Estúdio Raposa

Lugar aos Outros 98
António Cruz

 

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No programa de hoje ouviremos poesia de António Cruz

MÚSICA

Não é fácil falar de António Cruz pela simples razão de que se trata de um autor que se dedica a várias actividades, nomeadamente como actor em novelas, teatro, opera, colaboração em jornais e publicidade.
É, porém, no turismo que exerce a sua profissão, tendo-se licenciado nesta área em 1984. A actividade turística levou-o ao Brasil e à República Dominicana tendo por fim cedido ao apelo das ilhas, escolhendo a Madeira como um “lugar com qualidade de vida”.

MÚSICA

Depois da publicação de "Lugares" em 2003, de "Momentos" e "Histórias da minha filha" em 2005, de "Intimidades" e "Vidas (e pedaços do mundo)" e "Sopa de Letras" em 2006, António Cruz apresenta uma nova faceta do seu trajecto literário com um livro de contos com o título "Personagens (ir)reais para contos inventados", lançado em 2007. Ainda em 2007, e com a colaboração de cinco escolas do concelho de Machico, publica mais um belo livro infantil intitulado "A estrela do céu que caiu no mar".
Já em 2008 publica um livro de poemas intitulado “Palavras Ousadas”, e outro de crónicas intitulado “Crónicas da Sexta”
Desde 2006, António Cruz deambula incansavelmente pelas escolas da Madeira, e algumas do continente, para contar sonhos à pequenada e ajudá-las a melhor perceberem o universo das palavras e dos livros que as abraçam - palavras suas.
Participa permanentemente em projectos vários como o "Baú de leitura", as "Histórias a várias mãos", semanas culturais, dias de autor e feiras do livro.

MÚSICA

Entre o final de 2007 e o decorrer do ano de 2008, António Cruz desbrava um novo caminho no seu percurso de experiências e públicos reconhecimentos: o de letrista para canções, sejam infantis ou outras, participando com algumas delas em vários concursos.
António Cruz marca ainda presença em várias antologias poéticas publicadas em Portugal, Itália e Brasil, tendo sido galardoado pelas edições Clube Amigos das Letras (São Paulo) e premiado pelas Edições Arnaldo Giraldo (também de São Paulo) como vencedor na área da Poesia entre mais de 2500 trabalhos de concorrentes de doze países. Recebe uma Menção Honrosa no V Concurso Literário de Santa Maria Maior em 2007 e, .em 2008, na VI edição do mesmo concurso arrecada o 2° lugar. É membro da Sociedade Portuguesa de Autores.

MÚSICA

Quando se procura conhecer o motivo pelo qual alguém de dedica à escrita não há nada melhor do que ouvi-lo da boca de quem escreve sobretudo se o fizer num poema. Foi o que fez António Cruz:
“Escrevo
porque preciso de
escrever,
de sentir rios a passar,
de ver nuvens a
voar,
descrever um céu azul,
navegar por entre
o mar.

Escrevo
porque me alimento de
letras,
das ilusões que nelas crio,
nos sonhos que com elas
sonho,
nas vidas que desejei,
e noutras em que
amei.

Escrevo
com palavras que são minhas
delírios inconfessados,
desejos de sempre
guardados
imagens que passam
por mim
num caminho que não tem fim.

Escrevo
apenas pelo escrever,
por devaneios sem sentido
por um momento vivido
pela vida ou pelo amor pelo amor
que trago comigo.

Escrevo
para mim ou não importa quem
por palavras, por desenhos,
por perfumes e por cores,
palavras que querem
bem,
palavras apenas minhas,
mas que são de todos também.

MÚSICA

Vamos ouvir, sem interrupção 4 poemas de António Cruz: “A cor do amor”,
“Ambiguidades”, “Beijo salgado” e “Labirinto”

MÚSICA

Desafiaram-me um dia
A colorir o amor
Com as tintas que quisesse
E que lhe desse uma cor.
Deambulei pelo céu
E p'los tons azuis do mar
Perguntando a um e outro
Se eram as cores do amar.
Por entre lua e sol
Descobri brancos, amarelos,
Enternecendo-me com ambos
Brilhares de amores singelos
Calcorreei caminhos
Na busca de uma cor
Procurando o segredo
De tanto prazer e dor
Naquela procura incessante
Tropecei no verde e castanho
Respondendo-me os dois
Que o amor não lhes era estranho
Colhi pétalas em rosa,
Em vermelhos e lilases
Sentindo na sua alma
De que amar eram capazes.
Por entre pretos e laranjas
Tonalidades de cinzento
Aceitei que o amor
Era cor de sentimento.
Para afinal concluir
Que o amor era pintado
Por todas as cores do mundo
Que se tivessem amado

MÚSICA

Vestem-se de ambiguidades
As palavras que escrevemos
Disfarçando-se de vontades
Que só nós é que sabemos

Mudam de cor, ou de sentido,
De género e intenção
Soando ao nosso ouvido
Em função de uma razão

Podem ser lidas de frente
Interpretadas por trás
Apenas sabendo a gente
Do que cada é capaz

Ficam errantes e a pairar
Mudando de forma, significado
Para as podermos moldar
Num sujeito ou predicado

Imaginamos adjectivos
Pronomes que são pessoais
Que afinal são substantivos
Mascarados por sinais

E no final da leitura
Retira-se a sua essência
Encontrando em cada procura
A mais pura evidência

MÚSICA

Levo na boca
todos os mares
da Terra
nesse beijo salgado
que nos procura.
Beijo que desperta
tormentas e
doma as vontades
que crescem em nós,
invocador
dos Adamastores
que vivem cá dentro
aguardando
o momento
da evasão.
Esse beijo
de sal que
faz rodopiar os
nossos vultos
tatuados pelos
grãos de areia que se
agarram
ao nosso desejo.
Tempestades que
se esvanecem no
mar agora sossegado
beijando os corpos esgotados
com o seu beijo salgado.
Na nossa praia inventada.

MÚSICA

Sou arquitecto
do meu próprio
labirinto.
Desenho caminhos
traçados por um querer
orquestrado no desejo.
Em palavras que
reinvento apenas
para complicar os
caminhos do meu
labirinto.
Seduzo, (en)canto, engano
com a mestria de
um vagabundo sem vergonha,
sorrindo a um olhar,
sonhando a um passar,
mendigando uma noite de luxúria,
estendendo a mão à esmola
de um corpo que se me entrega,
vomitando frases
consistentes,
convincentes.
Existência suicida
tecida nas teias das
mil relações inconcebíveis.
Ardentemente desejadas!
Posteriormente amaldiçoadas!
Maldito o verme que
me consome as defesas
do desejo!
Malditas as palavras
que me saem em borbotões
de conquistador letrado!
Maldito o labirinto que
conscientemente
construo para me perder.

MÚSICA

No Lugar aos Outros de hoje, ouvimos poesia de António Cruz a quem agradeço a disponibilidade. Este programa “Lugar aos Outros”, que tem o número 89, é colocado on line no dia 31 de Dezembro. Dentro de poucas horas muitos de nós vão comemorar a passagem a 2009.
Um 2009 o melhor possível para todos

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