Tio Olavo 9
por Edson Athaíde
 

O que a Web não pode fazer

O tema, apesar de velho, continua quente: o que é ser online? Para encontrar a resposta é preciso lembrar que estar online não é o mesmo que ser.

Há muita gente por aí que está online sem ter a mais pequena ideia do que é a Web. É como se as pessoas comprassem torradeiras a pensar em fazer sumos. Ou ligassem a televisão para perfurmar a casa.

A última edição da revista The Economist trata de parte desta questão. O título do artigo não poderia ser mais claro: "O que a Intemet não pode fazer". O que, de certa forma, já é uma formulação algo interessante. Até há bem pouco tempo, o importante era promover as infinitas utilidades da Internet. Mas, afinal, se a Web pode fazer realmente um zilhão de coisas, não pode fazer tudo.

O texto da The Economist trata de uma parte muito interessante da questão: o falhanço generalizado dos grupos de entretenimento e media na exploração da Internet. O assunto é tão ou mais importante se levarmos em consideração que boa parte dos investimentos depositados na Web foram justamente dos grandes players de media e entretenimento.

Os problemas são muitos e variados: desde a disponibilização grátis de conteúdos que até então deveriam ser pagos (jornais, revistas e outros tipos de publicações); a ainda difícil disseminação de conteúdos de imagem (falta uma tecnologia fiável, robusta e de fácil popularização), a questão dos custos agravados de distribuição dos livros (o caso de falência permanente da Amazon é elucidativo); o fio da navalha em que vivem os sites de conteúdos de som (queiram os internautas ou não, é muito difcil imaginar um mundo em que os direitos autorais não existem e que artistas e gravadoras achem um bom negócio investirem os seus talentos e dinheiro na produção de músicas que depois serão ouvidas e gravadas até à eternidade sem reverter um só tostão para os seus bolsos) e a barreira de dificuldades que os promotores de grandes eventos desportivos estão a estabelecer para impedir a exibição dos seus conteúdos na Internet (as Olimpíadas não estarão na Net, assim como a FIFA ainda não decidiu o que irá fazer em relação ao assunto).

Acresce se a tudo isto o facto de as pessoas não estarem dispostas a mudar do dia para a noite os seus comportamentos e não acharem muita graça deixarem de ir ao cinema, por exemplo, para ficarem ligadas à frente de um computador para ver imagens do tamanho de uma caixa de fósforos e com a qualidade de uma TV com interferências.

A verdade é que os melhores exemplos de conteúdos de informação e entretenimento na Web ainda são aqueles que não tentam substituir tudo aquilo que existe na sociedade real e sim aqueles que trazem uma linguagem e um formato totalmente novos. É o caso do projecto "Big Brother", da Endemol. O programa de TV nada mais é do que uma consequência directa de um comportamento padrão na Web: a exibição da vida íntima das pessoas através dos sites de webcam. Não é de graça que os sites relacionados com o "Big Brother" são sempre um sucesso de acessos.

Fica então a mensagem para os grandes grupos de media portugueses: não basta ter sites no ar. É preciso que eles sirvam para alguma coisa.

É preciso pôr a cabeça a funcionar. Tendo em vista que não há exemplos internacionais de sucesso, a chave para a solução comercial dos sites de informação e entretenimento em Portugal terá que aparecer por conta própria. Aliás, aí está uma coisa que a Internet pode fazer: tornar o talento português numa referência mundial. Vou pagar para ver.

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Trash web

Tenho a teoria de que 99 por cento das pessoas são completamente loucas. E o um por cento que resta é também de gente doida, mas que disfarça muito bem. Deve ser por isso que a trash web avança de maneira galopante. Milhões de sites na web não passam de lixo com um bocadinho de purpurina. O que não quer dizer que não seja divertido navegar por eles e descobrir até onde vai a natureza humana.

