Histórias da Publicidade 7

 
 


Sem título

Chamei o director de arte com sérios motivos para lhe dar uma bronca .
Nos últimos dias entrava na agência depois das onze.
O sacana era uma pérola como pessoa, mas naquela sexta feira a sua expressão comparava se á casca de uma ostra aberta de véspera, ressequida.
Sentou se na minha frente e forçou me a desviar o nariz um nada para a direita e para baixo. Tresandava. Antes que terminasse de dar me os bons dias o bafo a cerveja azeda esbarrou quente nos meus olhos obrigando me por segundos a cerrar as pálpebras.
O rapaz dos fantásticos lay outs vestia uma camisa totalmente desabotoada e no lugar de cada botão, um buraco ou um rasgão. Alguns vincos nas calças confundiam o tecido com qualquer itinerário complicado para viaturas todo o terreno.
Antes que eu soltasse o primeiro gesto, entrou num murmúrio com voz rouca e que não entendi para de seguida se recostar na cadeira e puxar por um charuto, acendendo o com uma coluna de fumo mas na horizontal, direitinha ao meu rosto.
Lentamente, marcadamente dramático repetiu a frase "não me fodas", duas vezes.
A paciência começava por me escaldar as orelhas quando o director de arte se recostou de novo na cadeira e me pediu para lhe mandar vir um café.
"Se te vais armar em decapante, avisa, caguei a pintura mas não preciso de diluentes".
Ou me acalmava, ou como ele bem sabia, em segundos passaria a fazer parte das estatísticas que nada ajudam ao orçamento de estado com mais um a subsídio de desemprego e uma família em dificuldades e oferecer lhe uma esmola estava fora dos meus planos.
A coisa era mais grave do que me parecia. O seu sobreolho estava azul prússia e por entre a camisa aberta alguns arranhões não davam por autoria irracional já que o rapaz não tinha gatos lá em casa.
Dei lhe a entender que já não suportava mais chamadas do presidente da agência sobre os seus horários e olheiras negligentes.
Mais uma vez, mandou me á merda.
Tentei desesperadamente, com alguma subtileza, rematar a conversa enquanto tomávamos os cafés que eu próprio tinha feito e servido. Eu estava determinado a não perder um director de arte competente e talentoso.
Deixa lá isso homem, Chapa é chapa. Queres que telefone para irem rebocar o teu carro?
Vai á merda! A minha mulher anda a pôr me os cornos há dois meses e hoje apanhei a na cama com um gajo...........

Manuel Peres

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A amarelinha

Ordem de Compra. Um papelucho muito importante nas transacções comerciais e outras a provar que uma entidade encomendou a outra um serviço ou coisa semelhante. Na publicidade, algumas agências (feliz ou infelizmente, nem todas) emitem "ordens de compra" e só depois destas terem chegado ao fornecedor, este pode emitir a factura referente ao trabalho executado.
No meu caso: faço uma locução e só depois de me chegar a tal "ordem" posso emitir a factura.
E tudo isto a propósito de quê? A propósito de, às vezes, este mecanismo de "ordens de compra" dar azo a situações como aquela que se depreende da carta que se segue e que, um dia, tive de enviar a certa agência muito rigorosa nestas coisas, como se verá.

Lisboa,

Exmo. Senhor
Director Administrativo e Financeiro da
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Exmo. Senhor,

Há uns diazitos enviei lhe a minha factura nº 461.
Cometi, porém, uma grande leviandade: não enviei, anexa, a célebre "amarelinha". Do facto me lembrou V. Exa. quando me devolveu a 461 juntamente com o raspanete da praxe ("Conforme já anteriormente comunicado, não aceitamos facturas que não venham acompanhadas da respectiva Ordem de Compra que lhe deu origem cópia amarela".)
Envergonhadíssimo, rebusquei este mundo e o outro à procura da "geminha d´ovo". Nada. De súbito, das profundezas da memória, chegou a lembrança do que tinha sucedido à folhinha. Só que, (que desgraçado eu sou!) não a poderia exibir...por motivos inconfessáveis. Valeu me, na emergência, o facto de, por milagre inexplicável (como todos os milagres), ainda ter em meu poder o original da "amarelinha". Estaria salva a "honra do convento"? Na altura, ingénuo, pensei que sim. Fiz uma fotocópiazinha do originalzinho e voltei a enviar vos a 461.

Dias depois (como é doloroso recordar esse dia!!!) nova carta de V. Exa. Aí vinha devolvida a pobre 461 com a terrível sentença: SEM AMARELA, NADA FEITO!
Não quero aborrecê lo com a enumeração do que me passou pela cabeça diante desta inqualificável leviandade da minha parte! Digo lhe apenas, e para abreviar, (que o tempo de V. Exa. deve ser pouquíssímo) que decidi, contra tudo e contra todos, expor me ao mundo, desvendar o mais íntimo da minha vida, isto é, dizer porque não me é possível (nunca será) enviar lhe a "amarelinha". Faço o na esperança de que o seu bom coração, a sua generosidade, os seus intestinos (como virá a compreender mais adiante) o levem a aceitar a coitadinha da 461!!!.
Aqui vai a verdade nua e crua:
"Era um magnífico fim de tarde. Ficava para trás mais um dia de trabalho fatigante. Nada fazia prever o drama que se avizinhava. Os pinheiros corriam velozes à medida que o meu carrinho avançava . Os pinheiros entram na história porque moro numa alegre casinha no meio do pinhal. De súbito, como saído das alturas, o raio desceu direitinho à minha barriguinha! A dor, horrorosa, ajudou o pé direito a pressiona o travão. Encostei e nesse momento os pinheiros quedaram se. No último instante, e antes de sair do carro, uma réstea de discernimento, fez me levar a mão a um papel amarelo, macio, convidativo, que estava a meu lado, sobre o banco do carro. Omito agora, por puro pudor, o que se seguiu atrás de um pinheiro. A referência feita à barriguinha torna se agora clara, não é? Assim como claro e evidente é o destino do papelinho amarelo, não é?"

Aqui tem, coração nas mãos, o destinho da "cópia amarela".

Depois deste triste episódio (espero que V. Exa., neste momento, esteja de lágrima ao canto do olho) só me resta implorar lhe misericórdia. Consolide o seu merecido lugar no mundo ( no Céu, para ser mais correcto) dos Financeiros concedendo me o seu magnânimo perdão.
BEM HAJA!

Seu, para sempre,

TRUCA Lda.
Luís Gaspar

P.S. Anexo, e pela terceira vez, a 461, a fotocópia do original da OC e mais o própriamente dito. Pelo motivo exposto...nada da "amarelinha"

Luís Gaspar

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 A embalagem para o "chocolate preto"

