Estúdio Raposa

Lugar aos Outros 90
III Aniversário

 

INDICATIVO

Recordando amigos, que também são (ou foram) colaboradores do Estúdio Raposa.

MÚSICA

Esta semana, exactamente, no dia 6 de Julho, prefazem-se três anos de existência do Estúdio Raposa. Este espaço, o Lugar aos Outros, não começou nessa altura mas não existiria se não fosse o Estúdio Raposa.
Nele nasceu para dar lugar aos que, como se dizia nas primeiras edições, para dar lugar aos que ainda não chegaram às estrelas.
Em momento de comemorações seria normal ouvir os utentes, no caso os ouvintes e saber o que pensam deste espaço. Não segui esse caminho porque as opiniões estão sobejamente expressas nos comentários produzidos ao longo do tempo e postos à disposição de quem os quiser ler.
Decidi recordar e homenagear os três ouvintes que mais participaram neste projecto, que mais ajudaram, que mais empurraram para que avançasse. Não foi difícil encontrá-los. Experimente o ouvinte que me está a escutar neste momento, escrever na caixa de busca estes três nomes: António Gouveia ou António Melenas, Menina Marota ou Otília Martel e, finalmente Luís Pinto. Perceberá então, a razão da minha escolha.

MÚSICA

A participação do Luís Pinto não se manifesta apenas nos muitos, esclarecidos e construtivos comentários aos programas. Os seus conhecimentos sobre literatura, entre outros...conhecimentos, foram sempre um excelente guia para o meu trabalho e, também, para alguns dos autores lidos. Participa, ainda, noutro espaço do meu mundo internético, no caso a Truca, mas aí, porque escreve com nome sujeito a segredo...não posso referir o seu trabalho.

MÚSICA

António Melenas, de seu nome verdadeiro, António Gouveia é um autor que para além de ter alguns dos seus trabalhos lidos no Lugar aos Outros, era um amigo com quem diariamente contactava para receber dele, apoio, critica e colaboração, na escolha de autores a serem lidos e na forma como eu lia a poesia. Formado em Letras pela respectiva Universidade, os seus conhecimentos técnicos foram, inúmeras vezes de grande utilidade. “Oh, Gouveia diz lá como se pronúncia esta palavra ou isto está correcto? E, ainda, quantas vezes, ouve lá isto e dá-me a tua opinião.”
O António, personagem bem conhecida na blogosfera, deixou-nos há poucos meses e vou recordá-lo, hoje, recitando, três dos seus poemas. Em primeiro lugar: Quando estiveres triste

MÚSICA

Quando estiveres triste,
Amor,
e não souberes porquê ...

E o mundo inteiro
à tua volta pareça desabar ...

Quando
te apetecer gritar ...

Quando
inexplicavelmente só
te sintas
em meio à multidão

e, perdida,
não saibas que fazer ...

Quando
te sentires vazia
como um balão furado,
amarfanhada
como um vestido
de baile
após o Carnaval ...

Quando
estiveres confusa,
indecisa,
angustiada,
como, sem mo dizeres,
eu sei que estás, por vezes...

Então, Amor
basta que venhas
junto a mim
e no meu peito
confiadamente
repouses tua fronte.
para eu conhecer toda a tristeza
que os teus olhos mudos
me dirão.

Não te farei perguntas
nem direi
as palavras idiotas
que, longe de ajudar,
só ferem, nessa altura.

Apenas te prenderei
pela cintura
e em silêncio,
longamente,
afagarei os teus cabelos,

até que a angústia
de todo te abandone
e não te sintas só,

porque eu estou contigo
sempre,
meu Amor.

MÚSICA

No espaço onde ainda estão disponíveis muitos dos seus trabalhos, a anteceder este poema que vamos ouvir de seguida, António Melenas, escreveu o seguinte texto:

Maria foi a minha primeira namorada. Não deu certo. Ainda hoje não sei bem porquê.
Os pais mudaram-se para outra cidade e nunca mais nos vimos, nem dela tive notícias desde 1952. Mas nunca a esqueci. A primeira namorada nunca se esquece. Garantiram-me há tempos que tinha morrido.
Fiquei imensamente triste, claro, e em sua memória compus este soneto.
Afinal, parece que a notícia não era verdadeira. Parece, pois dela continuo sem nada saber. Sei apenas que, se for viva, será uma velhinha como eu, pois terá agora (2007) à volta de 77 anos
O Poema, porém, é verdadeiro e verdadeiro permanecerá. Para além de nós.

MÚSICA

Partiste (e contigo ainda sonhava)
Para a viagem final e sem retorno...
Ficou mais feio o mundo, sem o adorno
Que o teu formoso rosto lhe emprestava

E assim perdi de vez qualquer esperança
De poder vir um dia a encontrar-te.
Agora, só me resta recordar-te
Com magoados olhos da lembrança.

Mas logo que escurece e morre o dia,
Me deito e adormeço, por magia,
Tu chegas tão real junto do meu leito,

Que embarco na ilusão, ao acordar,
De que só morrerás se eu te matar
Um dia, bem no fundo do meu peito

MÚSICA

E agora, o último poema de António Gouveia, o Melenas, nesta singela homenagem que lhe presto ao comemorar o terceiro ano do Estúdio Raposa, podcast para o qual deu muito do seu saber acompanhado, sempre, de uma amizade que perdura para além da partida.
“Meu tesouro de sonho” é o título do poema que vamos ouvir.