Alguns destes sites malucos até têm a sua utilidade. É o caso do www.ovoneles.com.br, um site brasileiro que serve para que qualquer internauta descarregue o seu ódio em personalidades públicas. A mecanica é simples: você vota em quem acha que merece levar uma "ovada" (que pode ser um cantor chato, um político corrupto, um empresário malvado, tanto faz); daí é feito um ranking dos mais "ovados", lista que é divulgada pela imprensa brasileira em geral. O www.ovoneles.com.br é um site que recebe milhares e milhares de visitantes todos os dias e é uma boa (embora estranha) demonstração de até onde pode ir a tal democracia electrónica. Era simpático se um dia aparecesse o www.ovoneles. pt. Seria uma boa maneira de puxar as orelhas dos patetas aqui da aldeia. Além de tomar a web portuguesa um pouco mais popular e divertida.

Mas nem só de ovos vive o protesto via web. Embora de gosto mais do que duvidoso, pululam por aí os sites de "assassinatos". As aspas aparecem aqui para deixar bem claro que não estamos a falar de crimes reais e sim de homicídios virtuais. Um bom exemplo disso é o Assassin/Kill Celebrities (www.newgrounds.com/assassin/index.html). Lá você poderá descarregar os seus piores instintos através de um jogo. Os assassínios mais cotados do momento são o Bill Gates, a Britney Spears (esta eu também matava) e os Backstreet Boys.

Mais inofensivo, porém não menos ultrajante para as personalidades públicas, são os sites onde os famosos são exibidos nus ou em posições ridículas. O truque é velho mas funciona: apanham se fotos de celebridades, fazem se fotomontagens e depois colocam as na rede. No início, há alguns anos, uma série de boatos nasceram a partir destes sites de fotomontagens. Hoje em dia, só uma alma muito ingénua poderia acreditar que (a exemplo do que podemos ver no site 2z Fake Nude Celebrities, no http://a2z.a2z.st/ index.htm) a Jacqueline Bisset posaria a segurar os pincéis de dois amigos ou a Gwyneth Paltrow demonstraria com tal empenho a sua paixão por vegetais.

Na lista dos piores sites do mundo, podemos encontrar o www.webspawner.com, cujo dono orgulha se de ter o site mais estúpido do mundo. Na verdade a página resume se na ilustração de um camelo a dizer "ugh!" Não sei se é mesmo o mais estúpido de todos, mas confesso que trata se de uma boa tentativa.

Na mesma onda encontramos o wwwjesusdance.com que (surpresa!) apresenta nos a !Dança de Jesus!, através de uma série de animações onde podemos ver o bom e velho JC a bailar nos mais diversos ritmos. Outro óptimo site (ou seja, péssimo) é o www.inyourpants.com, que, além de pregar que ninguém deveria ter a obrigação de trocar de cuecas todos os dias, vende roupa interior em tecido sintético, perfeita para usar dias seguidos e depois ser deitada fora.

Como vê, passear pela web também pode ser uma excelente maneira de nos tomammos um bocadinho mais idiotas do que já somos (como se isso fosse possível). Aliás, deve ser por isso que dizem que a web é uma excelente demonstração de até onde pode ir a inteligência humana. Pelos vistos, não é lá muito longe.

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Quem diz que ninguém é perfeito é porque nunca viu um perfeito idiota."

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Ninguém está a salvo

Se Matrix foi o filme de ficção científica que melhor soube traduzir as novíssimas paranóias trazidas pelo universo ciber, assisti na semana passada a um filme que é uma verdadeira pérola na tentativa de interpretar o que se passa na cabeça dos jovens hackers de todo o planeta.

O filme (que é uma das fitas mais estúpidas que já vi) chama se justamente Hackers e parece que foi escrito por um teenager debilóide ou um guionista que só fez aquilo por dinheiro (que, já agora, parecia não ser muito). Mas, uma coisa tem que ser dita, o filme era sincero no que toca a projectar uma versão poeticamente pueril das actividades dos piratas cibernéticos.

Hackers (que pode assistir em DVD) até que é engraçado, traz a bela Angelina Jolie ainda menina e passa a limpo toda uma série de clichés que serve para se ter uma ideia do que as pessoas, que estão fora da revolução tecnológica e que mal sabem programar o aparelho de vídeo, pensam que seja o ambiente ciber.

