CRÓNICAS ANTERIORES 2
por DANYEL SAK

 


A IRMANDADE.

Caros Amigos:

Sim, eu pertenço a uma irmandade Mas uma irmandade muito especial: não tem sede, não se reúne periodicamente, não tem almoços, nem ritos de iniciação e muito menos tem códigos secretos. E mesmo assim, ainda é uma irmandade: os Canhotos.
Os seus membros encontram se sempre por acaso. E só interagem depois de
reconhecerem se mutuamente.
Quase sempre é assim: uma pessoa a passar olha a outra escrevendo ou comendo com os talheres e lá vem a frase surpresa sempre acompanhada de um sorriso
"Ah....você é Canhoto....?? Pois olha, eu também....!!"
Mesmo que elas sejam pessoas completamente diferentes; uma careca, outra
cabeluda, uma torce para um time e a outra para o adversário, uma pode ser
Hippie e a outra Banqueiro, uma tem gases e a outra prisão de ventre, nada
disso interessa: a partir daí uma ligação etérea foi feita.
Digo etérea porque realmente é algo que não reverte em lucros, fama,
afinidades, nem marcar encontros ou almoçar, ou qualquer outra coisa. É
apenas um sentimento: "descobri alguém como eu".
Melhor ainda: sente se uma cumplicidade rarefeitíssima de agentes secretos
ou algo como Butch Cassidy & Sundance Kid.
Este clima inconsciente de mistério e que passa de geração em geração se
deve aos Canhotos terem sido considerados "diferentes" ao longo da história,
sendo o ápice o churrasquinho de Canhotos na época da inquisição. Ou também
por algumas denominações políticas (esquerda=comunista), ou mesmo a palavra
"sinistra" para designar a mão esquerda.
Mas, na verdade, mesmo entre os Canhotos, ocorrem categorias. Uma delas, o
Ambidestro (pertenço a esta classe) em que a maior parte é feito com a
esquerda e as poucas restantes com a direita.
Claro que ser Canhoto não é só o mistério e folclore. Alguns contorcionismos
forçados ainda permanecem no dia a dia dos Canhotos: as tesouras, os
talheres perfilados ao contrário na mesa, as borboletas* (Rio de Janeiro) ou
Catracas* (São Paulo), e principalmente o sádico abridor de latas (que
felizmente está desaparecendo, substituído pelas "aberturas fáceis").
Mas mesmo assim, os Canhotos não se consideram diminuídos socialmente, muito pelo contrário.
Por isso não são e nem querem constituir se em força política ou
reivindicatória. O motivo é que isso acabaria por desvanecer a condição de
exclusividade e mistério.
Seria como agentes secretos fazendo um partido político e saindo às ruas em
passeatas: fim imediato do glamour.
Este é um dos motivos do porquê as lojas especializadas em artigos para
canhotos não duram muito tempo: superexposição sobre o tema não combina com Canhotos.
Me recordo da mais recente loja especializada em Canhotos que encontrei há
um ano atrás (se é que ainda está aberta).
O facto é que todos paravam na montra para ver os objetos "exóticos". Sim,
ao olhar o rosto das pessoas via se claramente que continuavam
inconscientemente a consider os canhotos diferentes.
E ao aproximar me um pouquinho mais da montra, um artigo me chamou
particularmente a atenção.
Era uma t shirt que dizia em um humor cortante, algo como "Se não fôssem os
canhotos, o que seria da humanidade". E a seguir uma seguia se uma lista
enorme de canhotos famosos que incluia desde Newton a Einstein.
Gostei e já ia entrando para comprar quando parei por um instante e percebi
que eu estava em Espanha.
E que em Espanha "Canhoto" se escreve "Zurdo". E "Surdo" (de surdez) se
escreve "Sordo".
Imediatamente recuei e mentalmente imaginei me usando a t shirt em Portugal
ou no Brasil e as pessoas a passarem por mim a ler: "Si no fueran los
zurdos, lo que seria de la humanidad". E logo a seguir o comentário baixinho
entre elas: "Olha....quanta gente famosa era surda, e ele também
é....coitadinho**".

Um Abraço

Danyel Sak vansaak@ip.pt

*não pude encontrar palavra equivalente em Português de Portugal. Mas seria
a máquina controladora de entradas: em que se insere um ticket e que
obviamente está do lado da mão direita.