O meu cliente tinha uma famosa fábrica de chocolates na América do Sul.
Aquele Senhor nascido em Itália, sempre de fato de linho tecido em tear manual vestia uma camisa e gravata, calçava sapatos e fechava aquele traje diariamente com um cinto. Tudo da mesma cor, nem um desvio de tom. O homem parecia uma fada masculina. Durante quinze dias, no seu escritório, á mesma hora encontravamo nos pela manhã, o que me dava a sensação de ele chegar directamente da tinturaria. Ele tinha aquele ar de quem trata o dinheiro com arte e de gastá lo sem se preocupar em contar o troco. Contou me de alguns vícios que adquiriu desde muito novo. Uma governanta sempre jovem, champanhe ao acordar e feijão com arroz uma vez por dia.
O motivo dos encontros devia se a um projecto de embalagem que teria de ser imaginado, mas á sua maneira, o que sobrava, seria desenvolvido por mim, em esboços diários e na sua presença. Nada mau. Não é todos os dias que se consegue trabalhar taco a taco com um presidente multinacional.
Enquanto criávamos as embalagens, uma quantidade absurda de gente entrava com papeladas e saía, sem elas do gabinete, que bem comparado não seria inferior a sete assoalhadas, mas só com quatro paredes. Mas uma coisa eu estranhava. Todas as manhãs o meu cliente recebia uma chamada de Itália e do que discutia por telefone em italiano eu só distinguia a palavra "mama" e de cada vez que a pronunciava encolhia os ombros com ar de desagrado e olhava me como que a querer meter me no assunto.
Numa das manhãs começamos por arrumar os elementos gráficos que sugeri para a embalagem de chocolate preto. A meio, lá tocou o telefone, era de Itália. Terminado o telefonema, obrigou me a desistir da minha proposta que se compunha de fundos pretos, apontamentos de filetagem em prata, tipografias manuscritas em tonalidades cremes, enfim, limpinho mas quase vulgar porque a pachorra começava por me atraiçoar. A mudança que me pedia, estava então relacionada com o tal telefonema. Os fundos passariam a branco e em grande plano, do lado esquerdo da embalagem, entraria uma foto de um bebé lindíssimo, um recém nascido negro e por baixo da marca, em corpo catorze uma frase. "Chocolate integral, preto Fabricado no Brasil."
A minha expressão de espanto deve ter sido tão brusca que o presidente acabaria por me dizer o seguinte.
"Se a embalagem não for assim, a minha mãe não aprova".
Nunca cheguei a conhecer a senhora, mãe do meu cliente. O meu cliente sim, faria naquele ano oitenta e quatro primaveras.

Manuel Peres

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DUAS VIDAS NUM SEGUNDO

São aproximadamente 20h25. Saio de uma reunião como tantas outras que quase todos os dias tenho. Vou para casa à boleia com um amigo da pós graduação de Marketing que frequento todas as semanas. Subimos a avenida Padre Cruz, no Lumiar, caminho que habitualmente tomamos. Uma mota ultrapassa nos com vontade de chegar a algum lado que desconheço e com a maior brevidade possível cenário
comum no quotidiano desenfreado da cidade. Chega o cruzamento... em fracções de segundo, a mota desintegra se, o seu condutor desaparece no ar e vejo uma mulher estendida no chão... inerte... sem vida.

O condutor do carro que passou o sinal encarnado chora, com as mãos na cabeça, incrédulo no que acabava de acontecer. Num segundo, todo um conjunto de Mundos muda para todo o sempre...momentos tidos como certos esvairam se como fumo.

Apodera se de mim uma sensação terrível de tristeza assustada um misto de perda, impotência, mêdo e revolta. Até este dia assisti de braços cruzados e com a apatia insensível própria da banalidade às notícias que inundam todos os dias os meios de comunicação social a anunciar as centenas e milhares de mortos nas estradas portuguesas. Hoje olhei a morte nos olhos a 50 metros de mim, 2 pessoas, um homem e uma mulher, com alegrias por viver e muitas coisas por
descobrir, partiram sem aviso, enquanto piscava os olhos desejando que fosse mentira; e nem uma mão pude estender. Eu não conhecia aquelas pessoas, mas a minha alma chorou...

O que mais me assusta é o total alheamento das pessoas em relação a situações destas que se repetem sem fim grupo no qual me incluia até hoje, confesso. Há sempre justificações irresponsáveis para pequenas transgressões "inofensivas" ou se conhece bem a zona, ou se tem que chegar a horas senão é o fim do Mundo, ou é o carro que tem potência demais para andar tão devagarinho... e agora pergunto de que valem essas justificações para este condutor que, inadvertidamente, passou o sinal encarnado?! E como justificar se perante os dois seres humanos que ficaram sem vida?! E o que dizer as famílias inconsoláveis no seu pranto pasmado?!

No entanto, apesar da revolta perante a estupidez e desnecessidade do sucedido, não consigo, no meio deste nó de angústia, deixar de ter uma enorme compaixão por aquele homem desolado perante o enorme drama que caiu nos seus ombros. Penso no turbilhão de sentimentos de dor aguda que o vão atormentar para o resto da sua vida e fico aflito com a dimensão do choque emocional que sofreu. Não valia mais a pena Ter mais cuidado a conduzir?! Será que custa assim tanto perder uns minutos para ganhar uma vida inteira?! Apercebam se bem da relatividade da nossa existência nesta Terra tudo pode acabar num segundo! Os acontecimentos que relato são verídicos e passaram se hoje. Não vão apenas mudar a vida dos envolvidos, mas também, em certa medida, a minha própria vida. Amanhã e outro dia. Outro dia diferente do que teria sido se não tivesse visto o que vi porque a imagem da tragédia vai permanecer, desfigurada pela erosão do tempo,
mas reavivada pelo sentimento de profunda consternação que não vou esquecer.

Será, com toda a certeza, um dia mais triste... Escrevo este texto para pedir a todos os que me lerem que pensem no que acabei de relatar. Para que não acreditem que estas coisas não vos podem acontecer. Não seremos por certo melhores por conseguir escapar ilesos a riscos, maiores ou menores que sejam, mas sim por respeitarmos o Dom da vida e gozarmos a sua finita benção. Sinto que havia muito mais a dizer, mas não me apetece reviver por mais tempo aqueles breves segundos trágicos que me aparecem desfocados à medida que vou escrevendo.
Custa me pensar que podia ser eu, por muito egoista que este pensamento possa parecer. Penso nas pessoas que me são mais próximas e no vazio que a sua perca provocaria no meu Mundo. Não me apetece pensar mais nisso...

Acabo o dia nos braços de quem gosto... outros já o não poderão fazer. E rezo pelos que se foram e pelos que ficam.

(Texto enviado pelo Alexandre Duarte e ao que parece, de autoria de Frederico Fezas Vidal.)

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SAUDADE DOS PLÖ.

Explicando: os Plö são os vizinhos da varanda de frente. Se o nome deles é Plö...? Não, o antigo carro deles tinha a placa "Plö e mais os números. Deveriam ser de algum lugar da Alemanha.
Deveriam...? É, deveriam, pois nós nunca chegamos a falar com eles e nem eles com a gente.

Mas eram um casal muito educado e polido: sem gritos, sem escândalos, essas coisas.
De vez em quando eles sumiam por bons tempos. E sabíamos que eles voltavam quando uma tonelada de roupas azuis eram penduradas para secar na varanda.
Concluímos que eles deveriam trabalhar em turismo, pois desapareciam de tempos em tempos.
Bom, se não fôsse isso, já era uma boa explicação.
Compartilhamos muitas coisas com os Plö e vibramos quando vimos quando um dia eles aparecerem de carro novinho em folha. Quem bom, as coisas estava indo bem. Mas uma coisa muito importante sobre o automóvel: o novo carro continuava com a placa Plö. Ainda bem.
Mas o que mais nos unia a eles era o fato de termos em comum o fascínio pela varanda: o cômodo mais bonito da casa.
Eles eram os únicos vizinhos como nós que, ao subir apenas um pouquinho a temperatura, já iam correndo comer ou petiscar na varanda.
Nos fins de semana de Verão, em toda a redondeza eram só eles e nós: luzinha ligada e conversas até tarde na varanda.
E no Verão o movimento aumentava: os amigos da terra dos Plö vinham fazer uma visitinha. E nós já sabíamos isso porque neste ponto eles não eram como nós que compramos cervejas: era só olhar para baixo e ver o automóvel dos Plö.descarregando engradados de cerveja para as visitas que vinham. Bom, alemão que se preza tem que vir de engradado mesmo. Faz parte.
Até que um dia, semanas atrás, vimos que eles sumiram mais do que o costume. Férias...?
Quem sabe.
Mas depois de algumas semanas apareceram de repente. E não tinham aquela tonelada de roupas azuis na varanda. Eles vinham com uma surpresa: o Plözinho.
Devem ter tido ter ele na terra natal, descansado, visitado a família e depois voltado para casa.
O quarto do Plözinho parecia caprichado e de vez em quando encontrávamos de passagem os três andando no Calçadão, pegando um solzinho. Se eles se amam...? É claro.
Mas hoje, abrimos a janela e quando olhamos pela varanda vimos um movimento estranho: caixas, arrumações, janelas todas abertas.
Olhamos para baixo e vimos o indefectível caminhão de mudanças. Hi...os Plö vão embora.. E logo depois começamos a nos perguntar: vão mudar só de casa...? Vão mudar de cidade....ou...vão voltar para a terra deles..?
O caminhão já fechou e acabou de ir embora. Puxa... que saudade que começou a dar, coisas de quem mora fora so país. Quem sabe para onde eles vão. Mas já está dando muita saudade.
Só sabemos de uma coisa: gente fina os Plö.