Aliás, enquanto exercício antropológico pouco cientifico, Hackers é uma excelente peça de estudo. Se levarmos em conta que a primeira vez que Hollywood se dedicou a fazer um filme inteiro sobre a Internet foi o A Rede (com a deliciosa Sandra Bullock), no mínimo dá para estabelecer algumas ilações. Os dois filmes trabalham em cima da ideia que ninguém está seguro na web, que os computadores são facilmente manipuláveis, que toda uma série de novos crimes pode ser cometida através da Internet e que ninguém está seguro de ter a sua vida "apagada" e "reconstruída" pela acção de um pirata que saiba entrar nas redes informáticas que controlam os nossos documentos.

Parte desta trama passou a ser utilizada com alguma frequência em filmes de espionagem ou de aventuras, como os últimos 007 e o Missão Impossível. No limite, estamos a assistir a uma bela acção de propaganda que no mínimo irá levar a que o cidadão comum descubra com o que se ocupar, já que acabou a guerra fria e sabe que uma bomba atómica só cairá sobre a sua cabeça se um soldado bêbado russo cometer um descuido.

Apesar de todo o folclore apresentado por Hollywood, boa parte do que é dito nestes filmes é verdade. Biliões de dólares são gastos todos os anos na defesa contra os vírus informáticos criados por adolescentes borbulhentos, que em vez de, como fizeram os seus pais, dedicarem se ao nobre desporto de Onan preferem lixar a vida de quem precisa trabalhar com um computador para viver. Sem falar dos prejuízos causados pelos vírus que conseguem propagar se e que em horas podem transformar os seus arquivos em geleia de morango.

O site do Discovery Chanel (www.discovery.com) traz um interessante hall offame dos hackers de todo o mundo. Desde a Pré História (datada pelo Discovery como sendo antes de 1969) até aos dias de hoje, podemos "admirar" alguns dos feitos de alguns piratas famosos. A primeira coisa que me saltou à vista é que são todos feios. Deve ser por isso que Tom Cruise decidiu ser artista de cinema ao invés de ficar trancado no quarto a ficar azul frente a um computador. Através do site, podemos ver, por exemplo,a fronha do primeiro hacker a ser imortalizado pelo FBI com um cartaz daqueles de "procurado" que vemos nos filmes do Jonh Wayne. O fulano chamava se Kevin Mitnick e foi sentenciado com um tratamento num centro para viciados.

Outro cibercriminoso que podemos ver é o simpático Vladimir Levin, cuja cara assemelha se vagamente ao meu joelho. Vlad, um matemático graduado pela Universidade de São Petersburgo, divertia se com os amigos a entrar nos computadores do Citibank. Conseguiu roubar dez milhões de dólares (que pretendia doar aos pobres, é óbvio, confirmando o conceito de que a invasão de que a pirataria cibernética é feita para o bem da humanidade). O rapaz foi preso em 1995.

Conheço algumas pessoas que auto intitulam se hackers. Ou pelo menos que assumem já ter entrado nos computadores alheios para bisbilhotar os seus conteúdos ou pregrar algumas partidas. Descrevem as suas pequenas aventuras (completamente ingénuas se comparar mos com as acções do verdadeiros hackers) com alegria e sinais de gozo e satisfação. Sinceramente, acho estas acções as coisas mais idiotas que essas pessoas já fizeram na vida. A diferença entre a moral de um hacker e a de um fulano que destrói uma cabina telefónica é nenhuma. Ambos estão a danificar o que é dos outros e, em muitos casos, o bem público. A diferença é que o vandalo comum não fica armado em carapau de corrida, não faz manifestos de gosto duvidos e ideias turvas para defender as suas actividades. Ou seja, não passam pelo ridículo de quererem que a sociedade aceite as suas actividades como algo moderno e futurista.

Não estou a referir me aos piratas cibernéticos que entram na rede para roubar o dinheiro de quem faz comprar pelo comércio electrónico. Estes são ladrões, têm um objectivo de vida defensável ou não. Em última análise, são sinceros e, por isso, compreensíveis. Não fazem nada que uns bons anos na cadeia não resolvam.