**apenas uma citação, sem intenções ofensivas aos descapacitados auditivos
que merecem todo o meu respeito e apoio


A MULHER DE CÉSAR VAI AO HIPERMERCADO.

"Eu sou cirurgião, mas detesto ver sangue".
"Sou contabilista, mas não me venham com números e porcentagens".
"E eu mecânico: mas não gosto quando pedem para colocar a mão em motores".
"Senhores, sou bombeiro mas por favor, não me chamem para ir a um incêndio".

Estranho não? Mas às vezes não é isto que ocorre em publicidade.
Se somos profissionais temos que gostar e compreender as funções intrínsecas do nosso ofício.
Na verdade, publicidade serve para vender. De forma eficiente e bonita, claro. Por isso a publicidade não é arte, ela é (no bom sentido) o vampiro das artes: utiliza a arte (cinema, fotografia, literatura, etc.) para vender. E para fazer boa publicidade é preciso ser um vendedor.
Ocorre que a publicidade, em parte, não é mais eficaz porque alguns que pensa que ela "é algo giro, na moda". Então estes seres que pululam em algumas agências não tem o objetivo de vender, mas sim, estar na moda. Pobre cliente.
E mais: alguns até detestam o Capitalismo. Como?? Sim, detestam.
Mas como? Se estão dentro de uma das ferramentas mais importantes que ela possui: as agências.
Para citar alguns exemplos, aqui a descansar ao lado de minhas mulheres e meus cães, recordo me há uns anos atrás, de um destes seres.
Quando ouvia falar em supermercado fazia cara de nojo "hummm...eu supermercado...?" Se via passar uma camisa de chambray (aquela simples, azulzinha) disparava logo: é burguês! (por favor, contenham o riso do ridículo da frase). Isso além de "os hamburgers não vão dar certo por aqui" ou "as TVs privadas não vão dar certo porque já temos duas, e são suficientes".
Sim é claro ele era publicitário mas não podia "comprometer se com o capitalismo". Mas claro que para este ser, isso não incluia beber bons vinhos e possuir um carro do ano: a luta contra o capitalismo se centrava somente dentro da agencia, claro.
Então aos poucos conversei com ele: "Olhe, a publicidade pertence ao capitalismo. Então não seria melhor; para não conspurcar os seus princípios, ir cortar cana com os companheiros insurretos na Nicarágua? Ou tentar restaurar o comunismo na Albânia? Seria mais coerente".
Este é um dos motivos porque a publicidade não é mais eficiente: a publicidade é o capitalismo, mas as suas formas enganam e às vezes acabam por atrair seres literalmente opostos. E mais: é preciso entender não só o cliente, como os seus valores.
Sim, porque queiram ou não, a linguagem dos negócios é conservadora (isso não quer dizer sem graça) porque envolve dinheiro, money. E o fato e gravata é o seu uniforme preferencial.
Assim, se surgir um destes seres saltitantes, rasgados e na moda em uma reunião, por melhor que seja a campanha, a porcentagem de aprovação ficará diminuída em muito.
Mas então é preciso ser "sisudo"? Bem, nem tanto ao mar, nem tanto à terra.
Para isso temos que satisfazer duas condições: estar em um ambiente capitalista maduro e ter mostras dadas de que sabe o que faz.
Exemplos claros disso são Steve Jobs (da Apple, Pixar), Sam Walton (Wal Mart) e Philippe Starck.
Eles podem. Pois além de estar em um ambiente de total maturidade capitalista, em que os personagens de ambos os lados estão aptos a interagir por um objectivo comum, todavia tem mostras dadas de sua capacidade.
Por isso adquiriram (friso: adquiriram) o direito de apresentar se como acham que devem apresentar se. Pois isso já não compromete a sua performance.
Os demais seres pululantes e modernos serão vistos pelos empresários nas reuniões apenas como "seres curiosos que algumas vezes tem algumas ideias giras, mas não podemos levá los sempre à sério".
Recordo me que quando fundei a Z. Publicidade este foi um dos mecanismos de sucesso na época: aliar campanhas eficientes e criativas a apresentações com aspecto sério. Se este foi o preço a pagar, valeu muito a pena.
Afinal, os profissionais, tem de ser como a mulher de César: não basta ser honesta; é preciso parecer honesta. Não basta ser profissional: é preciso parecê lo também.
E sobre o hipermercado? Bem, isto já é outra história.

