Estúdio Raposa

História 64
"O Castelo de Faria"

 

INDICATIVO

Vamos ouvir hoje, uma história muito bonita do tempo dos primeiros reis de Portugal, uma história do tempo de D. Fernando I que nasceu há muito tempo. Se querem saber há quantos anos, aqui vai: D. Fernando nasceu em Lisboa há 663 e era filho de D. Pedro e de D. Constança.
Vamos, pois ouvir uma história que tem muito a ver com este rei de Portugal

MÚSICA

Castelo de Faria foi uma fortaleza medieval muito próxima de Barcelos, há longo tempo desaparecida. As pedras das suas muralhas, que juncavam o monte, foram utilizadas para a construção de um convento.
A história que vou agora contar passou-se à sombra das muralhas deste desaparecido castelo e desenrolou-se no tempo do nosso rei D. Fernando. Tudo aconteceu por causa dos seus amores com a bela e ambiciosa Leonor Teles.
Estava D. Fernando para casar com a filha do Rei de Castela quando se apaixonou pela Teles, «a aleivosa», como magistralmente a denominou Fernão Lopes, fazendo seus a voz e o ódio popular. A partir de então descurou por completo o contrato que fizera com Castela quanto ao seu futuro enlace, o que levou o rei do país vizinho, a par de outras razões, a desencadear a guerra. Deste modo Lisboa foi cercada e muitas outras terras assaltadas e assoladas, tal acontecendo também no Minho. E aqui começa a nossa história.

MÚSICA

O adelantado de Galicia, D. Pedro Rodriguez Sarmento, entrou pela província de Entre Douro e Minho com um grosso exército de gente de pé e de cavalo, prendendo, matando e saqueando até às imediações de Barcelos, sem achar quem lhe atalhasse o passo. Aqui, porém, saiu-lhe ao encontro D. Henrique Manuel, conde de Seia e tio d'el-rei D. Fernando, com toda a gente que pôde juntar.
Foi terrível o conflito e os portugueses foram derrotados e desbaratados, caindo alguns em mãos inimigas.
Entre os prisioneiros estava o alcaide-mor do Castelo de Faria, que saíra em auxílio do conde com alguns homens de armas. Nuno Gonçalves era o seu nome. Cativo, pensava o alcaide em como salvar o seu castelo, que o inimigo exigia. Deixara a governá-lo, na sua ausência, um seu filho, e tudo levava a crer que quando aquele o visse a ferros entregaria a fortaleza para que o não matassem. Assim urdiu um estratagema e pediu ao adelantado castelhano que o levasse aos muros do castelo para parlamentar e exortar o filho a entregá-lo sem resistência.
Com um troço de besteiros e de homens de armas subiu a encosta do monte. Nas casinhas que estavam encostadas à barbacã não se via vivalma, pois a população, assim que avistara o inimigo, sumira-se no interior do castelo buscando protecção e refúgio. E aí, no terreiro, debaixo de choupanas de colmo, esperavam que o mundo sossegasse para voltarem aos seus trabalhos.
À vista do grupo que se aproximava, os besteiros e os homens dos engenhos, dentro do castelo, preparavam-se já para fazerem o primeiro lançamento quando um arauto saiu do meio da vanguarda inimiga. Fez-se um silêncio impressionante e profundo, ouvindo-se apenas:
- Moço alcaide, moço alcaide, teu pai, cativo do mui nobre Pedro Rodriguez Sarmento, adelantado de Galicia pelo mui excelente e temido Dom Henrique de Castela, deseja falar contigo de fora do teu castelo!
Gonçalo Nunes, o filho do velho alcaide, atravessou o terreiro e chegando à barbacã disse ao arauto:
- A Virgem proteja meu pai! Vai dizer-lhe que aqui estou! .
Voltou o arauto ao grupo onde vinha Nuno Gonçalves e pouco depois estava este ao pé do filho. Disse-lhe então:
- Sabes tu, Gonçalo Nunes, de quem é este castelo que segundo o regimento de guerra entreguei à tua guarda quando vim em ajuda e socorro do esforçado conde de Seia?
- É de nosso rei e senhor Dom Fernando de Portugal, a quem por ele fizeste preito e menagem.
- Sabes tu, Gonçalo Nunes, que o dever de um alcaide é de nunca entregar, por nenhum caso, o seu castelo a inimigos, embora fique enterrado debaixo das ruínas dele?
- Sei, ó meu pai. - E, baixinho, acrescentou:
- Mas não vedes que a vossa morte é certa se os inimigos percebem que me aconselhaste a resistência, pai!?
Fazendo como se nada tivesse ouvido, Nuno Gonçalves exclamou com voz segura:
- Pois se o sabes, cumpre o teu dever, alcaide do Castelo de Faria! Maldito por mim, sepultado sejas tu no inferno, como Judas o traidor, na hora em que os que me cercam entrarem nesse castelo sem tropeçarem no teu cadáver!
- Morra, morra o que nos atraiçoou! - gritaram os castelhanos enquanto o velho português caía varado por espadas e lanças.
- Defende-te, alcaide! - foram as últimas palavras murmuradas por Nuno Gonçalves.

Como louco, Gonçalo Nunes corria ao longo da barbacã clamando vingança.
Duríssima foi a peleja e terrível o cerco. Dentro dos muros muitos foram os populares mortos, queimados juntamente com as toscas choupanas em que se refugiavam. Mas Gonçalo Nunes lembrava-se da maldição de seu pai, via-o ainda moribundo no meio dos seus matadores e ouvia a todos os instantes o Último grito do bravo Nuno Gonçalves: «Defende-te, alcaide!»
E o orgulhoso castelhano foi obrigado a levantar o cerco, tal a coragem com que o moço se defendia.
Mais tarde, o filho de Nuno Gonçalves, apesar de louvado e premiado pelo seu feito, solicitou a el-Rei a desoneração do cargo de alcaide e trocou as vestes do guerreiro pelas do sacerdote.

MÚSICA

Ouvimos a história “O Castelo de Faria”. O texto que li foi escrito por Fernanda Frazão para a colecção “Lendas Portuguesas” editada pela desaparecida editora “Amigos do Livro”.
Até à próxima história.

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