D.

Danyet Saak

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A morte de Sérgio Guimarães

Fotógrafo que um dia me ensinou a não desprezar nenhum pedaço de papel branco mesmo amarrotado. "A melhor luz" disse me ele, " não vem do sol nem de uma lampada, vem do sal, e se o sal te faltar, procura nos cantos do estúdio uma folha de papel e ilumina com ele uma pedra negra ou os lábios da mais bela mulher". Nos anos setenta, todos os fotógrafos portugueses ficavam aptos a saborar as técnicas e a imaginação que o Sérgio utilizava.
Sérgio Guimarães, desertou para sempre faz agora catorze anos. Um coágulo estremeceu lhe o cérebro no momento em que por telefone dialogávamos sobre uma foto de um automóvel, que lhe havia encomendado, estava eu na "Park". Maldito sábado aquele, pela manhã, eram umas dez horas.
Medi o barulho estranho como alguma coisa caísse do outro lado, mas não me apercebi de imediato. Gritei por ele duas ou tres vezes, eu sabia que o Sérgio não andava bem. Quinze dias antes tinhamos discutido até á alma depois de almoçarmos um bife. Valeu a pena, porque consegui que no raso das nossas mãos ele depositasse a promessa de não mais consumir um miligrama de cocaína. Passado dois dias, a sua pressão arterial tinha descido de 26 (máxima) para 18. Mas o canto mais grave do seu pensamento, guardava sempre lugar para uma foto, de preferencia de uma bela mulher. Aquele pó branco pilhante que ás escondidas tomava como passos para o fim, era de todos conhecido, por muitos aproveitado. Como relampago, compravam lhe tudo pelo barato, para outros edificarem estradas de mármore e lavas. Como relampago, ficou sem trabalho, não deixando nunca de comigo lembrar o abandono de que tanto sorria .... cantando as mais altas aventuras. Por vezes nossos actos ficavam distantes. Ele fugia me por vergonha ou não tivesse ele um coração de vigília.
Corri então para o hospital Egas Moniz, corri tanto que me parecia abrir estradas nos passeios de Lisboa.
Ó memória, tem cuidado comigo.........
Por trás de uma porta de vidro, uma maca rodava á pressa empurrada por dois homens. Numa maca, era o Sérgio Guimarães, o fotógrafo, o amigo do grande sonho.
Tivemos os dois breves segundos. Procuràmos uma dança imóvel com os olhos. Não houve palavra nem foto que naquele momento não tivessemos ambos criado. Voltei a vê lo no dia seguinte, quando a terra lhe foi mais pesada que todos os belos prazeres.

Manuel Peres

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Semântica formatada

 No sector do fabrico científico do design as varetas de um guarda.chuva só servem ergonómica.mente ( a verdade vem sempre ao de cima ), se fizermos força.
Poder.se.á perguntar também porque numa garrafa de gar.galo para cima o uis.que ( quem soletra assim é gago ou embriegado) não enche o copo caso não alteremos a posição do engarrafamento do líquido em hora de ponta. Não vou fugir ao assunto, mas uma mão des.avergonhadamente nua, teima em pousar no meu ombro para que eu desvie a conversa. "Hoje é dia um de Maio, dia do trabalha.dor" . Senti esta voz como se fora Santa.Ana a aconselhar.me uma consulta ao psiquiatra, mas nenhuma santa levará a mal todo o trabalho que eu possa produzir neste dia um de Maio e bem. Hoje é feriado , é tarde, hora em que me dá um gozo do caraças desenhar. Faltam dez minutos para começar o dia dois de Maio, dia em que as juntas de fregues.ia reabrem depois da festa, As agências de design e publicida.de (o germicida mata, a publicidade nem sempre) também e porque não dizer que também, os gabinetes dos clientes. Que solidari.edade. Esta assume diversas formas, por exemplo as da efi.cácia, ( "cácia"espécie útil para a flora intestinal ) graças a Deus. É só uma força de expressão, que não se repare, como tantas outras, que me saem do pé.para.a.mão ou da noite.para.o.dia, como um horário fix.o.
Já passa da meia.noite, o dia um já lá vai, mas não é um alivio não, porque à vontade ninguém pode ainda falar e eu que nunca pertenci a estremas, acreditei de facto que as utopias não são nunca uma menina.virgem ( óleo puro com 0.5 graus de acidez ) que mais tarde se perde ou se entrega a alguém em troca de uma re.feição. Até acreditei que o Esta.line não voltaria com aquelas mãos largas de fazer muito por tanta gente. Quem o conheceu bem, acabou com o corpinho cheio de porrada nos serviços de saúde que custam uma pipa.de.massa . Até acreditei em ensino demo.cratizado, ( mais conhecido por demo protector ) de qualidade, com cadeiras de.design, gratuítas, onde cus não se excluissem por favores, digo, por favor. Sejam militantes, mas seniores, vão ver que há sempre uma cadeira, mal desenhada, querem ver? a de "Pessoa". Ò cadeirinha ruim! quem nela sentar o rabo para lanchar um qué.que, dela sai com o cóxis destruido, pois não dá para nela aguentar sentado dez minetinhos a tirar burriés das narinas preguiçosamente, ora uma cadeira que se preza e de bom design, deve obrigatória.mente ( as verdades são para se dizerem ) propocionar outra preguiça, a passagem do dedo indicador entre o rabo.e.o.assento para se poder coçar as partes baixas, ou , "soltar gases", (estranha frase que dá jeito, piqueia do título de um artigo do sr. Mário São Vicente e gostei ) . Com a cadeira de "Pessoa "não dá, quem o fizer fica com os nós dos.dedos.assados. Porra pra forma e função.pública do design.

( . ) Semântica formatada, onde cada ponto me fez perceber isto, tarde de mais.

Manuel Peres

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Hoje comprei um pífaro.

Hoje comprei um pífaro. Mete inveja aos homens dotados. Hoje toquei pífaro até às tantas.
Muitas mulheres não se queixam do mesmo relativamente aos seus maridos, porque pífaros há, que nem uma nota soltam. Não tem tempo para tanto os libidinosos, porque as lantejolas do patrão tem de ser polidas até às tantas. No brilho é que está o ganho.

Lembrei me hoje do meu combóio, o primeiro. Ainda é eléctrico desde que com os outros putos brincava, mas já não deita fumo pela chaminé. Está seco do óleo de fritos que a Prazeres me dava.
As miúdas do meu tempo, quando eram putas, abandonavam me para brincarem às casinhas e eu pirava me com o meu combóio a apitar. Roubei uma boneca de trapos a uma delas que deu à luz um político deformado que o Jaquim nunca conheceu. Ainda bem. Não ligues Jaquim, vai antes pelas amarelas páginas da lista que abandonam à tua porta, quando me toca a mim dou sempre cem paus ao distribuidor, porque ele tem sempre as mãos a abanar cheinhas de papel. Ele lá recolhe os louros da distribuição, é chefe de uma carrinha, as outras que vem atrás recolhem os morenos os pretos e alguns brancos. Vai tudo de cana e passam ao lado do jardim das amoreiras cheio de rabetas. Que lindo aquele jardim. Olha Luis, eles que se governem, já são maiores e vacinados.

