronológica. Tal propõem as Edições Asas em consagração de Lucky Luke, distinguindo a carisma do cowboy que dispara mais rápido que a própria sombra, entre a jovialidade e a maturidade, e o engenho excepcional de Morris - aliás, Maurice de Bévère (1923-2001) - e René Goscinny (1926-1977), exaltando a ficção e subvertendo a história, com uma fascinante mescla de insolência e inteligência. Eis alguns dos mais recentes álbuns publicados, com respeito à data de registo do copyright: Western Circus (1970) de Goscinny e Morris, Rodeo (1971) de Morris, O Bandido Maneta (1981) de Morris e De Groot, Sarah Bernhardt (1982) de Morris, Léturgie e Fauche IMAGINÁRiO5-15-61.

CALENDÁRiO

OUT2006 - Robert Downey Jr é escolhido para protagonizar Iron Man sob direcção de Jon Favreau, a primeira longa metragem de produção exclusiva - sob um orçamento de cem milhões de dólares - pela Marvel Entertainment, após uma política de cedência ou coligação com outros estúdios de Hollywood, para transfigurar no grande ecrã alguns dos seus mais populares super-heróis em quadradinhos, como Spider-Man ou X-Men. O Homem-de-Ferro - aparecido em Março de 1963, nas Tales of Suspense, por Stan Lee & Don Heck - tem como personalidade secreta o cientista e milionário Tony Stark que, sequestrado pelas forças do mal tendo em vista fabricar armas de destruição maciça, logra construir uma extraordinária armadura, graças à qual se evade e salvará o Mundo de mais uma terrível ameaça.

MEMÓRiA

10JAN1747 - 1823 - Abraham Louis Breguet: O relojoeiro dos reis, e o rei dos relojoeiros.

1889-10JAN1957 - Gabriela Mistral: «Ama a beleza, que ela é a sombra de Deus no universo.»

1899-14JAN1957 - Humphrey Bogart: «A melhor maneira de sobreviver a um Oscar, é não tentar ganhar outro.»

1903-14JAN1977 - Anaïs Nin: «Há apenas dois tipos de liberdade no mundo: a liberdade dos ricos e poderosos, e a liberdade dos artistas e dos monges que renunciam à propriedade.»

ANTIQUÁRiO

10JAN1946 - O Observatório Evans, em Marconi Road, Wall, Nova Jersey, EUA, estabelece o primeiro contacto humano com a Lua, através do radar, consumando o Project Diana.

1957 - John Ford dirige A Águia Voa ao Sol/The Wings of Eagles, com John Wayne e Maureen O’Hara.

10FEV2006 - Uma expedição científica, ligada ao projecto espanhol Permamodel, e coordenada por Gonçalo Vieira, investigador do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa, parte em missão às ilhas Livingstone (coberta em noventa por cento por glaciares) e Deception (com um vulcão activo), Shetlands, onde viabilizará a instalação de equipamento no subsolo antárctico para estudos sobre as alterações climáticas.

PRIORITÁRiO

Latitudes - Cahiers Lusophones - Relativo a Setembro de 2006, o número 27 desta revista bilingue, sendo director Daniel Lacerda, privilegia a temática Letras e Artes do Exílio/Emigração Lusófonos, com destaque para prosoética, exposições, livros, música. Em Estudos, Dominique Stoenesco desvenda Os Poetas Portugueses Emigrados ou Exilados em França, dos Anos 1960-70 aos Nossos Dias. A contactar para latitudes.cl@wanadoo.fr

OBSERVATÓRiO

http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt - Projecto em construção, visando uma biblioteca digital de publicações periódicas - relativas à imprensa portuguesa, dos primórdios à actualidade. Além de outros recursos informativos, disponibiliza conteúdos digitais, com destaque para o fundo local, histórico e fontes documentais para o estudo e consulta do acervo bibliográfico da Hemeroteca Municipal de Lisboa. Criada em 1973 e temporariamente encerrada na Rua de São Pedro de Alcântara, esta instituição encontra-se a funcionar no Gabinete de Estudos Olisiponenses, estando - a partir de Outubro/Novembro de 2007 - instalada no Palácio Relvas.

VISTORiA

 

Não existe troça entre as mulheres. Cada uma deita-se em paz como no próprio seio.

Vem comigo, Sabina, vem para a minha ilha. Vem para a minha ilha de pimentões que crepitam em lentos braseiros, de potes de cerâmica mourisca conservando a água dourada, de palmeiras, de gatos selvagens em luta, de um burro que soluça na alvorada, os pés entre recifes de coral e anémonas marinhas, o corpo coberto de algas longas, cabeleira de Melisande sobre o varandim da Opéra Comique, diamante inexorável de luz do dia, horas pesadas e flácidas em sombras violeta, rochas cor de cinza e oliveiras, limoeiros de frutos suspensos como lampiões num garden party, rebentos de bambu em constante vibração, som macio das alpergatas, romãs explodindo sangue, o canto flauta árabe, longo e persistente dos homens que lavram a terra, trinando, blasfemando, louvando e injuriando, lançando nela o suor e as sementes.
A tua beleza submerge-me, submerge o mais fundo de mim.
Anaïs Nin - A Casa do Incesto (1947 - excerto)

BREVIÁRiO

2005 - Bico de Pena edita Passarinhos de Anaïs Nin.

Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema edita Carl Th. Dreyer, em As Folhas da Cinemateca.

