Estúdio Raposa

História 82
O criado do estrujeitante

 

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Hoje, vamos ouvir uma história que tem um título muito estranho. Aqui vai ele: “O criado do estrujeitante”. E o que vem a ser um estrujeitante? Ora, um estrujeitante ou estrejeitante é uma palavra antiga, usada no Minho e que quer dizer mágico, bruxo, feiticeiro, especialmente aqueles que são mestres em transformar coisas em pessoas ou pessoas em coisas ou animais.
Assim, a história de hoje tem estrujeitantes pelo meio.

MÚSICA

Era uma vez um rapaz que foi procurar emprego. Chegou a uma casa onde lhe perguntaram se ele sabia ler e, tendo ele respondido que sim, disseram-lhe que o não queriam. Foi a outra casa e, tendo-lhe feito a mesma pergunta, respondeu que não e lá aceitaram-no. O amo dele era um estrujeitante - cá está a palavras difícil. O patrão do rapaz, um estrujeitante, de noite escrevia e o rapaz ia vendo o que ele escrevia sem que ele o suspeitasse.
Foi o amo uma ocasião para fora de casa e o rapaz leu-lhe todos os livros mágicos por onde aprendeu a estrujeitar e foi depois disso para casa dos pais. Quando a mãe o viu, disse-lhe: «Ai, filho, tu vens tão magro!»
Respondeu ele: «Deixe-se estar, que eu ainda hei-de engordar. Eu vou fazer-me em galgo e o pai leva-me à feira preso por uma fita, mas não venda a fita; traga-a, senão vende-me a mim.»
Foi à feira feito em galgo; juntaram-se muitos caçadores e compraram o galgo; queriam também comprar a fita, mas o pai não a vendeu e meteu-a no bolso.
Chegaram os caçadores que compraram o galgo a um monte e apareceu-lhes uma lebre; soltaram-lhe os cães todos mais o galgo; o galgo passou por um outeirinho, desaparecendo da vista dos caçadores, fez-se em homem e seguiu para os caçadores, que lhe perguntaram: «Ó homenzinho, viu passar por aqui um galgo?»
«Vi, vai aí adiante e tem pernas de prata.» disse o homem que era o rapaz
«Custou-nos tantas moedas.» - disseram os caçadores
“Ora, façam a tenção que elas foram como dadas.»
Chegou o rapaz a casa e disse-lhe o pai: «Ó filhinho, tu tardaste tanto!» «Escute, meu pai, que eu já andei à lebre. Amanhã há outra feira e eu hei-de ir lá fingido num cavalo; venda o cavalo caro, mas não venda o freio, senão vende-me a mim.»
Foi o pai à feira; mas estava lá o antigo patrão que conheceu o rapaz no cavalo e o comprou por todo o dinheiro, teimando em levar o freio; juntou-se muita gente que teimava que ele tinha comprado freio e o cavalo, de modo que o pai não teve remédio senão deixar ir também o freio.
O amo entregou o cavalo a um criado e, apontando-lhe para uma certa fonte, disse-lhe: «Tu não me deixes chegar o cavalo àquela fonte, senão eu mato-te.»
Não passava ninguém ao pé que não gabasse o cavalo; o cavalo queria beber, saltava muito e todos pediam ao criado que deixasse ir beber tão lindo animal. O cavalo, assim que apanhou o criado descuidado, saltou por cima dele e foi para a fonte e fingiu-se num peixe e meteu-se pela fonte dentro. Chegou o amo e, não vendo o cavalo, ficou muito zangado; ralhou muito com o criado; juntou-se gente que disse ao mágico: «Ele não teve culpa, senhor, porque o cavalo saltou por cima dele, fez-se num peixe e meteu~se pela fonte dentro.»
Nisto o estrujeitante fingiu-se numa lontra; meteu-se pela fonte dentro para comer o peixe; o peixe fingiu-se numa pomba e fugiu; a lontra fingiu-se num milhafre para comer a pomba; quando o milhafre ia quase a apanhar a pomba, ela viu umas senhoras numa janela, fez-se numa maçã e caiu na saia de uma das senhoras. O milhafre fez-se em homem e começou a pedir a maçã às senhoras. Elas disseram-lhe que não lha davam, que aquela maçã tinha caído do céu. Então o homem disse para elas: «Oh, minhas senhoras, dêem-me essa maçã, que eu morro se não ma derem.» E pôs-se a chorar e tanto pediu que elas iam a dar-lha; nisto a maçã fingiu-se em grãos de milho e caiu-lhe de entre as mãos.
O estrujeitante fingiu-se numa galinha de pintos para comer o milho e o milho juntou-se muito juntinho e transformou-se numa raposa, que comeu a galinha e os pintos. Depois disto fez-se em homem e foi para casa. Disse-lhe o pai: «Ai, filho, que te demoraste tanto!» «Olhe, meu pai: você podia ficar rico, mas mil forças que eu tivesse, poucas eram para ralhar consigo, porque você pela sua fraqueza de vender o freio foi a causa de eu ver a morte muitas vezes ao pé de mim.»
E assim, com um ralhete ao pai descuidado, acaba a história.

MÚSICA

Acabámos de ouvir a história do “Criado do Estrujeitante”. Para a semana há mais.

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