Depois mais cedo que nos outros sábados passei no Teodoro, mas tinham vendido todo o pão quente. Ora como é que se pode confiar na junta autónoma das estradas, o padeiro furou num buraquito onde enfiou metade da carrinha. Que falta fizeste Miguel para ajudares com esse corpanzil a mudar a roda ao Teodoro, olha que ele tem nome de secretário de um ministério qualquer. Assume lá a tua ausência e vê esta tarde um filme com o Wiliam Holden mas tira o marcador do bolso no cu das calças quando te sentares, pois aparecem te esses estranhos fungos azuis ultramar "junto ao rego" , título de um poema da Covilhã, mesmo à beira de uma "linha de água", muito em voga nos designeres.
Porque és assim para eles Miguel ?. Olha é uma questão de alguns anos e dinheiro, queres ver? Briefing, viste? é uma tara esta tralha publicitária. Demoraram doze anos para a pôr no novo dicionário e deu direito a uma condecoração republicana. Aben .. . çoados , por enorme esforço. Mas não faz mal Zé Faria,,,, tu sabes que no princípio era o verbo, costumavam dizer as raparigas do nove da barroca a porem as toalhinhas à janela e se chovia limpavam a malta com as fraldas dos putos a quem davam de mamar . Era aquilo um momento inesquecivel Zé. Lembras? mandavam nos levar na peida, aquela máxima mais conhecida que o logotipo da WW.

Olha Manel Maltez estava eu aqui a dizer ao Miguel Monteiro que as pessoas são muito más, mas não me lembrei de ti, juro. Quando me lembro de ti só vejo aqueles anúncios muito pintelhados que os dois faziamos para pôr aquela casa a dar guito. Aquilo é que era fazer cacau. Levavas o anúncio na pasta e quando regressavas do cliente aumentavas o pesoal com uma carga de trabalhos e a conta bancária da agência tambéeem. Naquele tempo não eramos pindéricos nenhuns. Bem hajas. Parecias a direcção geral de espectáculos. O que a gente se ria Manel. Porra só tu meu amigo. Desculpa lá se alguma coisa me escapa. Já me custa lembrar, desde que li uma biblia falsificada, que me sinto assim. Isto já eu tinha nos meus desejos, Ver vos às vezes. Com esta mania de menosprezar me de vez em quando encontro alguns de voçês e a Renata? era como a locução anlgo saxónica do Luis, ou como o milho.

Manuel Pere

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 PÁSCOA DAS ANDORINHAS

Anda tudo na Lua, Júpiter, Marte... sei lá eu que mais!
Anda tudo a meter água. De tal forma que nem
o nosso primeiro ministro pode casar à vontade.
Sim! Cá para mim, ele gostaria de, pelo menos,
alguma pompa e circunstância.
É o sistematicamente correcto,
com ou sem batata frita.
E se assim não o foi, não percebo porque houve
porta vozes a descrever a ementa da boda!
Tudo isto se passou hoje, 9 de abril do ano
de todas as desgraças, que no milénio vai ter
o número 2001 dC.
E eu disse sim, sem saber o que me esperava.
No DN, um tal JCN. fala da misericórdia.
O VM (que não merece o ponto) de um tal
"bom rei, mas infeliz", tudo na mesma página,
que é a nove.
Curiosamente, na seguinte FMF insurge se contra
certos servilismos da nossa feira de vaidades.
Em consonância, os primeiros números do loto
desta segunda feira foram mesmo o 9 e o 10.
Não refiro a pg. 11 do DN, já que ela é,
inteiramente, dedicada à Dona Publicidade.
Se não se tratasse de página nobre, talvez fosse
dedicada ao tema "A América à beira de perder
a paciência com as chantagens dos chineses"

*
Mas talvez fosse melhor falar das andorinhas
que chegaram tarde e andam, ainda, à procura
de lugar onde fazer ninho e pôr ovos em segurança,
segundo os seus hábitos ancestrais.

Será que não merecem uma brigada especial
de protecção da espécie?

*
Cá na minha opinião, não a merecem.
Pela simples razão que nem os humanos a têm.
Mais: não a querem.
Os humanos querem na e merecem na.
Sabem onde começa a diferença?
As andorinhas são livres!

*
Por lo tanto, é importante saber voar.

Encontrei, por hipotético acaso, um amigo
que tem imaginação a mais.
Falou me das suas últimas atribulações.
Ouvi o atentamente.
Curiosamente, afirmou, talvez
com outras palavras, que anda tudo doudo.
Ou doido. Tanto faz!
(Coincidências não existem... São amigos!)

*
De seguida, e segundo a falta de coragem
que grassa pelo país inteiro, com toda a gente
a sacudir a água do capote, resta me ainda
um pouco de lucidez para vos desejar
muitas andorinhas
nos beirais desta páscoa
e poucos mortos
nas estúpidas estradas
deste rectângulo de asfalto
à beira mar tão mal construído.

*
PS único: Parabéns ao António e à Catarina.
Aos padrinhos e restante família de ambos
os lados. Ao Vitor e ao Vaz. Ao Malaquias
e ao Jójó. Também à Carolina e ao Nuno,
à Alice e à Rosa, à Mena e à Manela.
(Este sexteto anos faz em Abril de cravos
já muito murchos e sem cor verdadeira.
É a vida, pessoal...)
Desculpem me a pressa.
Tenho que ir dormir.
Amanhã tenho que cuidar da pub.
As escolas estão de férias. Sabiam?

Improviso de semana santa,
sexta feira sol doirado
e Cristo sem ressuscitar

joaquim alves

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Bom Luís,
desta feita os galos cantam para nós,
tal melros afinados em sinfonia perfeitíssima
na sua magnífica e baritoníssima
voz.
Só não sei por que cantam!...

Desta vez,
rimam os adjectivos no seu superlativo
& outras cousas em português.

*
Compreendi te naquela da família que,
infelizmente e sem corruptelas,
há cada vez menos!!!!!!!

Sobretudo por razão estatística,
já que os casais (ainda existem?)
acham que não vale a pena gerar filhos
para a espelunca que o mundo é.

Até quando?

Sei lá eu, que ainda ando a gatinhar
sobre o sério assunto.

É verdade que já o abordei por aí,
neste brincar de trucas & quejandas,
onde intrinquei algum do meu destino.
Sim, apostei algumas horas e dias
da minha curta vida nesta sítia de truca,
onde oiço uma voz a dizer nos:
o tabaco mata!

*
A propósito, não posso deixar de repetir
a velha e original resposta do eterno
Vinicius de Morais (VM) ao seu médico:
VM Doutor, mata mesmo?!
DC Mata! Lentamente.
VM Doutor, é mesmo assim que desejo
morrer: lentamente...

(Este recado penso que serve a prática
do António, também conhecido por Macedo,
& outros quejandos quaisquer.
Mas são sempre pessoas mui respeitáveis!)

*
(Desta vez, deixo aqui um desafio
aos que não percebam estas entrelinhas.
Sabiam que a dita censura do lápis
& fascista usava o em azul
e raramente em vermelho,
que também acontecia?
Sabem o que é censura, HOJE?)

*
Fiquei grato com a notícia que reporta
ao crescimento da Criapura.
Sinto que também dei o meu contributo
para o seu nascimento, sem forceps!
Um abraço para essa gente e a rosa!

*
Depois, continuo à espera de um conto,
talvez de fadas, gnomos, or killers,
e da sua sequência sem fim, made or by
MrPeres que, segundo rezam as crónicas,
afadigado anda por inesperados atalhos.
A lógica popularíssima é muito simplista:
quem por aí vai, mete se em trabalhos!
Sem comentários... Por agora.

A não ser este:
Sem MrPeres esta página perde se. Perde.
Penso eu, que a mania tenho de pensar...
*
Vai daí, sem consequências,
continuo a desertar por lindas praias.
Escorrego por areias do meu sonho
de menino e reafirmo cousas assim:
a minha tia Olívia batia aos pontos
(caso não tivesse acontecido por KO)
o tio do EDSON/FCB, mesmo aliado
ao tio Goberno, à Luzdomundo, mai
os aliados do centro, direita e média esquerda.