Um abraço

Danyel Sak

vansaak@ip.pt

(Texto originalmente publicado jornal "Meios & Publicidade)


SORRY, VOCÊ É UM TECHNO EATER.

Caros Amigos:

Enquanto estava a cochilar junto a minhas mulheres e meus cães em plena chaise longue voltada para um pôr do Sol inebriante, vimos que todos ao nosso redor tornaram se Techno Eaters. Este têrmo foi cunhado já há algum tempo por uma pessoa muito próxima: eu.
Assim, você pode estar muito contentinho ao acordar, com a sua pasta de dentes CleanPower, o seu autoclismo cromado TotalSilence, o seu chuveiro com jactos de prazer prazeirosamente prazeirosos Directwater, os seus talheres com design da Alsácia StatusEating, o seu automóvel ultra potente com motor Injectionfull, a luzinha verde OnTime que acende imediatamente na portagem, a sua secretária anatómicamente curvilínea WorkPro, as máquinas ajustadíssimas da sua empresa ProductionFast, o seu computador Premiumbite, o seu browser Talkfast, a luzinha verde Ontime RoundTrip que acende automaticamente na portagem de volta, o seu elevador Highsilence, a sua fechadura OneMagicLap, o seu fogão Warmperfect, a sua geladeira FrostArtic, o seu sofá HiperCousy, o seu televisor com imagem RoyalReal, o seu vidro AntiReflex, as suas cuecas/calcinhas) Skinsatin, o seu colchão Softdreams e o seu copo (onde coloca a dentadura BrightTeeth) Glasscrystal.
Sim, você, sem preceber, tornou se um Techno Eater: come tecnologia estrangeira 24 horas
por dia. Aliás, alguns já não comem: engolem.
Isso é apenas uma evolução daquele senhor que você encontrava há tempos, todos os dias nos produtos aliementares que consome: o "Importado Por": aquela etiqueta branca que contém a tradução dos ingredientes e o "modo de fazer" e que substituem departamentos de pesquisa inteiros, desenvolvimento de tecnologia, máquinas, centenas de pessoas. E apenas necessitam:

O tal Senhor para contactos
1 Telefone/Fax/E mail
1 impressora caseira para fazer as etiquetas "Importado Por" e a respectiva tradução do produto
1 caixa de etiquetas para impressora
1 Rapaz para operar a Impressora

Mas você vai dizer "E nós?" Bem, nós desempenhamos o papel importantíssimo de Techno Eaters.
Então, mostre um sorriso (que contém a prótese dentária SuperWhiteBright, sure), abra a boca e Bon Apetit. Burp!

Um Abraço,

Danyel Sak vansaak@ip.pt


A TARA DAS LETRINHAS.

Caros amigos:

Enquanto estava a repousar junto às minhas mulheres e meus cachorros, recebi
alguns mails sobre uma Crónica anterior minha, que versava sobre o
renascimento do design dos automóveis (a do Túnel de Vento). E
solicitaram me algumas considerações a mais.
Recordei me então da actual (perdão leitores, mas sei que compreenderão)
Tara das Letrinhas.
Antes os automóveis tinham compreensíveis e mais que suficientes
referências: SS (Super Sport), SL (Super Luxo), V8 e mais uma ou outra
referência.
Mas com o tempo, a tal praga das letrinhas multiplicou se mais rapidamente
que vírus de sexo nos computadores das empresas.
Quem deve ter espalhado foi algum engenheiro de motores que, farto de sopa
de letrinhas que o obrigavam a tomar na infância, resolveu descontar a sua
ira na humanidade sobre rodas.
E o pior é que a tal humanidade aderiu, mesmo sendo as letrinhas verdadeiros
hieróglifos, incompreensíveis para a maioria dos mortais: HDI, CLK, TT, SW,
SLE, SI, XLS, CA e por aí vai.
E mais: hoje em dia as letrinhas chegam ao ponto de proporcionar status a
quem as possui. No momento, o rei das letrinhas é o tal do TDi.
Olhe, um conselho: se você não tiver o tal do TDi pregado na carroceria do
seu automóvel, melhor deixar o seu carro na garagem e pegar um autocarro ou
ir à pé. É menos humilhante.
Porque o seu automóvel pode ter tudo: ar condicionado graduação Ártico,
serviço de bar e restaurante, cinema 360º, massagistas. Mas se não tiver a
tal plaquinha TDi, será olhado com cara de nojo até pela velhinha que está
na passadeira a atravessar a rua.
Com isso, o tal TDi fez com florescessem dois mercados: o dos psicólogos e o
dos fabricadores das plaquinhas das tais letrinhas.
A neura de não ter a tal plaquinha TDi é tanta, que o paciente ao sentar se
no divã, primeiro olha automaticamente para ver se é um divã TDi.
Já os fazedores de plaquinhas TDi estão a fazer a festa: fabricam no vão de
escada estas 3 maravilhosas letrinhas e logo a seguir o seu possuidor vai ao
bate chapas mais próximo para pregá las no seu carro. Perdão: com as
letrinhas agora já não possui um carro, mas sim um automóvel.
Mas atenção: o "i" tem que ser obrigatóriamente minúsculo. Ninguém sabe ao
certo o porquê, mas o facto é que se for maiúsculo será falso, a potência
não estará garantida e o mais importante: saberão que possui umas letrinhas
TDi falsas; o que é pior que não possuir letrinhas TDi.
Assim, mesmo que possua uma carroceria que de tão enferrujada dá tétano a
quem olha, e um motor combinado Lada/Trabant pré revolução comunista, com as 3 letrinhas o status estará assegurado. Até, é claro, surgirem as próximas
letrinhas da moda.

Um abraço
Danyel Sak vansaak@ip.pt


A SÍNDROME DE SALSICHA, OS INDUSTRIAIS E OS GESTORES.

Há pouco um industrial procurou me e assim tive que deixar um pouco minhas
mulheres e meus cachorros para verificar o que se passava.
Logo ao encontrá lo logo diagnostiquei: a Síndrome das Salsichas atacava
outra vez.
O que ocorre é que o Industrial/Gestor está totalmente imerso em seu
negócio: sejam eles roupas, calçados ou salsichas.
Isso faz com que ele pense em salsichas o dia inteiro, viva as salsichas,
coma as suas salsichas, respire as suas salsichas e durma com as suas
salsichas. Nada mais justo.
Porém, ao haver o encontro entre Consultor/Industrial Gestor isto pode
causar alguma dificuldade. Pelo facto do Industrial/Gestor preocupar se
continuamente, pode gerar uma ideia fixa que acabará por não solucionar o
problema que pretende.
Expliquei a ele então que é exactamente como quando queremos dormir e
estamos sem sono: quanto mais insistimos em dormir, mais insónia temos.
Continuei a explicar então que ele deveria expor me todos os factos, de uma
forma clara e tranquila pois ele estava com a Síndrome de Salsicha.
O Industrial está claro, sorriu, o que serviu para descontrair o ambiente.
E assim foi: expos me todos os factos, dados e preocupações do seu produto.
E logo de imediato veio a tradicional angústia: "e então? e então?".
É nesta hora, expliquei, que devemos enfrentar a Síndrome de Salsicha. Por
isso sempre é bom, ao final das reuniões reservar um bom tempo.
Disse "olhe, vamos abaixo ao café". Falei, claro, como se não quisesse nada.
Ele concordou e descemos.
E então, enquanto sorvíamos umas bicas, começamos a conversar
descontraidamente sobre tudo: viagens, hobbies, música e porque não?
Salsichas.
O facto é que, sem notar, este Industrial, após passar a primeira parte do
briefing de forma séria, porém, infelizmente austera em demasia (o que gera
um bloqueio muito grande), na cafetaria passou a abranger minúcias
importantíssimas de seu produto.
Pronto: a Síndrome de salsicha estava quebrada. Havíamos vencido.
De posse dos dados, a solução encontrada foi perfeita e resultou: vendeu. Só
poderia ser assim.
E hoje, quando toca o telefone, deixo as minhas mulheres e meus cachorros
por instantes, atendo ao telefonema e escuto uma boa gargalhada dele que,
antes de tudo diz "Vencemos a Síndrome de salsicha!!".