Bico de Pena edita Autobiografia de Marilyn Monroe de Rafael Reig; tradução de Afonso Leonardo IMAGINÁRiO85.

REPOSITÓRiO

A Águia Voa ao Sol

 

A partir dos anos ’80, a produção fílmica sob chancela de Hollywood assistiu a profundas mutações, marcadas pela evolução e pela sobrevivência. Além de um olhar já estilizado sob o espectáculo virtual, entre o grande e o pequeno ecrãs, tal sucessão mítica e mediática processou-se numa expressão híbrida quanto a temas ou géneros, tendo em vista um agrado espontâneo por toda a gente. Em paralelo, diluiu-se o carácter das personagens e a carisma dos intérpretes.

São pormenores que escapam ao público actual, propício ou preparado pela uniformização dos meios audiovisuais - cinema, televisão, vídeo - interligados para uma exploração sucedânea e globalizadora. Mas as transformações tornam-se patentes, ao repreciarmos o fascínio dos clássicos - e, sobretudo, através da ampla projecção em salas, para as quais foram concebidos... Em mais uma prodigiosa ressurreição, eis o que nos oferece A Águia Voa ao Sol (1957).

À partida, esteve a experiência autêntica de Frank Spig Wead, um notório piloto-aviador da Marinha americana, durante a I Guerra Mundial. Depois tornou-se escritor, e vários dos seus livros foram transpostos para filmes, noutros participando directamente como argumentista. Colaborou com John Ford (1895-1973) em Air Mail (1932) ou Homens Para Queimar (1945), vinculando-os uma sólida amizade até à morte em 1947, e reexposta nesta homenagem.

Fiel e sentido, Ford mantém pois uma intencionalidade inquebrantável, nesta póstuma (auto)biografia - sobre os desafios e as opções de um homem fora do comum, que acabou trocando o fascínio do ar, pelo recato da família em crise. Por infortúnio, certa noite caiu nas escadas, quando ia cuidar do filho, e ficou paralisado. Sem esmorecer, e superando o sofrimento físico e moral, Spig Wead reinventou a sua mobilidade, num sistema de transporte para o interior de porta-aviões.

Entretanto, estalara a II Grande Guerra, e Spig Wead voltou ao serviço - até uma renúncia por si só heróica, em circunstâncias de sacrifício e de assunção... Duas estrelas intemporais, Maureen O’Hara e um favorito John Wayne cintilam neste universo fordiano, constelado pelo testemunho exaltante das vivências humanas. Afinal, a história da América numa dimensão universal de conflitos e referências - tal como, em todo o esplendor, exaltara A Paixão dos Fortes (1946) IMAGINÁRiO23.

TRAJECTÓRiA

Breguet

 

Abraham Louis Breguet nasceu em Neuchâtel, Suíça, a 10 de Janeiro de 1747. Estudou em França e em Inglaterra, tornando-se o mais inovador relojoeiro de todos os tempos, numa época de artesanato manual. Em 1775, fundou empresa própria na Île de la Cité de Paris, formando uma equipa de trabalho. De 1776 a 1823, a oficina de Breguet produziu mais de cinco mil relógios, feitos pelos seus trabalhadores e segundo as suas exigentes regras. A partir de 1780, Breguet determinou o caminho em quase todos os ramos da relojoaria. Em 1815, logrou um contrato oficial com a Marinha gaulesa. Breguet fez pouco trabalho de montagem de relógios; ele concebia-os. O que produzia a sua mente criativa era único, e alterou a disposição do recém inventado mecanismo Lépine. Durante muitos anos, marcou a norma e o estilo para o relógio de bolso, tanto por dentro como por fora - mecanismo, caixa, mostrador e ponteiros. Breguet contava com os fornecedores de Genebra, para abastecer-se de mecanismos «em bruto» (ébauches) que permitissem aos «artistas» (como chamava aos seus peritos obreiros) satisfazer a procura. A realeza europeia e os mais ricos comerciantes esperavam longos meses, para terem o relógio dos seus sonhos e segundo as suas especificações. Manteve sempre o trabalho da sua oficina no auge da qualidade e da eficiência técnica, demonstrando que é necessário algo mais que um grande nome para uma indústria progredir, sendo ainda imprescindíveis custos reduzidos e acesso a amplos mercados. Faleceu em Paris, a 17 de Setembro de 1823. Depois de Breguet, os relógios foram, no melhor dos casos, cópias dos seus designs e ideias.



IMAGINÁRiO113
01 JAN 2007 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano IV · Semanal · Fundado em 2004

PRONTUÁRiO

 DIGNIDADE

 O imaginário americano é, cada vez mais, uma vertigem mediática, através de distintas fontes de inspiração, rituais de culto, híbridas mitologias, lendas fragmentárias, onde os criadores e os artistas estilizam obsessões próprias, fantasmas colectivos - além do tempo e da realidade, na actualidade dos símbolos e dos testemunhos. Uma dessas personalidades mais versáteis, Tommy Lee Jones está de regresso para consumar Os Três Enterros de Um Homem - com edição em DVD, sob chancela Lusomundo - logrando uma amplitude clássica sobre os mananciais do western e os horizontes limítrofes, estigmatizados simultaneamente como realizador e protagonista. Tal universo virtual, sob caprichoso enredo do argumentista Guillermo Arriaga, implica um olhar transfigurado pela fotografia de Chris Menges, numa fascinante saga - serena e intensa, física e anímica, assim distinguida pelo Festival de Cannes. A morte absurda de Melquiades Estrada, trabalhador ilegal por um guarda fronteiriço, deixado no deserto e depois de funeral indigno, levam o seu amigo e capataz Pete Perkins a uma jornada de expiação e redenção, entre o Texas e o México, em companhia forçada do assassino, com o cadáver até uma justa sepultura na terra natal... Ironia, emoção - das inúmeras leituras ao nexo de referências - consumam uma volúvel homenagem, algures entre Sam Peckinpah e John Sayles, sondando atmosferas cénicas e geográficas com a maturidade e a sobriedade que só os mestres logram.

