Estúdio Raposa

Palavras de Ouro143
Luís de Camões

 

INDICATIVO

Luís de Camões volta a emprestar-me as suas palavras para mais um Palavras de Ouro. Não será arriscado dizer que, para muitos Portugueses, referir a obra de Luís de Camões será recordar, apenas, os Lusíadas.
Camões, porém, tem outras obras: “Auto dos Anfitriões” e “Auto do Filodemo” publicadas em 1587, “Rimas” em 1595 e “Auto de el-Rei Seleuco”, publicado em 1645. É desse trabalho, para além dos “Lusíadas” que vamos ouvir alguma poesia, nomeadamente cinco dos seus sonetos de amor.
Entretanto, alguns dados biográficos de Luís de Camões. Nunca será de mais repetir o essencial da sua biografia.

MÚSICA

São escassos os dados biográficos conhecidos sobre o poeta Luís Vaz de Camões, expoente maior da cultura e literatura portuguesas. De ascendência provavelmente nobre e galega, pouco se sabe sobre a sua
vivência em Lisboa, junto da corte, onde cedo se tornou célebre pelos seus dons poéticos, bem como pela sua audácia amorosa, supondo-se que tenha cortejado algumas ilustres damas do paço. De concreto, está documentada a participação numa expedição militar ao norte de África,
entre cerca de 1549 e 1551, bem como a sua prisão, em 1552, na sequência de uma rixa com um criado régio. Depois de um ano de encarceramento, com a garantia do perdão da pena, parte para a índia, na armada comandada por Fernão Álvares Cabral. Da sua estada em Goa, há informações autobiográficas que atestam ter participado em expedições militares e ter tido, também aí, uma vida desafortunada, criticando amargamente em “terra madrasta de homens honrados".

MÚSICA

Ainda da permanência no Oriente, onde sofreu o naufrágio que terá supostamente vitimado uma sua amada, Dinamene, é de crer que tenha
estado em Macau, onde se presume tenha escrito uma parte de “Os Lusíadas” e alguns dos seus mais pungentes sonetos. Em 1569 parte de Moçambique para Lisboa, onde, segundo Diogo do Couto, conheceu, em Moçambique, uma existência precária.
Em Lisboa, obtém licença para a impressão de “Os Lusíadas”. Embora D. Sebastião tenha chegado a autorizar a atribuição de uma tença ao poeta, Camões viveu miseravelmente os seus últimos anos de vida.

MÚSICA

O inexaurível legado literário que nos deixou constitui um dos mais preciosos tesouros da literatura portuguesa. No domínio da poesia lírica, a obra de Camões só começou a ser divulgada no fim do século XVI, com a publicação póstuma de Rimas. Esse conjunto poético diversificado revela a coexistência, na sua lírica, de uma vertente tradicional, de inspiração trovadoresca e cortesã, de temática amorosa e satírica,
desenvolvida em moldes como o vilancete, a esparsa, a trova ou a glosa; e de uma vertente clássica, de inspiração renascentista, onde a influência italiana, sobretudo petrarquista, é superada pela expressão subjetiva e maneirista de temas como o desengano e o desconcerto do mundo, o desejo e o sofrimento amoroso, o desterro ou a saudade, em moldes renascentistas, como o soneto, a écloga, a elegia ou a canção. Camões cultivou ainda o género dramático, como autor de autos, merecendo um lugar relevante na história do teatro clássico português. Mas o género clássico mais nobre recriado por Camões foi a epopeia, em Os Lusíadas [1572], onde, ao longo de dez cantos, adapta a matriz das epopeias greco-latinas [Eneida, Ilíada, Odisseia] ao tratamento de um tema nacional: a exaltação da gesta dos Descobrimentos, como ponto de chegada da História de Portugal, tendo como enredo central a viagem de Vasco da Gama até à índia.

MÚSICA

Vamos ouvir cinco sonetos de Luís de Camões.

MÚSICA

O fogo que na branda cera ardia,
Vendo o rosto gentil, que eu na alma vejo,
Se acendeu de outro fogo do desejo
Por alcançar a luz que vence o dia.

Como de dois ardores se incendia,
Da grande impaciência fez despejo,
E, remetendo com furor sobejo,
Vos foi beijar na parte onde se via.

Ditosa aquela flama que se atreve
A apagar seus ardores e tormentos
Na vista a quem o sol temores deve!

Namoram-se, Senhora, os Elementos
De vós, e queima o fogo aquela neve
Que queima corações e pensamentos.

MÚSICA

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois com ele tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
Que como o acidente em seu sujeito,
Assim co'a alma minha se conforma,

Está no pensamento como ideia;
E o vivo e puro amor de que sou feito,
Como a matéria simples busca a forma.

MÚSICA

Está-se a Primavera trasladando
Em vossa vista deleitosa e honesta;
Nas belas faces, e na boca e testa,
Cecéns, rosas, e cravos debuxando.

De sorte, vosso gesto matizando,
Natura quanto pode manifesta,
Que o monte, o campo, o rio, e a floresta,
Se estão de vós, Senhora, namorando.

Se agora não quereis que quem vos ama
Possa colher o fruto destas flores,
Perderão toda a graça os vossos olhos.

Porque pouco aproveita, linda Dama,
Que semeasse o Amor em vós amores,
Se vossa condição produz abrolhos.

MÚSICA

Eu cantarei de amor tão docemente,
Por uns termos em si tão concertados,
Que dois mil acidentes namorados
Faça sentir ao peito que não sente.

Farei que Amor a todos avivente,
Pintando mil segredos delicados,
Brandas iras, suspiros magoados,
Temerosa ousadia, e pena, ausente.

Também, Senhora, do desprezo honesto
De vossa vista branda e rigorosa,
Contentar-me-ei dizendo a menor parte.

Porém para cantar de vosso gesto
A composição alta e milagrosa,
Aqui falta saber, engenho e arte.

MÚSICA

Quem vê, Senhora, claro e manifesto
O lindo ser de vossos olhos belos,
Se não perder a vista só com vê-los,
Já não paga o que deve a vosso gesto.

Este me parecia preço honesto;
Mas eu, por de vantagem merecê-los,
Dei mais a vida e alma por querê-los;
Donde já me não fica mais de resto.

Assim que Alma, que vida, que esperança,
E que quanto for meu, é tudo vosso:
Mas de tudo o interesse eu só o levo.

Porque é tamanha bem-aventurança
O dar-vos quanto tenho, e quanto posso,
Que quanto mais vos pago, mais vos devo.

MÚSICA

Ouvimos no programa de hoje, palavras de ouro de Luís de Camões.

MÚSICA

Dois dedos de conversa

INDICATIVO
Algumas palavras, apenas para dizer que durante o mês de Agosto, não haverá atualizações de programas no Estúdio Raposa, pelo que as “Palavras de Ouro” só voltarão em Setembro. Entretanto, os ouvintes de sempre, com 388 programas, 3 audiobooks e 7 horas de poesia, têm muito por onde escolher. Boas férias.

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