*

Tinha a obrigação moral de esclarecer
um texto meu de há mais de ano e meio
em que me meti, contra corrente, com
o Magus Edson (lui mêmme),
tal como me insurjo contra um tal
Coelho Parvulus, uma Rita Férrea,
um Zé da Guerra, ou uma estrela
recém nascida, tipo Marizé,
sem nada p'ra dar ao futuro.

*
Anda tudo tão doudo, tão doido,
que até já me posso permitir
um afirmar e um contradizer.


*
Bom Luís, depois de ter visto cena
"eventualmente chocante",
tenho a certeza da injustiça
da (parcial) censura às imagens enviadas
por um tal MM.

improviso III
1 de abril dia das verdades 2001 odisseia na terra dos incidentes
portugal sem a senhora de fátima ano I
made in
joaquim alves

oooooooooooooooooooo

PRONTO
aqui vai mais uma estória publicitária,
personal, ou apenas íntima.

Há coisas de que não se lembra o diabo.
No entanto, há humanos que superam
essa indigna falha de imaginação que,
parece, o diabo tem.
Se não me engano, o diabo pai. Já que
o mesmo não se pode atribuir ao diabinho filho.
Isto se as crónicas recebidas pela agência DBL
não nos enganam.
Explicitando, desde já, as siglas contêm
a abreviatura de DiaBuLus. Tem lógica!
Continuando, deve ser invenção do diabolozinho.
Não estou a ver o velho e cornudo pai do dito
a ter tamanha capacidade de montar uma estratégica
agência de comunicar coisas do tropical inferno.
Primeiro, porque a temperatura não suporta
computers (MACs ou PCs) a internetar com
o nosso BG (Bill Gates), que também achava
que a coruja Net era uma invenção do demónio.
Foi necessário o ministro dos negócios estrangeiros
do sacrossanto vaticano dar a sua bênção limitada
a tão inovadora forma de não nos perdermos
ainda mais da evolução dos nossos irmãos
medio inofensivos extraterrestres.

(Cfr. Apontamentos breves para comunicação
imediata com sério seres positivo negativos
estrela CMCXIX cat. 877 23, RC.01248,
Arq. 8473.

Spielberg utilizou esta fonte para um dos filmes
que, em breve, vai ter estreia mundial em Marte.)

*
Segundo a agência citada, o patrocínio de tamanha
ousadia é da responsabilidade da LOCUTORIS SÁ,
sediada em qualquer coisa como TRUCA & Associadas,
tendo como presidente dos conselheiros maiorais
um tal Luiggi Gasparius, assessorinhado por mais
uns tantos seus semelhantes, entretanto emigrados
para uma das luas do planeta em causa, bem dispostos
e aventureiros por natureza.

A listagem dos ditos só será fornecida a quem enviar
200,000 euros, em platina pura, para a morada
a desvendar após o respectivo depósito na conta
truc@banconovofuturistajovemeterno.abc.123
Vale a pena lembrar aos distraídos que não
se aceitam encomendas abaixo do valor indicado,
sendo válidas quaisquer multiplicações por n
positivo.

Assim sendo, e atingido o valor necessário,
comprometemo nos a adquirir a agência noticiosa
DBL, já cotada em todas as grandes Bolsas
de Marte & Arredores.
Como incentivo, embora tenha pedido para ficar
em perfeito anonimato, Sir Bill Gates novel
cavaleiro honorário de Sua Majestade, o Rei
da Grande Europa Unida do Tejo aos Urais
já fez o seu depósito, virtualmente simbólico,
no valor de 200,ooo,ooo,ooo de eurodólares.

Façam, pois, o favor de contribuir com a vossa
prestimosa comparticipação nesta causa suprema
de arrancarmos das mãos do inferno a maior
e mais funesta fonte de desenformação
de que há memória.

A Bem da Nova (des)Humanidade
e Glória dos Céus de Marte.

(Seguem se assinaturas respectivas e ilegíveis
dos sócios fundadores, futuristas, funcionalistas,
fócio analistas, distrativos e um tudo nada abstractivos,
filofactactivos e perseverantes q.b. com arroz al dente
e perspectivados em médio cálcico adjacentes
em busca dos dinossáurios do pré rex rex regium
apocalipsum MMCDXCVIII.)

Em caso de dúvida, contactar:
Número vermelho 777.777.77
Ou Apartado Brasa da Sorte
6666 9999 BOAVIDANORTE
Pode, ainda, dirigir se ao e mail mais
aqui utilizado todos os dias.

Bons investimentos!
Com a colaboração amiga e gratuita
da nossa TRUCA.

Truque, pois. Mas não nos troque
por dá cá qualquer emplastro.
Seja justo consigo e cultive o A(HU)MOR!

Joaquim Alves

ooooooooooooooooooooo

A águia é a ave que possui a maior longevidade da espécie.
Chega a viver 70 anos.

Mas para chegar a essa idade, aos 40 anos ela tem que tomar uma séria
e difícil decisão.

Aos 40 anos ela está com:
As unhas compridas e flexíveis, não consegue mais agarrar as presas,
das quais se alimenta.
O bico alongado e pontiagudo, curva se.
Apontando contra o peito estão as asas, envelhecidas e pesadas em
função da grossura das penas, voar já não é tão fácil!

Então, a águia só tem duas alternativas:
Morrer... ou enfrentar um dolorido processo de renovação que irá durar
150 dias. Este processo, consiste em voar para o alto de uma montanha
e recolher se num ninho próximo a um paredão, onde ela não necessite
de voar.

Então, após encontrar esse lugar, a águia começa a bater com o bico
numa parede até conseguir arrancá lo. Após o arrancar, espera nascer
um novo bico, com o qual vai depois arrancar as suas unhas.
Quando as novas unhas começam a nascer, ela passa a arrancar as velhas
penas.
E só após cinco meses sai para o famoso vôo de renovação, e para viver então mais 30 anos.

A vitória é para os que têm coragem e não sentem pena de si mesmos!!!
Na nossa vida, muitas vezes, temos de nos resguardar por algum
tempo e começar um processo de renovação.
Para que continuemos a voar um vôo de vitória, devemos desprender nos
de lembranças, costumes e outras tradições que nos causaram dor.

Somente livres do peso do passado, poderemos aproveitar o resultado valioso que uma renovação sempre traz.

(autor desconhecido)

(Texto enviado pelo Miguel Monteiro)

ooooooooooooooooooooo

 54, ou 85 ?