CALENDÁRiO

1929-15SET2006 - Oriana Fallaci: «Superjornalista, muito melhor do que escritora, as suas entrevistas fizeram escola. Teria preferido não ler os seus últimos livros, mas conhecê-la foi um privilégio» (Massimo Fini).

18SET2006 - O Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, Armindo Costa, faz entrega solene à Casa-Museu Camilo Castelo Branco, em São Miguel de Seide, de um espólio adquirido pela autarquia por vinte e cinco mil euros, o qual inclui cento e doze cartas do escritor (1825-1890), enviadas a Tomaz Ribeiro - deputado, par do Reino e ministro, seu amigo a quem dedicou o romance Maria Moisés (1876) IMAGINÁRiO27-111.

1922-20SET2006 - Sven Nykvist: Mestre da luz, o Rembrandt do Cinema, fotógrafo de Ingmar Bergman desde 1953, distinguido com o Oscar por Lágrimas e Suspiros (1973), Fanny e Alexandre (1982) e A Insustentável Leveza do Ser (1988 - Philip Kaufman).

1915-29SET2006 - Margarida de Abreu: «Não sou revolucionária. As revoluções são para outras coisas. Eu só quis que Portugal dançasse a sério, que deixasse de ser só folclore e que experimentasse.»

05OUT2006 - Atalanta Filmes estreia Transe de Teresa Villaverde; com Ana Moreira e Robinson Stévenin.

12OUT2006 - LNK estreia Filme da Treta de José Sacramento; com António Feio e José Pedro Gomes.

03-15OUT2006 - No Centro Colombo, em Lisboa, Editorial Verbo apresenta a exposição comemorativa de Anita - 50 Anos.

VISTORiA

 
A alta rocha, sustem-me, que esmoreço!
De amor não sei se estou para expirar...
Como me anseia!... Enquanto não faleço,
com a noite quero aqui desabafar.

Ó meu amor, ó meu amor, aonde fugiste,
Onde estou eu agora e onde estava?...
A alma começa a conhecer que existe,
que até agora sabia só que amava.

Não estive num mar quase afogado,
de inefável, angélica ternura?...
Respiro apenas... inda estou cercado
de estranha, grossa nuvem de luz pura.

De amor prodígios, inda não ouvidos,
que absorto sinto e que entender não sei!...
Solta-se-me a alma dos mortais sentidos,
ou acordo de um sonho?... Ah! não sonhei.

Não, não sonhei; que estes teus braços vejo
inda na acção de te abraçar pasmados!
Não sonhei, não; que inda o celeste beijo
gozo nos beiços mais que namorados.
José Anastácio da Cunha - O Abraço (excerto)

TRAJECTÓRiA

WILD BILL HICKOK
UM HERÓI DA FRONTEIRA

Um dos pioneiros gloriosos da epopeia do Oeste, Wild Bill Hickok nasceu James Butler Hickok, em Troy Grove (Ilinóis) em 1837, e faleceu em Deadwood (actual Dakota do Sul) em 1876. Guia, jogador, um homem da fronteira, a sua reputação converteu-o numa lenda, tendo visto a sua vida mitificada. Durante a infância, trabalhou na quinta paterna, até - pelos dezanove anos - partir para o Kansas, onde aderiu ao movimento contra a escravatura. Em 1861, logrou fama, ao liquidar Dave McCanles em Rock Creek (Nebrasca). Em plena Guerra Civil, trabalhou para a União, como guia e espião. Depois, foi nomeado marshal dos Estados Unidos, e tornou-se batedor do Exército. A sua popularidade cresceu como sheriff de Hays City e marshal de Abilene, pacificando e impondo a lei, nessas duas tumultuosas cidades do Kansas. Em 1872-74, Hickok foi uma das vedetas do Bufallo Bill’s Wild West Show, triunfando em Nova Iorque. Em 1876, casou com Agnés Lake, uma actriz viúva, a quem deixou pouco depois em Cincinnati. Atraído pelas jazidas auríferas do Dakota, jogava póquer no saloon Number Ten de Deadwood, quando foi abatido por um forasteiro embriegado. Ficaram por esclarecer as reais motivações de Jack McCall, enforcado em 1877. A saga de Wild Bill Hickok foi amplamente explorada em grande ecrã, com distintas motivações e artifícios, logo a partir do cinema mudo. Primordial é, no entanto, The Great Adventures of Wild Bill Hickok (1938, Mack V. Wright, Sam Nelson), um serial da Columbia, em quinze capítulos, privilegiando o marshal de Abilene, e protagonizado por Gordon Elliott. Este teve tal sucesso, que se tornou conhecido como Bill Elliott, e regressou como Campeão da Aventura (The Return of Wild Bill, 1940), uma longa metragem de Joseph H. Lewis, sobre as origens do herói. No ano seguinte, Alfred E. Green dirigiu Terras Malditas (The Badlands of Dakota, 1941), que atraem Hickok (Richard Dix), Calamity Jane e o General Custer. Em 1942, Ray Enright realizou Wild Bill Hickok Rides, apresentando Bruce Cabot como um corajoso pistoleiro, em defesa dos colonos. Inevitavelmente, Wild Bill (Howard Keel) junta-se às Diabruras de Jane (Calamity Jane, 1953, David Butler), um western musical. Ainda em 1953, Jan Sterling deu vida a Hickok - que, por 1860, presta auxílio a Buffalo Bill, o Indomável  (Pony Express, Jerry Hopper), para manter a Califórnia na União. Já em 1977, Charles Bronson assumiu Hickok contra A Carga do Búfalo Branco (The White Buffalo/Hunt To Kill, J. Lee Thompson), que simboliza a obsessão da morte. Assombrado, afinal, por um epílogo fatídico, Wild Bill (1995, Walter Will) resiste na perturbante composição de Jeff Bridges, como espectro da imortalidade.

