Estúdio Raposa

Poesia Erótica 29
Menina Marota - Um desnudar de Alma

 

INDICATIVO

Cada um de nós constrói o seu próprio conceito do que é pornografia e do que é erotismo, de acordo com a sua sensibilidade. Cada um de nós estabelecerá as fronteiras entre um e outro território. O que para uns não passará de um acto pornográfico, para outros trata-se-à do mais puro erotismo, com as respectivas condenações ou absolvições.
Otília Martel (conhecida na blogosfera por Menina Marota) não permite, com a sua poesia, grandes divergências de opinião. As suas palavras transformadas em poema, não oferecerão qualquer dúvida sobre o terreno que pisa: puro erotismo.

MÚSICA

Há muito conhecida na blogosfera pelo seu trabalho poético mas também pela divulgação que faz da poesia portuguesa, a Menina Marota só recentemente levou aos escaparates um livro de poemas. Lançado no Porto no dia 15 de Junho e apresentado em Lisboa a 18 de Julho, Menina Marota - um desnudar de alma, tal é o título do seu livro, editado pela Papiro, contém poemas de escaldante pendor erótico que, no programa de hoje, se recorda.

MÚSICA

O prof. Fernando Peixoto, no prefácio que escreve no livro de poesia de Otília Martel, diz a certa altura:
Só os criadores têm o raro condão de fundir num todo lógico e concreto as abstractas dimensões do tempo. Eles vivem o tempo real, aquele em que as horas se sucedem num ritmo cadenciado e imutável, mas transcendem-no, inventando um outro tempo: o tempo da criação onde o verbo alcança o prazer da descoberta.
Não se espere, desta poesia intimista e por vezes mesmo erótica, um olhar egocêntrico sobre prazeres e dores, sobre anseios e frustrações, sobre encobertos narcisismos ou encobertas mágoas.
Se há de tudo isso nesta obra, há também, essencialmente, um desnudar premeditado, de quem sabe que a arte de se expor não passa pelo relato mais ou menos próximo da realidade.
Otília Martel, sabe, como Gustave Flaubert, que «a aplicação excessivamente exacta da Verdade prejudica a Beleza, e a preocupação com a Beleza impede a Verdade. Contudo, sem ideal não há Verdade».

MÚSICA

De Otília Martel, e retirados do seu livro Menina Marota - um desnudar de alma - vamos ouvir 4 poemas e um texto poético. Espero que goste tanto deles como prazer tive ao tranformá-los em sons.

MÚSICA

Deixo-me embalar pela música.
Fecho os olhos e sinto
o teu rosto mergulhar nas ondas do meu
cabelo.

As tuas mãos como plumas
percorrendo meu corpo.
Encostas-me à janela
e pressionas o teu corpo no meu.

Sinto uma volúpia quente
subir e fundir-se em mim.
Uma a uma, as peças vão desaparecendo
e eu estou ali,
nua, faminta, com as ondas
do meu corpo a chamarem-te ...

E tu vens, qual trovão em dias de
tempestade.
Para lá da janela, nada mais existe.
Somos nós, um só corpo
possuídos pelo mesmo desejo:
Amar ...

MÚSICA

Sonho-te
que sonhando-me
sonhas-me,
em teus braços,
mil beijos sussurrados

Sonho-te
e sonhando-me
amo-te
no rasgar da pele
buscando
carícias longas
entregando-me

Sonho-te
no abraço incontido
corpo entregue
vencido
em noites de vendaval

E esse perfume errante
- seiva quente -
dá vida, dá alento
mesmo não passando
de ilusão,
que se desfaz em nada,
tal qual nuvem
em tarde de Verão.

Sonho-te
que sonhando-me
sonhas-me ...
amando-te ...

MÚSICA

Não me apetece dizer o que penso,
o que sinto, o que sou.
Não me apetece dizer-te
para onde vou, onde estou
o que senti.

Não me apetece manifestar meus afectos,
meus carinhos, pedir um beijo,
roçar teu corpo em mil desejos ...

Não me apetece dizer
quantos orgasmos tive,
quando me possuías loucamente.

Não me apetece dizer o que sinto
quando o frenesim da tua boca
roça as minhas coxas
e me deixas louca de tesão.

Não me apetece!
E apetece-me tudo ...

MÚSICA

Fecho os olhos e
ousadamente
os meus lábios
tecem o teu corpo
na volúpia da tua pele.

As minhas mãos percorrem
calmamente,
sem pressa,
em carícias incontidas
em desejos refreados
de mulher-fêmea que
se solta nos teus braços.

Um instante abrasador
de loucura.
Nossas peles colam-se
suadas,
frementes
num amor arrebatado
que já não conseguimos conter.

Chuva fina de amor em exaustão -
limites para além da nossa paixão -
eu me dou no teu corpo vivido
bebes-me
sugas-me
a alma dentro do sentimento
em lençóis vermelhos para lá da imaginação.

Sem medos nem pudor
nossos corpos conhecem o caminho ...

MÚSICA

Sinto a água morna escorrer-me no corpo.
Fecho os olhos, encosto a palma das mãos à parede molhada e estico os braços...
É uma sensação agradável, sentir a água escorrer pelos cabelos, perdendo-se corpo abaixo...
Fecho lentamente a torneira, enquanto o meu perfil transparece no grande espelho ao fundo da parede.
Miro-me de olhos semi-cerrados. O meu corpo brilha, envolto ainda, em pequenos pontos líquidos.
Olho de alto a baixo, o meu corpo nu e molhado. Sorrio. Nem sei porquê. Envolta no toalhão branco, esfrego docemente o leite corporal.
Que sensação estranha...Sinto o peito firme, como rocha, num corpo de garota adormecida...
Seco rapidamente o cabelo, rebelde nos seus caracóis loiros...
Num ímpeto entro no quarto e procuro na gaveta umas meias de seda pretas.
Sinto a maciez da pele, enquanto procuro, com o olhar, o fato que vou vestir.
Sinto-me como estando em metempsicose. Muito lentamente visto-me, reflectindo a imagem no espelho.
Numa mágica de mãos, apanho o cabelo e, prendo-o duma só vez, tornando a nuca mais vísivel...
Sinto-me neste instante, novamente Eu...
Mulher inteira, apaixonada, quente, louca por um toque, por uma carícia...
Há quanto tempo, meu Deus, o meu corpo não é tocado...sinto-me tremer de desejo... e nisto, uma voz surpreende-me:
- Então, amor, demoras muito tempo a descer? Que estás a fazer?
Num instante, volto à realidade! Retiro a roupa do corpo, envergo uma saia de bombazina preta, a minha camisola preferida de lã poveira, as botas rasas de camurça e solto num toque o cabelo, que me cai revolto, nos ombros...
Olho a imagem no espelho que me sorri maliciosamente!
Retribuo o sorriso!
Voltei a ser o outro Eu...
Uma mulher sem corpo, sem desejos, sem carícias... mas com uma missão por cumprir.
Desço lentamente, ao encontro da voz que me chama... sorrio com um carinho muito especial para os olhos que indagam a minha demora...
- Já estou aqui.
Vês? Não demorei nada... foi um banho rápido!

(Nota posterior, não gravada: este texto não faz parte do livro "Menina Marota - Um desnudar de alma. Foi retirado do blogue Menina Marota.)
MÚSICA

Ouvimos, no programa de hoje, quatro poemas e um texto de Otília Martel, retirados do seu livro, recentemente lançado. “Menina Marota - um desnudar de alma".
Até ao próximo programa.

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