Em 1954, em Outubro, entrei pela primeira vez numa sala de trabalho, um estúdio de litografia. Eram oito horas de uma manhã em que o sol no Largo do Rato já começava por aquecer o chão de basalto, o amarelo dos carros eléctricos, e uma carroça puxada por dois cavalos de patas enormes e peludas, dois cavalos de raça inglesa. Na esquina, uma menina de roupa branca, de lenço rendado e alcofa no braço coberta com um guardanapo, vendia bolinhas de Berlim ainda quentes. A montra da papelaria Fernandes estava decorada com aquarelas e flores de Outono a servirem de fundo a pinceis pelo de Marta, lápis Faber e bisnagas Cisne.
Entrei naquele arco ao lado da papelaria com uma excitação contida, comparada sómente ao maravilhoso momento em que nada consegui dizer a uma menina em 1953, um ano antes, quando amei pela primeira vez. Depois daquele arco de pedra e ao cimo de umas escadas mal iluminadas entrei uma porta e olhei espantado uma oficina com homens de batas cinzentas, outros também mas de azul e um outro homem ainda mas de bata branca. O papel que eu apertava na mão tinha o nome daquele homem, Mestre Sales a quem me dirigi e entreguei o bilhete amarrotado e suado de tanto o apertar. Numa outra sala com seis estiradores e porta de mola aberta pelo Senhor Sales lá estava uma mesa onde me mandaram sentar e esperar. Aqueles primeiros minutos de espera só os posso comparar a qualquer momento de maior medo, ou a um outro em que uma criança ainda não sabe olhar se com inteligência.
Os dias que se seguiram, foram como as melhores companhias, conselheiras, lúcidas e amigas.
Em 1985 e passados trinta e um anos não consegui evitar e voltei a passar por aquele arco no Largo do Rato, um lugar que ainda existe hoje e foi com o mesmo medo que subi as escadas mal iluminadas e que entrei pela oficina, mas não vi o Mestre de Litografia, o Senhor Sales. Bati com os dedos na porta do estúdio, empurrei a e o Mestre Mário Cordeiro continuava sentado na sua mesa, como que durante trinta e um anos jamais tivesse despido a sua bata, adoecido, adormecido ou saído para passear. O Mestre Mário Cordeiro olhou me duas vezes e só me reconheceu quando levantou de novo o olhar na minha frente, deu então dois passos, abraçou me e ao encostar o seu rosto ao lado do meu, senti a sua face arrefecida e quase igual ao rosto de um pai que recebe com emoção um filho que já não espera ver. Depois, voltou à sua mesa, abriu a primeira gaveta e retirou de lá uma foto três por quatro, a mesma foto que um dia lhe dei, trinta e um anos antes, para o meu registo na empresa. Depois sorriu, olhou mais uma vez para a foto, voltou a olhar me e disse me. É para ti. Estás na mesma.

Manuel Peres

ooooooooooooooooooooo

Matutando...

Matutando a propósito de uma série de
perguntas que, num crescendo de provocadora intensidade, começaram por questionar a minha capacidade de lidar com a falta de graveto, as minhas carências alimentares (físicas e/ou intelectuais) terminando, bem recentemente, por
pôr em dúvida a minha própria existência ou
consciência disso, resolvi responder, perguntando (no local certo)! Poderia ter respondido com um
lugar comum tipo "estou aqui para as curvas" ou,
em inglês, com o não menos lugar comum
"still alive and kicking".

Como já disse noutras guerras, os pensamentos
é que são como as cerejas, daí que tal saxónica
expressão me tenha recordado uma pequena
história com alguma piada.

O Jeremy Llwellyn é o GM e Creative Director da
SectorLight Design, uma das empresas do grupo
Saatchi, sediada em Londres e especialista em
comunicação de projectos de reconversão
urbana (Docas de Londres, Barcelona, Expo '98).
Tendo a SL ganho a conta da ExpoUrbe, tive o
prazer de ser chamado a trabalhar com ele, no
apoio a alguns trabalhos locais.
Terminada a Expo, os contactos espaçaram se.

De vez em quando eu procurava na "neta" pela
SL, indo cair, durante meses, numa página com
a chata mensagem "under construction"
até já parecia o site da UNIVERSO '87
Até que, num final de tarde, o site já não
estava em construção, estando porém, mais
estático do que o da U'87
(que continua em construção).
Lá estava o mail do Jerry, resolvi mandar
uma mensagem, que terminava com o tal:
"still alive & kicking?".
De repente, lembrei me era o próprio dia do
jogo de futebol Portugal Inglaterra, para o Euro
2000 aí, pegando no dito "kicking", lembrei lhe a
a irónica coincidência e despedi me.
Resolvi então, dar o dia por terminado, desligar
as máquinas e regressar a Penates, a tempo de
ver o jogo.

No dia seguinte de manhã, cheguei, liguei a máq.
e fui ver o "e correio"tinha apenas duas
mensagens, do dia anterior, e eram do Jerry.
A primeira, era um "reply" à minha mensagem,
apenas alguns minutos depois do meu envio
e terminava com um:
" a propósito do jogo de logo, boa sorte,
que vocês bem vão precisar!"

A outra, enviada umas horas mais tarde, logo
após o jogo, dizia apenas: "didn't I tell you?".

MM <mailto:m.mikael@clix.pt>

(Miguel Monteiro)

ooooooooooooooooooooo

 O coronel peidou se quando pegou na maqueta.

Estava mos lá por mil novecentos e sessenta e seis. A agência tinha as ombreiras das portas muito brancas e vidros aos quadradinhos e cortininhas rendadas por dentro, parecia os exteriores de uma vivenda da Beloura e eu sentia me bem naqueles interiores de alcatifas fofas, cor de mel.
O Dono da minha primeira agência era um homem muito alto, de bigode da cor do Camel que fumava. Calçava sapatos tão brilhantes que o nosso estafeta baixinho podia se pentear e usar a ponta dos pés do Coronel como espelho. A camisa daquele patrão publicitário em popeline de seda dava nos a ideia de ter sido engomada já vestida, nem uma ruga. Certo dia cheirou me mal. Levantei um pé e depois outro, nas solas nem sombra de bosta. O corredor da agência tinha um odor por vezes a traques requentados talvez por uma passagem tardia de algum safado. Quando uma acount passava pingando Aramis conta da agência o ar melhorava . Mas eu era muito recente naquela tarefa de maquetista senior e roxo de raiva por não poder piar, não fosse o emprego à vida. Que situação aquela. Até que os olhares, ao cruzarmo nos no patamar, fugiam de nós, uns entre os outros e entre somente alguns, o estado da coisa parecia familiar, como que muitos sabendo já das origens do bedum. Passavam por mim e sorriam.
Esta não!, apetecia me dar dois berros ao primeiro sacana que que me abrisse os dentes e meter lhe os dedos nas ventas .
Não fui eu !.
Num belo dia pela manhã o Vitor surdinou me o coronel cagou se outra vez . Senti me gelado. Aquele senhor? um coronel inglês?
Na manhã seguinte a maçaneta de porcelana da porta do estúdio da agência moveu se . Baixei os olhos na direcção da prancha que quase terminada esperava uma aprovação. Era o coronel. Um senhor de grisalho, óculos, de fato cinza claro, gravata azul turquesa, relógio de ouro no pulso a que se seguia uma enorme mão peluda e loura debruada por um punho branco abotoado com diamantes e um amarelo de dezenas de quilates. O cheiro voltou a mim, eu não devia olhá lo de frente. Era um odor suave mas muito chato. Era como um frasco tipo 1000 ml se tivesse destapado contendo de uma só vez um maço de Camel, um sabonete Camay, Old Spice, uma caixa de graxa para sapatos e verniz para unhas, tudo isto mas com peido. O Vitor olhou me a três quartos e percebi que cravara seus dentes no seu polegar dobrado a segurar uma gargalhada. Num idioma indicifrável que eu odiava por lhe sairem palavras que por teima nunca conseguia soletrar, o coronel deu a todos os bons dias, olhou a minha maqueta e disse, "bonita trabalha" e quando se despediu pegou na maqueta, enfiou a debaixo do braço, virou me as costa de onde percebi sair um som quase rouco quase agudo e entrecurtado pelos passos calados na alcatifa do corredor. O meu patrão tinha se peidado.
Estive naquela agência, quatro anos.