ALEGORiA

Sátira

Dias trezentos e sessenta e cinco
Tem o ano.
Pois creiam que não brinco:
É n’este, no primeiro,
Que mais se mente!
Nenhum tão embusteiro
P’ra toda a gente!

Porque será que em dia tão festivo
Tão falsos beijos dão? Qual o motivo?
Hoje, dia de Ano Bom,
É tudo engano...
Tem a gente de bom tom
As duas Caras de Jano!
Panara 01JAN1897 - Diário de Notícias

MEMÓRiA

1744-01JAN1787 - José Anastácio da Cunha: «No golfão de tão grata eternidade / com a contemplação se submergiu, / embebido na quase realidade, / até que a aurora ao sol a porta abriu.»

ANTIQUÁRiO

1657 - Em Inglaterra, é inventado o pêndulo, tornando a roda catarina obsoleta, e passando a caixa alta a dominar a produção de relógios. A maior parte dos fabricados com roda catarina foram convertidos, de modo a utilizar o pêndulo, que assegurava uma muito maior precisão. Logo, seguiu-se a aplicação do escape de âncora, a que se juntou, doze a catorze anos depois, o pêndulo real ou de batimento dos segundos. Durante este período, os relógios passaram, em pontualidade, de um erro de cerca de 5 a 10 minutos por dia, para 15 a 20 segundos por semana.

1737 - Natural de Minas Gerais, José de Santa Rita Durão (1722-1784) ingressa na Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho, sendo o autor de Caramurú - Poema Épico do Descubrimento da Bahia, publicado em Lisboa, no ano de 1781, pela Régia Officina Typographica.

 04JAN1967 - Donald Campbell morre aos quarenta e seis anos, pilotando o Bluebird K7, cujo controlo perdeu, na tentativa de superar o récorde do mundo de velocidade, que alcançara em 1964 na água e, poucos meses antes, em terra - um feito ainda imbatível.

RELATATÓRiO

 Edwin Rousby
Deixa Portugal

04JAN1897 - Real Colyseu (da Rua da Palma) - Festa artística de M.me Rousby e antepenúltima apresentação do Animatographo.

05JAN1897 - Real Colyseu (da Rua da Palma) - Festa artística do distinto electricista Mr. Rousby e penúltima apresentação do Animatographo.

06JAN1897 - Real Colyseu (da Rua da Palma) - Despedida do Animatographo, do Reino da Electricidade e da Companhia LIMAGINÁRiO87.

 

BREVIÁRiO

Esfera do Caos edita O Olho de Vidro (1866) de Camilo Castelo Branco.

PrimeBooks edita Odes Píticas Para os Vencedores de Píndaro (518 aC-438 aC).

CTT edita A Herança Romana em Portugal de Carlos Fabião.

Casa da Animação edita Animação Portuguesa 2004-2006, sendo directores Manuela Lima, Luís da Matta Almeida e Ana Vila Real.

Ésquilo edita Evangelho de Judas de Antonio Piñero e Sofia Torallas-Tovas; tradução de Luís Filipe Sarmento IMAGINÁRiO90.


IMAGINÁRiO112
24 DEZ 2006 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano III · Semanal · Fundado em 2004

ANIVERSÁRiO

EVOCAÇÃO

 Quando visitei Alfred Hitchcock durante o Natal de 1976, nos Estúdios Universal onde há vinte anos ocupava o mesmo bungalow em que fazia as Alfred Hitchcock Productions, ele estava a ver um filme de Peter Bogdanovich, Nickelodeon [1976]. Interrompeu a projecção, levou-me para o seu escritório e pediu dois bifes. A nossa conversa começou no mesmo lugar, e quase nas mesmas circunstâncias em que, catorze anos antes, iniciámos este livro! Coloquei-lhe, com atraso, uma questão que sempre me tinha intrigado, quanto a Psico [1960]. No momento do assassinato de Janet Leigh no duche, tinha curiosidade em saber quem entrou no quarto-de-banho com o punhal na mão: O próprio Anthony Perkins? Uma mulher? Um duplo? Um bailarino? Se nos lembrarmos que o assassino foi filmado em contra-luz, e que parece uma sombra chinesa, aceitar-se-á a ideia de que todas estas hipóteses podem ser certas. Hitchcock esclareceu-me que era uma mulher com uma peruca, mas que fora necessário rodar a cena duas vezes. Embora a única fonte de luz estivesse colocada por detrás dela, na primeira tomada-de-vista distinguia-se o seu rosto com demasiada nitidez, pois a refracção do quarto-de-banho branco era muito intensa. «Por isso, tivemos que pintar de negro o rosto dessa duplo - para, finalmente, obter o efeito de uma silhueta escura na tela. Obscura e não-identificável.»
François Truffaut - O Cinema de Alfred Hitchcock (Adenda, 1983)

CALENDÁRiO

1922-25AGO2006 - Joseph Stefano: Argumentista de Psico (1960 - Alfred Hitchcock), sobre o crime no chuveiro - «Achei que, se ninguém conhecesse a personagem, ninguém ia se importar com a sua morte. Portanto, ampliei um pouco a sua história, para que o momento do assassinato tivesse mais impacto».