O pior são os hackers românticos. Gente que pensa que não há mal nenhum, muito pelo contrário, em fazer idiotices de toda monta e que ainda conta para os amigos as suas estripulias. Se tivessem dez anos, mereceriam um puxão de orelhas. Como são pessoas com idade o suficiente de serem responsáveis pelos seus actos, apenas provam que a imbecilidade é o verdadeiro vírus dos novos tempos.

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Cuidado com os idiotas. Eles vão herdar o reino dos céus."

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Cibersexo

Sexo. Quatro letras, nada mais. O suficiente para descrever aquilo que ocupa 99 % do espaço útil na cabeça das pessoas. E também uma boa parte (se não a maior parte) do espaço Web.

É um senso comum: o sexo é o assunto mais pesquisado nos motores de busca de todo o mundo. E é também o único negócio de conteúdo virtual que dá lucro. Mas também está a tornar se num dos maiores problemas a nível de comportamento trazidos pela era digital.

Um interessante artigo da revista Veja, semana passada, traz alguns dados no mínimo preocupantes. Somente nos EUA existem cerca de 200 mil casos de viciados em cibersexo. Não estou a falar de gente que de vez em quando se desvia do sua navegação habitual na rede para ver o último vídeo pirata da Pamela Anderson. Estou a falar de mulheres e homens que não sabem mais, não podem mais, viver sem sexo virtual.

O cibersexo é uma mistura explosiva de encontros em salas de chats, pornografia de todos os tipos e troca de e mails eróticos. O dependente do cibersexo passa horas e horas em frente ao computador e desreprimir as suas taras mais íntimas e descobrir o prazer em coisas e pessoas que nunca chegará a fazer e a encontrar pessoalmente. Em geral, abandonam o convívio com a família e os amigos, têm queda de produtividade no trabalho e se a coisa se agravar pura e simplesmente tornam se incapazes de sair de casa.

Segundo um estudo da Univerdade de Stanford: os endereços eróticos facturam cerca de um bilião de dólares só nos EUA; 20 % dos usuários americanos frequentam sites de sexo; a cada hora existem 125 mil americanos a navegar num site pornográfico; 1 %o dos pesquisados assumem se como consumidores compulsivos de cibersexo, gastando entre 15 a 25 horas por semana com o assunto; 70 % do tráfego relacionado a sexo occorre durante o horário comercial; 70 % dos entrevistados escondem dos outros que utilizam a Intemet por motivos sexuais; as empresas americanas perdem cerca de um bilião de dólares por ano graças ao uso indevido da Internet pelos seus funcionários durante a hora do expediente e quase sempre este uso está relacionado com sexo; a maioria dos dependentes de cibersexo são homens.

Se já não bastasse tudo isto, também começam a aparecer de forma mais frequente casos em que psicopatas
"disfarçam se" de miúdas simpáticas para frequentar salas de chat, atraem as suas vitímas para encontros e tiram lhe as vidas.

Não há nada que me faça pensar que a realidade em Portugal é diferente. Um estudo mais aprofundado de certeza revelaria que o cibernauta português não é nenhum menino de coro.

Assim como o uso abusivo de álcool é um problema social, o uso excessivo da Internet deveria ser mais investigado. A distancia entre uma obsessão e a loucura é demasiado curta para que não seja encarada como um grande problema.

Por mais que a Internet traga coisas positivas, é preciso ter se em conta que também traz novas desgraças.Os médicos que estão envolvidos com o assunto dizem que é tão ou mais difícil livrar um dependente de cibersexo do seu vício como de uma droga vulgar. "O cibersexo é o crack da compulsividade sexual", declara o psicólogo americano A1 Cooper, especialista no tema.

Há que compreender que a Web é uma das maiores ferramentas de integração do conhecimento humano. Mas também pode ser uma poderosa arma de exclusão social. Quem é tímido e não consegue fazer amigos na vida real pode perfeitamente transformar se num sedutor Casanova numa sala de chat. Daí a não querer voltar a ser o que é na verdade e sentir se prisioneiro da sua personalidade virtual é um passo. Há que ter em conta que a maioria das pessoas que se declara mulheres durante um chat não passa de homens. O que torna a coisa ainda mais preocupante.

