Estúdio Raposa

História 58
O Doutor Grilo

 

INDICATIVO

Vamos hoje ouvir uma história intitulada o Dr. Grilo. Fui buscá-la à bela edição da Verbo, “Tesouros da Literatura Popular Portuguesa”

MÚSICA

Passava um dia pela ponte de Coimbra um carvoeiro, com um burro carregado de carvão; e viu muitos estudantes que estavam sentados na Ponte comendo bolos, rebuçados e amêndoas; o carvoeiro disse para si: «Para comer coisas tão boas é preciso ser estudante; pois vou-me também fazer estudante.»
Dito e feito. Vendeu o carvão e o burro na cidade, vestiu-se com as sacas do carvão, que eram pretas, e foi-se sentar na ponte a comer côdeas de pão de milho porque o dinheiro não dava para comprar bolos. Os estudantes estranharam o novo colega e perguntaram-lhe.
- Ó caloiro, para que estudas tu? Ao que ele respondeu:
- Estudo para adivinhão.
Tinham-se passado alguns dias depois disto, quando constou que tinham roubado um tesouro ao rei de Portugal, e que ele premiava quem descobrisse o ladrão. Os estudantes foram então dizer ao rei que havia um estudante que estudava para adivinhão. O rei mandou-o logo chamar ao palácio e disse-lhe que queria ver se ele já estava muito adiantando na ciência que estudava. Ora o carvoeiro chamava-se Fulano de Tal e Grilo. O rei chegou-se ao pé dele com a mão direita fechada e perguntou-lhe:
- Que tenho eu nesta mão?
O estudante, aflito por não saber o que havia de responder, deu um ai e disse:
- Ai! Grilo, Grilo, em que mão estás metido!
E então o rei, que ignorava que ele se chamasse Grilo, abriu a mão e disse:
- Adivinhaste; é um grilo que eu aqui tenho.
O rei ficou satisfeito e o estudante ainda mais. Depois o rei, para ver se o estudante ainda adivinhava mais, mandou matar uma porca, encheu um frasco de sangue dela e chegou-se ao estudante e perguntou-lhe:
- De que é este sangue?
Ao que ele por não saber de que era respondeu:
- Aqui agora é que torce a porca o rabo.
O rei respondeu:
- Adivinhaste, é sangue de porca que eu tenho no frasco. E disse-lhe mais o rei:
- Agora dou-te três dias para descobrires os ladrões do meu tesouro.
Espalhou-se pela corte que estava no palácio um adivinhão que ia já descobrir os ladrões do tesouro; e dois dos criados do rei foram-se ter com o estudante e disseram-lhe:
- Dar-vos-emos muito dinheiro se não disserdes ao rei que fomos nós que lhe roubámos o tesouro.
Foi o que o estudante quis ouvir; mandou logo chamar o rei e disse-lhe:
- Saiba Vossa Majestade que dois dos seus criados é que roubaram o
tesouro.
O rei, conhecedor da verdade, mandou prender os criados, e eles restituíram-lhe o tesouro. Disse então o rei ao estudante que o queria premiar muito bem e que se deixasse estar no palácio mais alguns dias. Durante esses dias sucedeu que a princesa, filha do rei, estando a jantar, se lhe atravessou um osso nas goelas. Os médicos do palácio não se atreviam a tirar-lho e o rei foi-se ter com o estudante e disse-lhe que o premiava muito bem se desse remédio à princesa. O estudante mandou então deitar a princesa de bruços no chão, e começou a atirar-lhe bolas de manteiga para cima; a princesa ria-se e tornava a rir, até que lhe saiu o osso das goelas. Então o rei deu grandes somas de dinheiro ao estudante e disse-lhe:
- Já que tanto sabes, ficas nomeado médico do hospital e da minha real casa.
Nesse tempo andava na cidade uma grande epidemia, e o médico foi fazer a sua visita aos doentes. Depois de os ter examinado a todos disse-lhes:
- Àquele que estiver mais doente há-de ser amanhã aberta a barriga para ser examinado.
Os doentes, quando tal ouviram, levantaram-se todos das camas, uns encostados a paus, outros a muletas; foram saindo todos do hospital, e nem já pareciam doentes. Espalhou-se logo pela cidade que o novo médico sabia tanto que só com a sua visita dava saúde aos enfermos. Então o médico ao ouvir isto resolveu-se a ir estudar Medicina, na Universidade; e passado algum tempo tomou capelo e ficou-se chamando o Doutor Grilo.

MÚSICA

Acabámos de ouvir a história do Doutor Grilo, uma história tradicional portuguesa. Espero que tenham gostado, e os vossos pais, também.

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