10SET2006 - Uma equipa de paleontólogos da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, do Conselho Superior de Investigações Científicas de Espanha e da Ohio State University (EUA) identifica - entre os exemplares de fósseis recolhidos há um século pelo geólogo Joaquim Nery Delgado, em pedreira entretanto desaparecida das proximidades de Valongo, os quais foram conservados no Museu Geológico de Lisboa - um invertebrado marinho correspondente a nova família, novo género e nova espécie de crinóide. Pertencente a um grupo de equinodermes primitivos, que viveu durante o Período Ordovícico num mar pouco profundo, o fóssil colhe a designação Delgadocrinus Oportovinum, pela semelhança morfológica com um cálice de Vinho do Porto, sendo o mais antigo da Península Ibérica, com 470 milhões de anos.

MEMÓRiA

1932-28DEZ1986 - Andrei Tarkovski: «Hamlet - ou, pelo menos, uma parte - deveria ter sido filmado em Monument Valley. É impressionante um lugar como este, onde ousaríamos falar com Deus, e os americanos fizeram filmes como John Ford costumava realizar».

1875-29DEZ1926: Rainer Maria Rilke: «Mesmo o que é passado existe na totalidade do seu presente, se em vez do conteúdo nos concentrarmos na intensidade».

1889-29DEZ1946 - Abel Salazar: Artista plástico e desenhador, médico e cientista, professor catedrático, director do Instituto de Histologia e Embriologia (1919), pensador e filósofo, pedagogo e escritor, autor de A Crise da Europa (1943) IMAGINÁRiO101

1864-31DEZ1936 - Miguel de Unamuno: «Deus é um louco que se julga Unamuno».

ANTIQUÁRiO

10SET1756 - El-Rei D. José I apõe a sua assinatura no Alvará que institui a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro. O Douro não foi a primeira região produtora de vinho a ser demarcada na Europa mas, primordialmente, o Alvará impôs ainda regras para defender a qualidade dos vinhos e criou uma entidade de controlo para as aplicarL10SET2006 - Público (Manuel Carvalho)

27DEZ1916 - O Conselho Geral do Sena emite «votos no sentido de, para entravar o aumento da criminalidade infantil e juvenil, intervirem medidas rigorosas para a supressão das fitas policiais e, em suma, desmoralizadoras». Entre essas fitas citam-se, como bastante prejudiciais, Os Vampiros (1915 - Louis Feuillade), Mistérios de New-York (1915 - Donald Mackenzie & Louis Gasnier) e Máscara dos Dentes Brancos (1916 - Edward José). No fascículo do Larousse Mensuel referente ao mês de Julho, escreve Louis André que «a influência do cinematógrafo continua a ser tão grande e má», que os maires franceses de Lyon, Valence, Albi e de Troyes se resolveram a «lançar um enérgico grito de alarme». Tal justificar-se-ia pelo aumento da criminalidade infantil e juvenil, especificando que, no departamento do Sena, houve 2.419 delinquentes menores de 18 anos, em 1915-16, contra 1.178 em 1914-15 IMAGINÁRiO36.

JUN1935 - O Secretariado da Propaganda Nacional/SPN produz e distribui o documentário A Praia da Nazaré - a partir do convite aceite por vários escritores estrangeiros, para assistirem às Festas de Lisboa. Tendo organizado com essas personalidades mundiais uma excursão à Praia da Nazaré, entre outros estão em foco Jacques Maritain, Luigi Pirandello, Maeterlink, Mauriac, Jules Romain, Duhamel, Miguel de Unamuno, Fernández Flores, Gabriela Mistral e Ribeiro Couto.

VISTORiA


Com lembranças de esperanças
e esperanças de lembranças
vamos matando a vida,
e dando vida ao eterno
descuido que do cuidado
de morrer nos olvidamos...
Já foi outra vez o futuro,
será de novo o passado,
amanhã e ontem mesclados
no hoje se quedam mortos.
Despertei-me sonhando,
sonhei que estava desperto,
sonhei que o sonho era vida,
sonhei que a vida é sonho.
Senti que estava desperto,
pensei que sentia, e logo
vi reduzirem-se a cinzas
meus pensamentos de fogo.
Se há quem não sente a brasa
debaixo destes conceitos,
é que em sua vida pensou
com seu próprio sentimento,
é que em sua vida sentiu
dentro de si o pensamento.
Flores o amor dá ao homem,
flores entre folhas ao vento,
mas dá-lhe também diamantes
duros, cortantes e concisos.
Nem só o vapor aquece,
não chames de frio ao seco,
a carne arrefece amiúde
e costuma queimar os ossos.
Miguel de Unamuno

TRAJECTÓRiA

ANDREI TARKOVSKI
O VISIONÁRIO

Imaginário e itinerário coincidem no universo de formas e obsessões de Andrei Tarkovski, um dos mestres do cinema moderno, cujo exílio no Ocidente transfigurou pelas referências culturais ou afectivas sobre a Rússia, pátria-mãe, entre os signos e valores referenciais quanto a uma personalidade inquieta, insolidária mas sublimada, na solenidade duma ascese espiritual. Andrei Roubliov e Solaris, suas obras-primas primordiais, virtualizam o legado de Tarkovski, como um testemunho de esperança e perenidade artística.