Leia só estes impressionantes depoimentos que alguns viciados em cibersexo deram à Veja: "Não consigo ficar um dia sem visitar os sites pornográficos. Sou escritor, perco muitas horas a navegar e a qualidade do meu trabalho vem despecando nos últimos anos"; "Sempre tive vitórias e recaídas na minha luta para me livrar da pornografa. Até que eu descobri como era fácil ter acesso a sexo pela Internet. Aí, rolei montanha abaixo."

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Se cada um conhecesse a intimidade sexual do outro, ninguém cumprimentaria ninguém."

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O esquimó e o frigorífico

1 Os jornais costumam chamar o Verão de silly season, a estação onde nada acontece senão coisas estranhas e estúpidas. Era assim no universo real, está a ser diferente no universo digital. Até porque no território virtual a silly season é o ano inteiro. Dia após dia, é imensa a quantidade de excentricidades e disparates pegados que ocorre em tudo o que é relacionado com as novas tecnologias.

Depois de algumas semanas de apocalipse total, devido a estupenda queda em bolsa da Amazon, mal o Yahoo! avisa que deu lucro e os players de mercado e os analistas vaticinam que afinal há luz no fim do túnel.

Estranho planeta este o da economia digital. Até onde sei sempre existiram empresas deficitárias e lucrativas. Independente da tecnologia que usam, é perfeitamente possível para um projeto empresanal gerar nqueza ou levar os seus proprietários a fugir do país com medo de irem presos.

O que se passa é apenas um excesso de ansiedade e adrenalina. A Amazon é provavelmente um dos maiores exemplos do que uma gestão temerária pode fazer com uma ideia empresarial. O senhor Jeff Bezos até pode dar a volta ao texto, mas cada vez fica mais claro que não saberia gerir nem uma quitanda quanto mais uma mega corporação multinacional. A Amazon é um típico caso de uma boa ideia (e um grande trabalho de marteting, no sentido especíco de construção de uma marca) e de uma péssima maneira de estar no mercado. Uma empresa que perde dinheiro cada vez que vende alguma coisa não é uma boa empresa. Um gestor que leva anos a sobreviver com o dinheiro dos seus accionistas sem ser capaz de ganhar um centavo a mais além daquilo que foi investido é um nabo.

O problema é que, neste caso, o nabo é um guru. E o problema é que os actores do teatro das novas tecnologias precisam tomo pão para a boca de gurus. Não se engane, o que se está a passar na economia digital não passa de uma crise de adolescência. Os miúdos brincaram à vontade com o dinheiro dos pais. Fizeram os maiores disparates. Até que a fonte de rendimentos secou. Hoje em dia, para se ter um mínimo de credibilidade para desenvolver projectos empresariais nas novas tecnologias é preciso ter alguns cabelos brancos. Ou, pelo menos, trabalhar com ou para quem tenha. E não basta ter os cabelos brancos, é preciso acreditar neles.

Quem fala isto não é um velho do Restelo. Tenho pouco mais de trinta anos e ainda dou para as curvas. Apenas nunca vi um computador transformar um péssimo gestor num gestor brilhante. Como nunca vi um porco andar de bicicleta, nem um fulano que só está interessado em especular sobreviver muito tempo a trabalhar numa lógica de gerir projectos reais e voltados para um mercado que não o financeiro.

Quanto ao Yahoo!, a coisa não parece uma excepção e sim uma confirmação das regras. Aqueles rapazes que inventaram o Yahoo! venderam o negócio há muito tempo e nada têm a ver com a realidade da empresa. Não passam de relações públicas simpáticos, milonários, e certo, mas que se tivessem de gerir uma sapataria abririam concordata em meses.