Um abraço

Danyel Sak
vansaak@ip.pt


Os Vampiros dos Sonhos

Caros Amigos:

Há algum tempo li um artigo sobre os vampiros do quotidiano. Mas não os clássicos sugadores de sangue. Não; falo aqueles que são de carne e osso e que sugam as energias das pessoas.
Quem leu o tal artigo que posteriormente virou um livro viu toda a catalogação e tipos que existem e sabe do que se trata.
Refletindo sobre isso, há algum tempo atrás descobri que também estão entre nós os Vampiros dos Sonhos.
Como sei disso? Porque encontrei alguns deles. Mas digo que não foi fácil. Simplesmente porque o meu objetivo não era encontrar nenhum. Aliás, como poderia encontrar se nem mesmo sabia que eles existiam...?
Então surgirá a pergunta "mas então como vou saber se eles existem...?. Simples: basta ter um sonho. Não é daqueles sonhos de deitar, dormir, sonhar e acordar. Não. Falo dos sonhos que você tem entre um dia e outro de trabalho. Não cito quais, pois cada um sabe dos seus.
Então você pensa neles, sonha com eles e após um determinado tempo até começa a trabalhar para que eles se concretizem.
Mas, de repente surgem os vampiros de sonhos. Sim, eles são humanos, pessoas comuns.
Aparecem e começam a fazer parte do seu sonho. Seja porque você os procurou porque esta pessoa poderia ser uma peça importante da construção, ou porque ele acabou aparecendo no seu caminho atraído pelo seu sonho.
No início você vai pensar que são pessoas comuns (e realmente são) e começa a interagir com elas. Após algum tempo você sente que algo está estranho, mas não sabe direito o que é. Passado mais algum tempo a sensação começa a tornar se mais forte, pois em plena construção do seu sonho você esforça se muito para um lado e quando percebe, ele esvazia se de outro.
Mesmo assim, continua esforçando se e ele esvaziando se. Passado mais um tempo você começa a perceber que este tipo de comportamento segue um padrão.
E logo ao seu lado, sem você perceber, o vampiro estava a sugar o seu sonho.

Mas porque os Vampiros dos Sonhos agem assim?

Na verdade é um assunto muito complexo, mas há pistas suficientes para evitá los, que no fundo é o que nós queremos, certo?
Não estamos a nos referir aos, por exemplo, casos clássicos de sócios, em que, estes sim, buscam a usurpação do seu sonho. Ou dos casos quotidianos de patrões x empregados. Falamos mesmo do seu sonho.
Na verdade ele não quer sugar o seu sonho: ele quer sugar a sua energia para canalizá la para o sonho dele. Ou então simplesmente para que ele não se concretize. Assim como o vampiro suga o seu sangue para manter a energia dele.
Como foi citado acima, você está construindo de um lado e ele sub repticiamente está a sugar a energia.

Mas porque nos sentimos atraídos pelos Vampiros dos Sonhos?

Porque eles não se apresentam como vampiros e sim como pessoas comuns, que na realidade são.
A quantidade de Vampiros de Sonhos e a indumentária com a qual se apresenta, depende de país para país. Mas uma coisa é certa: assim como a Transilvânia possui fama por ser um dos seus berços dos vampiros dos filmes, o mesmo ocorre com os Vampiros dos Sonhos: alguns países tem uma quantidade muito maior que outros.
Após travar conhecimento com eles você verá um comportamento padrão: a ilusão de que a ajuda deles será crucial, que o seu conhecimento/apoio será um catalisador para acelerar o processo do seu sonho. E que ele realmente compartilha do mesmo sonho que você.
Exatamente por isso nos sentimos atraídos: queremos juntar forças.

O que fazer para parar o processo do Vampiro de Sonhos?

A detecção é muito difícil e principalmente leva tempo. Na realidade o mais certo é você passar por uma experiência destas e na próxima estará com o seu radar interno mais ligado e detectará a tempo.
Se você for realmente perspicaz, fará como os caçadores de vampiros que vê nos filmes: parar um pouco e começar a sentir. Apenas sentir.
Após algum tempo, começar a observar em volta e aí sim, as pistas que você não conseguia ver surgem a sua volta. Na verdade elas não surgem: elas estavam o tempo todo à sua volta, mas você não as viu porque estava muito ocupado na construção do seu sonho.

Mas é possível vencer os Vampiros de Sonhos?