Em Portugal, a estreia comercial dos filmes de Tarkovski começou por ser anómala e lacunar - aliás, consequência do que, em geral, aconteceu por toda a Europa. Assim, a apresentação de Andrei Roubliov (1966) no Festival de Cannes apenas foi oficialmente facultada com três anos de atraso, sendo então distinguido pela Fipresci. Autorizada a exportação em 1971, houve que esperar até 1983 para o ver distribuído entre nós. Ou seja, sete anos após o lançamento de Solaris - rodado em 1972 e, pela mesma altura, alvo de um prémio especial do júri em Cannes.

Afinal, tais factos documentam as contingências duma revelação da obra de Tarkovski fora da ex-União Soviética. Outro exemplo essencial, Stalker (1979) foi proibido de participar em Veneza, para no ano seguinte comparecer em Roterdão e Cannes; por cá, foi lançado em 1984. Tudo se alterou a partir de Nostalgia (1983), co-produção entre a URSS e a Itália, onde foi filmada. Tarkovski renunciou então à cidadania natal, pedindo asilo político, por não lhe ser consentida uma ausência prolongada no estrangeiro, em regime de trabalho.
Residindo em Paris desde 1984, ali faleceu Tarkovski em 1986, de um cancro devastador. Tinha 53 anos. Já não assistiu à aclamação de O Sacrifício (1986) em Cannes, meses antes. Por realizar, deixou um projecto sobre Santo António, que antevia como uma «meditação sobre o pecado e a santidade». Filho do poeta Arseni Tarkovski, além de música e pintura estudou geologia. Era um fanático da língua e da tradição árabes. Ingmar Bergman considerou-o «o maior, o único que inventou uma nova linguagem, verdadeira como a natureza dos seus filmes».

Saído da Escola de Cinema em 1961, Tarkovski colaborou em vários argumentos com Andrei M. Kontchalovski - um dos quais Andrei Roubliov que veio a dirigir, e lhe atribuiu grande prestígio. Em causa está um pintor de ícones cuja existência, entre 1370 e 1430, foi marcada por experiências dolorosas e conflitos contraditórios: crueldade e mística, opressão e esperança, magia e paganismo, desespero e loucura, tragédia e êxtase. Vivendo uma época crucial, para a Rússia do futuro, Rubliov imortalizou-se nas cores e nos traços de um criador iluminado.

Baseado num romance de Stanislas Lem, que Tarkovski transpôs segundo a sua peculiar inspiração, o fenómeno de Solaris foi, à época, «contaminado» pelo síndroma de 2001 - Odisseia no Espaço (1968) de Stanley Kubrick. Aliás, para além do fantástico ou da ficção científica, sobressai o fascínio ontológico - para Tarkovski, «a pesquisa psíquica» - que impele Kris Kelvin, um astronauta em busca de si próprio. A missão, ou o seu destino, residem num planeta inquietante e desconhecido, rodeado por um oceano de plasma inteligente, de conotações divinas.

Este era o filme favorito de Boris Ugarov, responsável pelo sector da Literatura e das Artes, no Comité de Nomeação para o Prémio Lenine - que, em 1990, foi postumamente atribuído a Andrei Tarkovski, saudando «um artista de reflexão profunda sobre o significado da vida». Tal como ficou sintetizado em O Sacrifício, como um ciclo ritual de confiança e transmissão: o cineasta dedicou-o ao filho, a quem deixara na União Soviética - tal como a mulher, e ambos com a idade das personagens que, no filme, representam os «entes queridos», numa evocação distante e expiatória.

BREVIÁRiO

Relógio d’Água edita Os Sonetos a Orfeu de Rainer Maria Rilke; tradução de José Miranda Justo.

Sony BMAG edita em CD, Sátiro por Gaiteiros de Lisboa; artes musicais, ritmos tradicionais.

Kafre edita Ano Teatral 1885 de José de Matos-Cruz, no âmbito do projecto de investigação Anuário Teatral - Portugal - Século XIX.

Guerra & Paz edita Correspondência - Sophia de Mello Breyner, Jorge de Sena - 1959-1978.

EXTRAORDINÁRiO

 O INFANTE PORTUGAL
Folhetim aperiódico

Capítulo Quatro
A MUSA DOS CABELOS DE LODO - 32

 Outrora, Magno convivera com o derradeiro Condestável Luzitano, o tal Pereira Dias antes do seu hausto infausto. Extraiu-lhe um manancial tão opulento e áspero, que temera prejudicar a fina caligrafia com que calibrava, cioso, o seu imprescindível e temido bloco de apontamentos.