Espero que o Yahoo! continue a ser lucrativo e a tapar a boca de quem diz que o negócio da Internet é deficitário por excelência. Não é. Só são deficitários os projectos mal dimensionados, que gastam rios de dinheiro para dar de graça coisas que ninguém quer comprar.

Tente vender frigoríficos no Pólo Norte. Por melhor que seja a marca, por mais bonito que seja o seu produto, por muitas que sejam as conferências que dê a emanar a sua fé naquele mercado futuro, você vai dar se mal. Muito mal. E depois vai atirar a culpa para cima dos icebergues. Como se os icebergues tivessem culpa pelo facto de você ser louco, ingénuo ou simplesmente idiota.

2 Um importante player do mercado das novas tecnologias falou me esta semana de uma maneira de definir quem está investir no sector digital bastante mas não o suficiente. Disse me que há uma quantidade imensa de empresas em Portugal que não passam de "delícias do mar", aquela coisa congelada que vemos no supermercado que não é carne nem peixe. As empresas "delícias do mar" são aquelas que não querem estar fora das novas tecnologias mas que não querem gastar muito com isso. E fazem tudo para passar uma imagem de que estão dentro barco, quando na verdade ainda estão com os pés bem plantados no porto a discutir o preço da passagem.

Ser uma empresa "delícias do mar" é na verdade uma bela maneira de perder dinheiro. Tudo o que for investido com essa atitude cedo ou tarde irá revelar se num prejuízo nunca recuperado.

Quem não quer gastar dinheiro com as novas tecnologias mais vale estar quieto. E quando falo novas tecnologias não estou a referir me a equipamentos. Estou a falar em neurónios, estou a falar em construir coisas com base na inteligência. Talento, meu caro, é uma coisa cara, dificil de encontrar e raramente fácil de se reproduzir em cativeiro. Abrir um site, hoje em dia, qualquer um faz. Fechá los também.

Ou, como diria o meu Tio Olavo: "O importante não é tentar acertar. É errar cada vez menos."

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Web para seres humanos

Muito prazer. Caso não me conheça (o que é muito possível, tendo em vista que nem eu me conheço muito bem), o meu nome é Edson, sou muito parecido com o Tom Cruise (como pode ver na foto que decora esta crónica), publicitário de formação, marqueteiro, gestor de empresas de comunicação e de conteúdos para as novas tecnologias, cronista regular deste jornal e outras publicações e adepto do Flamengo (que é o que realmente importa).

A convite deste jornal, estarei todas as segundas neste espaço a escrever sobre a web, tentando lançar um olhar pouco técnico e mais humano sobre o universo digital.

Diferente de muitas pessoas, não sou um tipo que foi seduzido pela Internet. Fui na verdade violado. A web entrou me pela vida adentro sem pedir licença e sem maiores apresentações. Uma vez, há cerca de três anos, estava a falar com um cliente e dei lhe os meus contactos: telefone, fax e telemóvel. O fulano pediu o meu e mail. Disse lhe que não tinha. Aí então ele perguntou me com um ar meio lacónico (quase sem disfarçar o seu desapontamento) se eu era off line. Na dúvida, respondi lhe que não, que eu era brasileiro. Hoje em dia, sou aquilo que se pode definir como uma pessoa online. O que me preocupa, pois quem anda sempre na linha acaba por ser atropelado pelo comboio. Mas, online ou não, acredito piamente que a web é a maior revolução da história deste planeta (depois, é claro, da invenção da mini saia e do Magnum de chocolate branco).

Mas, como já disse um filósofo, uma ideia não é responsável pelas pessoas que acreditam nela. A web não tem nada a ver com os milhões de disparates que se fazem um pouco por todo o mundo a desonrar o seu santo nome.

Perdoe me a sinceridade, mas não existe nada mais estranho do que um fulano que se define como internauta. É como se alguém achasse normal chegar num jantar e apresentar se como "olá, meu nome é Manuel, sou um telespectador" só porque costuma ver televisão. Um intemauta não passa de uma pessoa (embora em muitos casos isso não esteja cientificamente provado). E como todas as pessoas, quem navega na Internet (ou faz negócios na web) deve lembrar se que a vida existe fora dos ecrãs de um computador. Quem tiver essa noção irá, de certeza, extrair da web o melhor que ela pode oferecer. Quem não tiver irá passar os próximos anos a falar de bits e bytes a chatear Deus e o mundo. Imagina se quem fabrica frigoríficos passasse a vida a explcar como funciona o seu motor.