Manuel Peres

oooooooooooooooooo

 O homem da escada de pedra

A agência começava no primeiro degrau de granito de uma escadaria larga, fria e cinza , polida a meio, pelo tempo e por solas de quase todos os publicitários que por lá passaram .
Certo dia, no início daquela agência e sentado na primeira pedra, um homem quase rapaz estendia a mão por entre a manga de lã esfiapada e encardida, num gesto de pedir para a fome que lhe escorria por uma gota brilhante e quieta no lábio colado aos pelos já grandes no rosto. Estava tão fria aquela manhã que poucos conseguiam parar, olhar e dar uma esmola para o rapaz. Os minutos que faltavam para as nove horas daquela terça feira eram poucos para os quantos degraus a subir publicitáriamente, até ao relógio de ponto.
No outro dia, entre as mãos daquele homem novo, uma carcaça, deixava perceber pela beirada do pão, uma besuntadela de manteiga e mais acima, após uma enorme dentada, um sorriso de uma fome passageira, sem café da manhã, mais fria que a anterior.
Nesse mesmo dia à tarde, não vi o homem pobre na escada que já lhe pertencera e aquela pedra estranhamente vazia deu me a perceber que não fora talhada para nela se sentar a fadiga, a fome e as manchas de uma sandes de manteiga. Um homem bem comido nunca se comove com degraus. Pois é.
Subi até à primeira sala da agência onde uma menina, um telefone, um balcão e dois sofás de carneira compunham mal a recepção de uma agência de publicidade, onde sentado de olhar entre os joelhos ponteagudos e o soalho estava o rapaz da carcaça. Alguém em surdina me pediu tempo, um tempo que devo lembrar, por um homem renascido do frio de uma manhã publicitária.
Aos momentos de uma conversa sem beleza não pertencem o engano ou a virtude das regras e o diálogo que tivemos, de fazer bem as coisas, passava sobre os minutos das nossas necessidades, de um novo conhecimento. Um de nós tinha um emprego, o outro não. Ambos sabiamos que entre os dois nenhum de nós era perfeito. Entre nós seria bem melhor criar então uma certeza e olhar de longe a sabedoria, nem que tivessemos de barrar a próxima carcaça com a lâmina seca de uma faca. Como explicar ao meu chefe que um estagiário era alguém a necessitar de um trabalho, como dar uma oportunidade a um rapaz sem nome de família ou de apelido conhecido? Ora aí está como o medo se apoderava de mim, mas vá lá. No dia seguinte aquele aprendiz subiu a escada da agência para se sentar num estirador de madeira pela primeira vez.
No estúdio daquela agência éramos poucos quase sem espaços, mas coube mais um a aprender com os outros um ofício de tinta da china, litografia, maquetas e pincéis. Lá dentro, aquele maquetista a todos surpreendia no aprender, na coragem, no pouco salário que o enriquecia todos os meses e após um ano, o director aumentou o. Nesse final de mês pela hora do almoço convidou me a sentarmo nos naquele degrau e almoçámos ambos, duas mistas e um queque, de onde se desprendiam as migalhas e o nosso rir, junto ao primeiro degrau da nossa agência.
O companheiro desta história é hoje um ilustrador, talvez um dos melhores ilustradores entre os melhores.
Desde esse dia que me apetece contar a todos aqueles que me pedem emprego, a história do homem da escada de pedra. Seu nome não deve aqui caber. Ele sempre soube que há escadas de pedra a subir todos os dias, por homens iguais.

Manuel Peres

ooooooooooooooooooooooo

A minha mãe "netsurfer"

A vida não lhe foi muito favorável, ainda assim
poderia ter sido pior. Apenas com a 4ª classe,
lutou, trabalhou duramente e conseguiu criar
dois filhos que, melhor ou "pior", não se podem
queixar da vida que hoje têm.

Tratar de 3 marmanjos (os filhos e o marido)
e contribuir ainda para orçamento familiar, quase
sem tempo para respirar, jamais a impediu de
procurar manter se informada e actualizada.

Uma enorme paixão pela leitura, fê la ir lendo tudo
o que apanhava à mão, livros, jornais, revistas
(nem os rótulos das embalagens escapavam),
roubando para essas leituras muitas horas do
sono que tanto necessitava.

Uma das poucas "doenças contagiosas" que
dou por muito bem vinda.

Aos 70 anos, após uma operação de coração
aberto, há 15 anos e uma trombose há 5,
já sai pouco porque se cansa muito facilmente,
queixando se do que já não pode fazer, da dinâmica
que dantes tinha, razões que atribui apenas ao
estado de saúde mas a que recusa associar a idade.

Há cerca de 15 dias, sabendo me obviamente
envolvido profissionalmente com esta área do design,
comunicação, multimedia, net e afins, virou se para
mim repentinamente e disparou:

Olha lá, não tens lá um daqueles computadores
portáteis, que se ligam à Internet?

??!!!!, explica te lá ó Laura retorqui, num tuteamento
respeitoso que passei a usar esporadicamente, desde
que a diferença de idades se tornou inferior aos anos que
já levamos em comum.

Qual é a tua admiração? Era para o trazeres cá a casa,
p'ra eu saber como é isso de navegar e procurar informação
na internet, saber como funciona e para que serve...
já não vou ter muito tempo e não quero morrer ignorante!

...

Ainda não lhe porporcionei essa oportunidade.
Para mal dos meus pecados o meu único portátil tem
uma incompatibilidade com o único modem externo
que possuo.
Vou ter de resolver rapidamente o problema,
a curiosidade continua, aumenta... o Tempo, não!

Miguel Monteiro

oooooooooooooooooooo

Encontros I

1984, o Zé Pires (Ciesa) após muitas insistências
e tentativas para entrar no espaço da BD, enviando facsimiles do seu trabalho a várias editoras internacionais, tinha finalmente recebido uma resposta positiva, da parte do TinTin belga, que lhe propôs trabalhar com um argumentista francófono, o que o Zé aceitou.

Assim e obviamente os contactos do Zé com os belgas tornaram se uma necessidade frequente, criando um problema... o Zé não se desenrascava lá muito bem
no francês falado...vai daí, pediu a este vosso escriba
(ao tempo, uma espécie de assistente do Zé) para se fazer
passar por ele nos contactos telefónicos.
Tarefa relativamente fácil até porque tendo colaborado em todo o processo de abordagem às editoras, estava a par de tudo.
Assim me tornei a voz francófona do Zé Pires.

Encontros II

1985 Agosto
Chegara o dia em que se impôs uma ida (in persona)
a Bruxelas.

E agora? disse o Zé.
Tudo bem, disse eu, vamos!

Planeámos tudo ao detalhe (quase).
E fomos. Eu, o Zé e a filha dele, numa viagem peregrina,
de carro (já agora passeávamos).

O alojamento estava garantido em casa do Jean
Dufaux (o argumentista do Zé), com excepção do dia da chegada, em que seria suposto ficarmos em casa do João Tátá, ex colega copywriter, então
na delegação de tradutores intérpretes portugueses que preparava os dossiers de adesão à CEE, e com quem trocávamos correspondência regularmente.

Bruxelas, 18:30 horas, entrando na cidade pela primeira vez, em plena hora de ponta, o escriba lembra se de perguntar:
Zé, a morada que temos é de casa ou do escritório?
Ora, é de casa concerteza, senão ele tinha nos dito respondeu o Zé incrédulo.
OK, vamos lá procurar a Rue de la Paix, nº 2

Quem tem boca vai a Roma, como já tínhamos chegado a Bruxelas, o princípio aplicar se ia.
Perguntámos o caminho a um polícia, descobrindo com
alguma satisfação que estávamos muito próximos.
Chegámos e a verdade saltava aos olhos, não fora o edifício mais do que conhecido de toda a gente ainda que só pela TV ou fotos dos jornais...
...a sede da CEE... e agora?

Fácil, pensámos, isto é a capital da civilização europeia,
da organização, não era por isso que queríamos tão desesperadamente entrar no clube?

Vamos à recepção e "obviamente" conseguirão pôr nos em
contacto com o Tátá.

Qual quê... o João ainda era estagiário, não constava das listas de funcionários. Estávamos lixados, já nos víamos a dormir dentro do carro e a comparecer na reunião marcada para o dia seguinte na editora, barbados, mal dormidos e mal cheirosos, quando o funcionário se lembra que talvez tivéssemos sorte noutro edifício, onde estavam instaladas
realmente as equipas de tradução de Espanha e Portugal!