Continua



IMAGINÁRiO111
16 DEZ 2006 · Edição Kafre · imaginario@imaginarios.org
Ano III · Semanal · Fundado em 2004


PRONTUÁRiO

REVELAÇÕES

 

Tendo reinvestido com talento e carisma uma das mais genuínas tradições de Hollywood, em prol da comédia romântica, como protagonista ou realizador, a versátil maturidade de Steve Martin atinge outros fulgores com Uma Rapariga Cheia de Sonhos - em DVD sob chancela Lusomundo - a partir da sua novela Shopgirl, que interpreta ao lado de Clare Danes e Jason Schwartzman, sendo a direcção confiada a Anand Tucker. Em causa, Mirabelle, jovem empregada de uma luvaria em Beverly Hills, que ambiciona uma carreira artística e, mantendo uma relação de circunstância com Porter, empresário de sucesso e avesso a compromissos de Los Angeles, reverte a afeição sentimental por Jeremy, músico aspirante que sobrevive como vendedor de amplificadores para concertos de rock. Em peripécias de humor e sedução, eis um cenário privilegiado de vivências, emoções, experiências e revelações - que se fundem num contraste entre gerações, de universos sociais, de peculiares motivações - consumando uma homenagem ao próprio cinema, sobre o qual constitui ainda um exemplar simples e hábil de sucesso comercial.

CALENDÁRiO

1945-16JUL2006 - Roger Silverstone: «A história da pesquisa da comunicação de massas foi dominada por tentativas para aferir tal fenómeno, mas as metodologias utilizadas raramente conseguiram dar conta da subtileza, da profundidade e dos efeitos a longo prazo.»

1899-24AGO1966 - Lao She: «Os contos de fadas são, apenas, fantasias. As histórias da minha mãe eram cem por cento mais reais, e afectaram directamente toda a minha família.»

1918-04SET2006 - Astrid Varnay: Soprano húngaro-norte-americana, nascida em Estocolmo, iniciou carreira nos Estados Unidos, tornando-se conhecida em 1941 ao interpretar Sieglinde em As Valquírias de Richard Wagner, na Ópera de Nova Iorque, em substituição de Lotte Lehman.

14SET2006 - Atalanta Filmes estreia 98 Octanas de Fernando Lopes; com Rogério Samora e Carla Chambel.

16DEZ2006 - Entre as 11 e as 24 horas, Casa da Música (Porto) apresenta uma maratona de concertos de Fernando Lopes-Graça, incluindo 24 Prelúdios, Glosas e Sonatas Para Piano.

MEMÓRiA

 1920-11FEV1986 - Frank Herbert: «O início do conhecimento é a descoberta de uma qualquer coisa que não compreendemos.»

05SET1946-1991 - Freddie Mercury: «Não fico parado em casa lendo livros, acho uma perda de tempo. Eu quero viver, e não me preocupo com isto ou aquilo, com o que vão pensar de mim. Vivo tranquilo, porque Deus toma conta de mim. Ele cuida da minha alma, e sabe o que fazer com ela.»

1860-08NOV1946 - Eduardo Schwalbach: Escritor e jornalista, dramaturgo, deputado, bibliotecário da Biblioteca Nacional (1867), director do Real Conservatório de Lisboa (1894) e do Diário de Notícias (1924 e 1939).

17DEZ1906-1994 - Fernando Lopes-Graça: «A música é a minha única religião».

1934-20DEZ1996 - Carl Sagan: «As coisas foram feitas de modo a que quase ninguém perceba nada de ciência ou de tecnologia. Esta é a receita para a catástrofe».

ANTIQUÁRiO

1796 - Um relojoeiro de Genebra, o suíço Antoine Favre inventa a caixinha de música. Para tal, incorporou num relógio uma certa quantidade de lâminas de aço, fixas num dos lados e levantadas no outro por picotes de um cilindro, que rodava por meio de pequena manivela. A rotatividade do cilindro fazia variar a música e a respectiva velocidade de curso.

NOTICIÁRiO

 Camillo Castello Branco - A acreditada casa editora de Eduardo da Costa Santos, do Porto, acaba de dar a público o primeiro número de uma crónica mensal, intitulada Serões de São Miguel de Seide, escrita por Camillo Castello Branco. É crónica de literatura amena, novela, polémica mansa, crítica suave de maus livros e dos maus costumes. O melhor reclame da nova obra está no título laureado que encima estas linhas.
19DEZ1885 - Diário de Notícias

VISTORiA

O TRONO E O CORAÇÃO

 

Em 1947, a obra-prima de Margaret Landon - Anna and the King of Siam, que se inspirou em factos reais - era levada ao cinema por John Cromwell, em Ana e o Rei do Sião, do qual foram intérpretes Irene Dunne e Rex Harrison. Dez anos passados, o grande ecrã imortalizava O Rei e Eu (1956) de Walter Lang, a par com os seus protagonistas Deborah Kerr e Yul Brynner. Aliás, existe um sucesso intermédio, pois o guião de Ernest Lehman baseia-se num espectáculo musical de Richard Rodgers & Oscar Hammerstein II, celebrado pela Broadway a partir de 1951.

Correspondendo ao desafio da actriz e produtora Gertrude Lawrence, Rodgers & Hammerstein inspiraram-se no entrecho prévio de Talbot Jennings & Sally Benson. Já em palco, com estreia no St. James Theatre, Brynner contracenou com Lawrence, num total de 1.246 representações... Em O Rei e Eu, sobressai a lendária exclamação de Anna/Kerr a Mangkut: «Eu não sou vossa escrava, e vós não tendes coração!». Assumindo o monarca, Brynner contesta «Eu sou rei, porque nasci para o ser!», uma das réplicas que lhe terão valido o Oscar para o Melhor Actor. Outros distinguiram a cenografia, a decoração e o vestuário sob os auspícios da cor, o registo sonoro e a partitura para um filme musical.