Sim, é possível, mas a um custo muito grande. O aconselhável é o que foi recomendado acima: simplesmente parar.
Caso você detecte e continue o que ocorrerá é que estará atrelado ao Vampiro dos Sonhos.
Neste caso, para conseguir o objetivo dos seus sonhos, deverá trabalhar triplicado em relação ao esvaziamento que ocorre. Como um pneu furado: se ele esvazia a um ritmo, você deverá estar a encher a um ritmo muito maior. O problema é que executar isso continuamente o deixará esgotado, pois do outro lado o esvaziamento é constante.
E o pior: quando finalmente você atingir o seu sonho atrelado ao Vampiro de Sonhos, estará tão cansado, que o seu sonho não será aquele que imaginou ao início: ele será outro. Terá se transformado em uma coisa completamente diferente do que você almejava no início.
E o mais importante: os sonhos tem um componente de prazer muito grande. E este sonho transformado não possuirá mais aquele prazer que você buscava. Que foi a centelha que o fez começar a busca do sonho.
Assim, mesmo a ganhar, você na verdade estará a perder.
O melhor conselho é parar e recomeçar com o radar redobrado após a experiência.

Epílogo

Caso você se encaixe no perfil do Caçador de Sonhos, certamente mais dia, menos dia encontrará alguns Vampiros de Sonhos no seu caminho.
Você passará por um processo que certamente recordará.
Assim aproveite este processo para recolher impressões e da próxima vez saber reconhecer um deles e simplesmente desviar se de seu caminho.
Foi o que aconteceu recentemente ao encontrar mais dois deles.
O caso mais interessante transcorreu em uma viagem de comboio: entrou, como sempre sorridente, bem apessoado, e a demonstrar cabalmente que possuia o sucesso. Sentou se na poltrona ao lado e começou o diálogo.
A conversa versava sobre o sucesso e que você seria bem vindo com a sua colaboração para galgarem juntos este caminho brilhante. Sempre acompanhado de entrega de cartões de visita e exemplos e mais exemplos de sucesso.
Mas, à medida que as horas de viagem passavam e a conversa transcorria, o Vampiro de Sonhos, ao perceber pouco a pouco que foi descoberto, começava a encolher se timidamente.
Mas como sempre procurava não demonstrar isso.
Ao final de algumas horas de viagem, o Vampiro de Sonhos, sem deixar transparecer que estava desconcertado, despediu se muito polidamente e sempre dizendo "vamos manter contato o mais breve e ainda mantinha o sorriso pendurado forçosamente enquanto se afastava pela plataforma.
Nunca mais apareceu: desta vez as estacas verbais, afiadas e fincadas no lugar certo o enterraram para sempre.

Um abraço
Danyel Sak vansaak@ip.pt


Os cabeças de vento

Caros amigos:

O outro dia estava a passear com as minhas mulheres e meus cachorros quando
vimos um maravilhoso Pontiac descapotável vermelho a passar. Na verdade,
todas as cabeças viravam para vê lo.
Pensei e comprovei comigo mesmo: os automóveis da década de '50 a '70 eram
um colírio para os olhos.
Dizem que eram projectados de acordo com as curvas femininas. Realmente, é
só olhar para as formas estonteantes de alguns deles com o Cadillac,
Corvette, Bel Air e vemos cinturas derrapantes e saliências deliciosamente
provocativas e exuberantes.
Mas nestas mais recentes décadas ao que parece, os engenheiros deram um
golpe bolivariano e prenderam e congelaram os designers industriais em uma
câmara criogenizada (como o Walt Disney). E a seguir, libertaram a sua arma
favorita: o famigerado Túnel de Vento.
Claro, a engenharia é um componente essencial, mas como tudo, usada em
excesso causa dependência. Com isso, o tal Túnel de Vento saiu do controle e
virou uma verdadeira borrasca de vento que varreu as linhas dos automóveis
para baixo do tapete de borracha.
E a primeira grande consequência foi, ao abrir as revistas e ver os anúncios
de automóveis: estava de costas. Eram como as capas das Playboys
brasileiras: todos virados de costas e a mostrar a derriére; a tal bunda.
Claro, como iam mostrar a frente ou o lado dos automóveis, se eram todos
praticamente iguais, como mulheres siliconadas.
A verdade é que os cabeças de vento, perdão, Túnel de Vento tinham vencido.
Acredito até que, para economizarem, uma fábrica emprestava para a outra o
tal tunelzinho de vento. Afinal, os automóveis eram iguais mesmo.
Mas, de tanto ser usado e abusado, o tal Túnel de Vento não deve ter
resistido: deve ter quebrado e ido para o conserto. E os designers
industriais congelados, aproveitaram esta oportunidade, arrombaram a porta
das celas criogenizadas e novamente tomaram o poder.
Pelo menos é o que se pode ver nos mais recentes modelos: formas bonitas,
feias, maravilhosas, estranhas. Mas novas formas, formas diferentes, um
maravilhoso reflorescimento criativo. Até, é claro, que o tal tunelzinho de
vento volte do conserto.