Uma nova esperança renascera em nós, o edifício era na
mesma rua, apenas umas dezenas de números mais
abaixo.
Vamos de carro disse eu.
Não sejas preguiçoso, são apenas umas centenas de metros, vamos a pé.
As centenas de metros foram crescendo, a noite caindo e
ninguém nos falara no extenso parque que ficava no caminho (sem casas, sem prédios, logo sem números...),
lá o atravessámos e recuperámos a rua por onde íamos, passando por uma rotunda onde desembocavam uma data de ruas iguais àquela donde vínhamos e... um pouco mais abaixo o edifício que procurávamos, deixando para trás um percurso tão longo quanto ter ido do Saldanha ao Rossio,
(passando pelo tal parque que viríamos a saber mais tarde ser totalmente desaconselhável por lá circular durante a noite).

Àquela hora, cerca das 20:30, seria mais que certo
encontrarmos apenas a segurança do edifício, mas
talvez nos dessem alguma informação.
Assim era, já ninguém se encontrava na delegação
portuguesa e eles não tinham os contactos de ninguém.
Mas a esperança não nos abandonava, tínhamos visto luz num gabinete, insistimos com o segurança e... afinal
ainda havia alguém no piso que a delegação portuguesa
partilhava com os espanhóis. Pelo telefone interno, o
vozeirão do chefe da delegação espanhola, dizia me num português tão claro como se estivesse em Lisboa:
Ah, sim eu conheço esse gajo! Subam, subam.

Subimos e, explicando ao que íamos, foi nos respondendo no seu português correcto (sem sotaque), que apesar do cargo que ocupava só havia para ele duas línguas o catalão e o português, lá nos disse para irmos até ao fundo do corredor onde era o gabinete do gajo, onde talvez pudéssemos encontrar um telefone, um cartão, qualquer coisa que ajudasse a localizar o João Tátá.

21:00 horas, eu, o Zé Pires e a filha, sózinhos, não identificados, percorrendo livremente os corredores de um edíficio da CEE, onde se traduziam dossiers, provavelmente confidenciais.

Encontros III

O João era um apaixonado por cinema, um cinéfilo
daqueles que em Lisboa passava bastante do seu tempo
livre, na cinemateca. Na sua agenda do dia, uma nota de
rodapé marcava: "21:00h Actor's Studio", uma espécie de cinemateca existente em algumas cidades europeias.
Eureca, pensava eu, procuramos a morada, plantamo nos lá à porta e esperamos, estamos safos!
Porém o Zé, cansado e algo desanimado, receou um
desencontro. Como víramos no caminho várias casas
assinaladas com "H", símbolo de hotel, pensão ou de
aluguer de quartos, decidimos então, procurar um alojamento para essa noite que logo trataríamos do resto
no dia seguinte.
Despedimo nos do catalão, agradecemos aos seguranças e
fizemo nos ao caminho de volta. Numa cidade desconhecida, onde por essa hora quase se não vê vivalma.
Conversando distraidamente, passámos pela tal rotunda das ruas iguais e fomos andando, algumas centenas de metros adiante, começámos a estranhar o facto de não encontrarmos as casas do "H", apesar de supostamente
seguirmos pela mesma rua.
Consultando o mapa da cidade num "mupi", concluimos
ter seguido pela rua errada, apenas pelo facto de termos obliquado um pouco na tal rotunda.
O Zé disse então que o mais seguro era voltarmos para trás, até à rotunda e retomar o caminho certo.
Porém o escriba, por vezes dado a aventuras, com o dia
(e a noite) já recheado de peripécias, achou que, já agora
e cansados que já estavamos, valia mais arriscar e atravessar caminho. Assim fizemos.
Caminhando por uma transversal, reparámos num prédio
do outro lado da rua, sobre cuja porta de entrada um letreiro dizia "RESIDENCIAL". Era ali, não andaríamos nem mais
um metro, oxalá houvesse quartos vagos. Entrámos no patamar, nada de recepção, uma porta interior de acesso à escada, fechada, um quadro de campaínhas de apartamentos e um casal idoso que entra e nos olha de forma estranha e até de desconfiada, faz nos concluir tratar se de um vulgar prédio de habitação.
Desilusão, voltamos à rua uma vez mais. O Zé Pires na frente, abre a porta do prédio, volta se para trás para me dizer qualquer coisa, e ao sair dá um violento encontrão num transeunte que passava...
...era o João Tátá!

Miguel Monteiro

oooooooooooooooooooooo

Há perguntas necessárias...

Há perguntas necessárias que nunca deviam ser feitas.
Dia dois de Novembro de 2000 .
É muito complicado avaliar o espírito de um gestor de marketing pelas suas perguntas e muito fácil aceitar as suas respostas se procurarmos dizer sim ou não, com aquele ar simpático, mas um nada indiscreto. Resulta sempre, principalmente nas ocasiões em que a meio da reunião nos tenhamos apercebido de que jamais aquela continha de um milhão de contos é nossa. Neste caso,chore, ás escondidas e caso não suporte a cólica da sua razão perdida, telefone a um grande amigo, convide o a jantar, pergunte lhe coisas a que ele não saiba responder. Vai sentir um grande alivio.

As perguntas nunca são indiscretas, quer ver?
Composta que foi uma reunião em que a minha presença era desnecessária, até porque a maior desgraça que pode acontecer a um director de arte com sessenta anos não é ignorá lo e sim dizerem lhe todos os dias "gostava de chegar onde já chegas te..... vai lá prá reunião", não conseguindo dizer não. O que falta desta história é para ser levado a sério, prometa me.

Terminada a reunião, alguns lá sairam da sala a muito custo, devagarinho, roçando as paredes até á porta, o ultimo olhou me desconfiadamente e eu sentado naquele papel acompanhante, de um cliente estafado, que na minha frente tamborilava a mesa com as cabeças dos dedos cheirosos a Coiba falsificado e sem gestos iguais ao fim de uma conversa. Fim o caraças.
Diga me lá, conhece o tio Olavo?
Apertei com tanta força o polegar da mão esquerda contra o meu joelho que o gestor escutou um estalo.
Conheço sim.
Diga me outra coisa, o tio Olavo é um publicitário?
Nem sempre.
Nem sempre? e o sobrinho, conhece?
Conheço.
Os dois são brasileiros?
O nosso pensamento é sobretudo construido por uma diversidade de ideias desordenadas. Naquele momento a minha vontade de as organizar devia se a uma ideia que não conseguia recordar, lá bem para comigo soltei um enorme porra ,como auto sugestão, fez me bem, lá isso fez.
Os dois são brasileiros sim.
E são muito chegados, não são?
Há laços familiares que são indestrutiveis.
E há quanto tempo os conhece?
Há uns anitos.
O sobrinho dá muita importância ao que o tio lhe diz, não dá?
Mais ou menos, faz o que pode por ele.
Mas o tio dele é assim tão velho?
Não lhe sei dizer ao certo.
A minha imaginação paralizou se, estéril. Que sacana de sensação. A mediocridade da conversa tinha origem numa verdade. Aquele homem que me questionava não podia ser abandonado por mim, nem a sua ignorância tão pouco. Por ela eu não devia fazer tudo.
Por ele eu deveria fazer o que podia. Um homem que se queixa do seu desconhecimento tem sempre o mérito do bom senso e o mal residia de facto em mim, por não ter percebido que o caso não estava para brincadeiras, fosse lá eu imaginar tambem tal situação.
O meu cliente agradeceu me eu ter contado a história do Edson e seu tio , tal como a conheço. Percebi nele a vontade de conhecer melhor o que lhe parecia verdadeiro e dei lhe várias pistas que não chamarei aqui. De uma coisa aquele homem ainda não sabe, mas que eu estou certo .
O tio Olavo e o Edson eram muito parecidos, até ao dia da ultima crónica dedicada á publicidade com o titulo, "Para quem fica chau" e que termina assim.
Edson Athaíde "Espero assim poder um dia voltar a ser um cronista feliz"
Tio Olavo "Se não tem nada para dizer, cale se ou cante.

Nunca se saberá a verdade daquilo que se deixa de dizer. Nem nunca escutei uma canção de quem decide calar se. O que é que eu vou dizer àquele homem da próxima vez?

Manuel Peres

ooooooooooooooooooooo

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