Imortalizado com West Side Story/Amor Sem Barreiras (1961 - Robert Wise), Jerome Robbins, que coreografara em palco, foi chamado pela primeira vez a Hollywood para O Rei e Eu. Os cenografistas Lyle Wheeler e John DeCuir gastaram 750.000 dólares (valor de 1956) para criar quarenta sets diferentes, cada um dez vezes maior que o cenário original em que se basearam, para exibir a opulência da corte siamesa. Habitual colaborador de Alfred Hitchcock (Intriga Internacional - 1959), Lehman concebeu depois o argumento de Música no Coração (1965 - Wise).

Em 1863, Anne Leonowen, uma professora inglesa é contratada para ensinar as crianças nobres no reino do Sião. Mongkut, prestigiado como homem da ciência, pretende mostrar ao mundo que o Sião está preparado para se integrar entre as nações modernas e civilizadas. Mas o primeiro-ministro Kralahome anseia provar à Rainha Victoria, da Grã-Bretanha, que o Rei é um bárbaro, e deve ser destronado. Tal deixaria o poder nas mãos de Kralahome, para prosseguir os seus maléficos desígnios. Anna considera Mongkut severo, e obcecado por crenças ultrapassadas...

Consagrando o CinemaScope 55, O Rei e Eu sublima outros elementos clássicos e intemporais - como o antagonismo de culturas, o conflito romântico, as peripécias cómicas, a relação contrastada entre o casal. Em 1999, Miranda Richardson e Martin Vidnovic cederam voz aos diálogos de Jacqueline Feather & David Seidler, para a versão animada O Rei e Eu, de Richard Rich. Nesse mesmo ano, Steve Meerson & Peter Krikes inspiraram-se no diário primordial de Leonowen, para Anna e o Rei, com Jodie Foster e Chow Yun-Fat dirigidos por Andy Tennant.

VISTORiA

EDUARDO SCHWALBACH

 

Convidado a escrever algumas linhas sobre Eduardo Schwalbach, confesso que me sinto seriamente embaraçado. Em primeiro lugar porque tudo o que eu diga, não poderá exteriorizar nunca duma maneira perfeita o meu sentir e não irá, portanto, além da banalidade e depois porque estou em contradição com os chamados dados biográficos.

E senão vejamos. Dizem que mestre Schwalbach nasceu a 18 de Maio de 1860. Aqui começa a intriga. A aceitar como exacta tal certidão de idade, teria o ilustre comediógrafo quase 57 anos.

Ora, só o desejo de maldizer, a vontade de querer fazer passar um jovem louro, por uma pessoa de cabelos brancos, poderá fazer aceitar aos outros tal afirmativa como verdadeira. Quanto a mim, estou convencido de que nesta questão da idade, anda mulher ciumenta metida no caso e por isso, partindo do princípio de que as pessoas têm os anos que aparentam, considero Eduardo Schwalbach um eterno jovem e não se suponha que tenho razões especiais para o considerar como tal.

Sem entrar em detalhes de apreciação sobre a sua obra literária que é vastíssima, se encararmos o seu autor nos diversos aspectos de romancista, comediógrafo, jornalista e conferente mas cingindo-me apenas à sua obra teatral, que superior talento é preciso para, ao mesmo tempo e sempre com um brilhantismo invulgar, escrever como ele escreve, fazendo sentir na comédia, rir na revista, e escalpelizar na sátira!

Pois pode, a um homem com tais faculdades, aceitar-se como boa a idade que lhe atribuem? Não, para satisfação de todos nós e para bem do teatro português que ele cultiva com um amor encendrado à sua terra, com uma alegria fresca e sadia que floresce em cada uma das suas frases, com um espírito educativo animado sempre de bondade, de justiça e de perdão, não se limitando a apontar os defeitos, antes procurando demonstrar a maneira de facilmente os remediar. E é tal homem que tem 56 anos? Repito, a certidão de idade é, talvez, d’algum parente.

Seja, porém, como for, o que é facto é que Eduardo Schwalbach é, incontestavelmente, entre nós, o primeiro homem de teatro. O seu nome no cartaz é o melhor réclame que se faz à peça da sua autoria e nunca o público ou o crítico sofre uma desilusão. E não sofre porque tem, de antemão, a certeza de que a peça que vai ver tem, pelo menos, os seguintes requisitos: uma ideia que presidiu à sua confecção e que, em geral, sai da vulgaridade, como sucede no Dia de Juízo, uma técnica impecável como a dos Postiços, a graça genuinamente portuguesa da Bisbilhoteira, uma sentimentalidade capaz de todos nós a sentirmos, como a do seu Poema d’Amor, e finalmente o espírito educativo que preside a todas as suas obras.
Álvaro Lima - Galeria dos Consagrados L01ABR1917 - Jornal dos Teatros

ANUÁRiO

1956 - Ruth Handler, co-fundadora da Mattel, cria a boneca Barbie.

BREVIÁRiO

Parlophone/EMI Music Portugal edita em CD, Lover of Life, Singer of Songs de Freddie Mercury.

Editorial Caminho lança A Canção Popular Portuguesa em Fernando Lopes-Graça; organização de Alexandre Branco Weffort.

Dux edita em CD, Freitas Branco / Lopes-Graça - Symphonic Works pela Baltic Philharmonic Orchestra, Gda’nsk, sob direcção do maestro Mário Mateus.