Um abraço
Danyel Sak vansaak@ip.pt


VAMOS SER ETÍOPES.

Caros Amigos:

A Etiópia não foi convidada para a cúpula dos países ricos. Mas em pelo
menos um sector, deveria ser convidada a falar sobre o seu case nacional: as
Olimpíadas.
Afinal, como é que a Etiópia poderia se destacar nos esportes tendo uma
dieta nacional tão lightésima? Simples: especializando se no que tem de
melhor: pessoas resistentes. Desta conclusão foi um pulo, ou melhor, uma
corrida, para a conquista de medalhasolímpicas.
Assim, como publicitário e consultor, se aplicarmos esta Lei Etíope aos
negócios, acabaremos por perguntarnos porque é que aqui ainda não somos
especialistas certos sectores, e até avançamos para outros países?
O estômago é um bom início para responder a questão acima: afinal, neste
país não nos orgulhamos da comida e do modo como ela é bem preparada? Até os estrangeiros comprovam isso.
Exactamente por isso poderíamos ter algumas Multinacionais únicas e de
grande sucesso.
Um caso exemplar são os Pastéis de Belém.Porque até hoje não temos filiais
dos Pastéis de Belém pelo país afora?
Claro, gostamos muito da atmosfera dos Pastéis de Belém original. Mas, como
outro qualquer negócio, nem sempre podemos nos deslocar até lá. Então lá
vamos nós para a pastelaria da esquina.
Na verdade, se tivessemos filiais dos Pastéis de Belém por todo o país,
certamente iriam ocorrer duas coisas:

1. Nunca mais levaríamos o nosso regime á sério
2. Os Pastéis de Belém certamente iniciariam uma caminhada a caminho da
internacionalização.

Mas, diriam alguns, com a boca cheia de creme: "Mas internacionalização dos
Pastéis....?"
Tudo pode ser comprado e vendido se embalado em um bom marketing. E se tiver um bom produto, melhor. Veja o exemplo daqueles discos achatados de carne chamados "hamburgers" ou daquele líquidos negro chamado "cola" vendidos pelo mundo afora.
Ainda bem que em um e outro ponto do país já podemos ver alguns casos de
expansão moderadíssima, como é o dos leitõezinhos da Bairrada e das Sopas.
E para finalizar, cito umAliás, um um facto que vi há tempos:

Se você fôr alguma vez a Segóvia, repare em uma coisa. Para ir à parte
histórica da cidade, antes você passa pela parte nova.
Pois bem, quando termina a parte nova e se inicia a subida para a parte
antiga, encontramos uma pequena rotunda divisória com uma estátua. Pensamos "Deve ser mais um daqueles cavaleiros cruzados que libertou a cidade".
Vamos nos aproximando e a silhueta da estátua que está a se formar não se
parece com isto, é mais uma pessoa, um senhor. Quem sabe seja o primeiro
Presidente da Câmara ou o bispo local.
Chegamos ainda mais perto e vemos que a estátua se compõe de um senhor e
vários leitãozinhos. Como...?? Isso mesmo.
E depois de perguntar acabamos por saber que este senhor e sua família são
os donos do mais famoso restaurante local e do prato mais apreciado:
cochinillo asado. Ou seja: o leitãozinho. E que grande parte dos turistas,
não vem somente pela Catedral ou pelo Aqueduto Romano: voltam mesmo é pelo tal cochinillo.
E a cidade agradecida, acabou benemeritamente por fazer a estátua para
homenagear o senhor e seus cochinillos. Haja leitõezinhos.

Um abraço
D
Danyel Sak vansaak@ip.pt


Valeu, Bob!