MÚSICA

Meu tesouro de sonho
desperdicei-o
antes de te “achar”.
Nem palácios dourados
nem torres de marfim
nem sóis
nem luas
tenho p’ra te dar...
O legado de séculos
Que em menino herdei
por longos caminhos
sem rumo
sem norte
perdido deixei...

Mas em troca, Amor,
Achei a Verdade da vida.
O choro
o riso
o dia a dia,
toda a força contida
no fundo da Dor.

Pois, Amiga,
na doçura
do meu beijo,
no ardor do meu desejo,
no calor
desta amizade,
inteira,
pura,
sem restrições.
É tua essa Verdade

MÚSICA

Menina Marota é a terceira pessoa que estou a homenagear neste aniversário do Estúdio Raposa.
No início do Lugar aos Outros, era possível sugerir a leitura de trabalhos, propostos por amigos dos autores. Foi por indicação de uma sua admiradora que a Otília Martel, conhecida na blogosfera por Menina Marota, chegou ao Estúdio Raposa. Li trabalhos dela e foi, como se costuma dizer, amor à primeira vista. Apaixonei-me pelo seu trabalho e ela pelo projecto Lugar aos Outros dado que já vinha há algum tempo a divulgar poesia de outros autores num blogue, especialmente criado para esse efeito, intitulado Poesia Portuguesa.
Foi inestimável a sua colaboração. Para além, de procurar autores, sempre ofereceu, com grande entusiasmo, os seus conhecimentos sobre literatura para ajudar aqui, comentar acolá.

MÚSICA

Otília Martel, acabou de lançar, no Porto no passado dia 15 de Junho o seu primeiro livro que inclui poesia e prosa, intitulado “Menina Marota, um desnudar de Alma”.
Obra que será apresentada, em Lisboa, no próximo dia 18, às 18 horas na Livraria Bertrand do Vasco da Gama, no Parque das Nações. Vai ser a grande oportunidade de conhecer, pessoalmente, uma poetisa que, durante muitos anos se escondeu por detrás de um pseudónimo deveras curioso.
Tenho a certeza de que os seus admiradores da região de Lisboa não vão faltar ao encontro. Eu não falto, de certeza. No próximo dia 18, às 18 hora na Livraria Bertrand do Vasco da Gama.

MÚSICA

E é exactamente do livro de Otíla Martel que vou ler três poemas, sem interrupção. Títulos: , “Cálida”, “Sonhos” e “Volúpia”

MÚSICA

Cálida,
a noite vem nos teus olhos
quando a lua se descobre
e a promessa dos teus beijos
me estremece.

As tuas mãos,
que não tocaram meu corpo nestes dias sem tempo,
viajam no sonho e nas palavras,
florescendo no corpo húmido que se agita no desejo.

Desvendo os sons sentidos no silêncio
e neles quebro meu olhar que se espraia no horizonte,
como nuvem em dia de chuva.

Embalo-me como estrela cadente
ritmada em suave toque,
onde te imagino
percorrendo-me, gota a gota,
sorvida calidamente no desejo dos
teus lábios sôfregos,
que circulam em cada pedaço da
[minha pele ... ]

És.
Sou.
Imaginação
e
Fim.

MÚSICA

Sonho-te
que sonhando-me
sonhas-me,
em teus braços,
mil beijos
sussurrados

Sonho-te
e sonhando-me
amo-te
no rasgar da pele
buscando
carícias longas
entregando-me

Sonho-te
no abraço incontida
corpo entregue
vencido
em noites de vendaval

E esse perfume errante
- seiva quente -
dá vida, dá alento
mesmo não passando
de ilusão,
que se desfaz em nada,
tal qual nuvem
em tarde de Verão.

Sonho-te
que sonhando-me
sonhas-me ...

amando-te ...

MÚSICA

Fecho os olhos e
ousadamente
os meus lábios
tecem o teu corpo
na volúpia da tua pele.
As minhas mãos percorrem
calmamente, sem pressa,
em carícias incontidas
em desejos refreados
de mulher-fêmea que
se solta nos teus braços.

Um instante abrasador
de loucura.
Nossas peles colam-se
suadas,
frementes
num amor arrebatado
que já não conseguimos conter.

Chuva fina de amor em exaustão -
limites para além da nossa paixão -
eu me dou no teu corpo vivido
bebes-me
sugas-me
a alma dentro do sentimento
em lençóis vermelhos para lá da imaginação.

Sem medos nem pudor
nossos corpos conhecem o caminho ...

MÚSICA

O programa de hoje, uma comemoração dos três anos do Estúdio Raposa, foi preenchido com uma pequena homenagem a três participantes frequentes, a três amigos, dos quais, um, o António, já não está entre nós. Um obrigado, também, como não podia deixar de ser, a todos os autores que enviaram os seus trabalhos e a todos os ouvintes que foram deixando os seus comentários, todos, felizmente, favoráveis a este trabalho.
Até ao próximo programa.

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