Lembro que quando era pequenininho, de repente surgia a notícia que no dia seguinte íamos ao Centro do Rio fazer compras. Ah, era algo inesquecível.
Coisa de não dormir à noite só de pensar no dia seguinte. Tão bom quanto ir à praia.
Então, acordávamos bem cedo e lá íamos nós passear pelo Centro do Rio, entre lojas, carros e avenidas enormes.
Haviam dois pontos altos no passeio. O primeiro eram as Lojas Americanas (que existem até hoje e se tornaram uma rede enorme).
Elas tinham de tudo. E depois das compras sérias, chegava a minha vez: ir direto aos brinquedos. Aquilo era um sonho, muito mais emocionante que as lojas Tóyrus.
Era um corredor enorme com todos os tipos de brinquedos, desde os mais simples como os piões de madeira, passando por todos os instrumentos musicais, até chegar no máximo: todos os tipo de autoramas.
Depois de passar por ali, saía se flutuando e então vinha o segundo ponto alto do passeio: a ida ao Largo do Machado ou ao Flamengo.
Mas o que tinha de tão especial no Largo do Machado ou no Flamengo? Era um lugar diferente na hora de comer. Um lugar chamado Bob's, aquela coisa nova chamada lanchonete e que depois virou fast food.
O Bob's era o máximo. Depois quando cresci, fiquei sabendo a história dele:
Um americano chamado Robert (Bob) Falkenburg (o nome já parece predestinado ao negócio) morava no Rio. E um dia, resolveu montar a lanchonete no estilo das americanas. E foi até a América, importou tudo e montou o negócio: um sucesso. Aliás, um sucesso muitos e muitos anos à frente de todos.
Mas o Bob's era mais que isso. As pessoas trabalhavam (trabalhavam? Se estavam sempre sorrindo e brincando, com aquele jeito carioca...e não era sorriso de plástico) de macacão branco impecável e tênis conga branco; uma moda à frente do seu tempo.
E como a onda dos fast foods nem existia, o Bob's tinha um jeito todo
especial, só dele. Não só por introduzir no cardápio o chá gelado (que
somente décadas e mais décadas depois viraria moda no mundo todo) como também na quantidade da comida.
Como assim? A comida e os sanduíches não eram estandartizados. Ou seja: a porção do sanduíche e das fritas era no olhômetro.
Daí, pedia se uma porção de babatas fritas e ela não vinha sempre com aquele tamanhinho...não! A pessoa que servia, caprichava mesmo. As batatas (deliciosas) eram servidas dentro dos copos de papel de 300ml (um charme) e junto vinha um garfinho de plástico vermelho com o logo do Bob's para a gente comer. Era batata que não acabava mais.
E se pedisse para o rapaz colocar mais, ele colocava sem fazer cerimônia e ainda sorrindo.

Eram tempos em que o queijo do hamburger vinha caprichadíssimo, em gande quantidade, como tudo o que eles serviam: o Bob's era simpático e fraterno e muito generoso.
Os anos se passaram e o Bob Falkenburg acabou conseguindo outro sucesso: casou com uma das mulheres mais bonitas do Brasil (e certamente com um dos sorrisos mais doces e bonitos): a Silvia Falkenburg.
Enquanto isso eu cresci e o Bob's sempre dando uma mãozinha: dias de Carnaval, quatro noites pulando sem parar (isso sem contar pular durante o dia na Banda de Ipanema e Banda do Leblon).
Eu e a Cinthia saindo dos Bailes desidratados, cansadíssimos e com fome decarnavalesco. E, claro, lá íamos nós para a porta do Bob's, aindafantasiados, esperar ele abrir e comer alguma coisa enquanto víamos o dia jáclaro. Dias maravilhosos.
Os anos passaram, passaram e o Bob's acabou sendo vendido para uma multi.Muita coisa mudou, as porções standartizadas, as roupas e os fast foods quesurgiram pelo mundo todo.
Mas mesmo assim, o hamburger e as fritas continuam bons. Foi o que eu e aCinthia concluímos quando fomos visitar o Bob's que abriu por aqui. Eentre um hamburger e outro lembramos destas e muitas outras histórias deliciosas. Valeu,
Bob!

De momento (Janeiro de 2003) o autor não mantém a opinião sobre o hamburger servido localmente.

Um abraço
D.
Danyel Sak vansaak@ip.pt


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