Só existe uma web possível: a web feita por e para seres humanos. A web que é pensada tendo em consideração que as pessoas comem, dormem, nascem, morrem, espirram, tiram macacos do nariz, além de fazerem outras coisas que não fica bem lembrar num jornal sério como este. A web não é só uma questão de tecnologia. É uma questão de conhecimento. E, sempre que o homem descobre uma nova maneira de partilhar o seu conhecimento, a Terra gira mais rápido e a história avança sem medo.

Infelizmente, muito do que ouço ou leio sobre a web não passa de ruído, de mistificação. A quantidade de pessoas que emitem opiniões sobre a internet e que pensam que um browser não passa de um bolo de chocolate inglês é imensa. Há quem acha que a web não passa de uma ferramenta poderosa de iludir pessoas e fazer dinheiro. É uma pena que seja assim. Seria muito mais útil para para todos se os neurónios de todos fossem usados para encontrar novas soluções em vez de confirmar velhos erros.

Para esclarecer o meu raciocínio, transcrevo o "Manifesto Digital" que há tempos publiquei numa revista. Mais do que lições (quem sou eu para dar lições aos outros), são alguns conselhos que provam a velha máxima de que se conselho fosse bom ninguém dava, vendia. Mas, vamos a isso:

1) Enlouqueça pelo menos uma vez por dia (mas não deixe que ninguém perceba).

2) Desconfie de todos os que disserem que você está a ir rápido demais.

3) Não vá rápido demais.

4) Estude: aprenda tudo o que representa a antiga cultura analógica. Depois cuspa lhe no túmulo.

5) Tenha objectivos (de mercado, de vendas, de vida, de qualquer coisa, desenrasque se).

6) Todos os engenheiros são suspeitos. Respeite os.

7) Duvide: tudo o que aprendeu ontem à tarde foi sumariamente mudado ontem à noite.

8) A ansiedade do mundo em compreendê lo é inversamente proporcional à sua em compreender o mundo.

9) Seja diferente: fale numa língua que todos percebam.

10) Faça como o Bill Gates: não passe a vida a tentar ser um novo Bill Gates.

O fundamental é manter a cabeça aberta e acreditar que a humanidade irá mudar (já está a mudar) com o advento da nova sociedade de informação. Nada será tão estanque, tão perene. Mais do que nunca é preciso não ter medo da mudança. Pelo contrário. Se for esperto, pode ser um agente da mudança. Acredite, os dinossauros eram grandes e morreram. Os camaleões, não.

Ou como diria o meu Tio Olavo: "Na vida, fora o motorista, tudo é passageiro."

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"Gigolo,"de anúncios

Já lá vão cinco anos. Foi em 1995 que comecei a escrever crónias semanais sobre publicidade e marketing. Mas de há uns seis meses para cá, fartei me completamente da publicidade como tema. Do marketing passou me a interessar apenas a sua versão digital, daí que há tempos que as duas ou três pessoas que lêem esta coluna passaram a encontrar aqui comentários sobre a web e as suas consequências sobre as pessoas enquanto consumidores. Por uma questão de coerência, tendo em vista que o DN tem uma página diária específica para tratar do tema Internet, solicitei à Direcção deste jornal que a minha coluna fosse para lá transferida.

Dito e feito. Para a semana, se quiser ler os meus parvos comentários sobre o universo digital, terá que ir até às páginas finais do DN e encontrar me na secção Net. Todas as segundas lá darei expediente. Espero continuar a contar com a sua atenção.

Mas antes da mudança, que tal umas palavras finais sobre a publicidade?

Recentemente, no texto de introdução para uma entrevista minha no número 1 da revista Invista, fui apresentado como um quase ex publidtário. A coisa até faz sentido mas é um exagero. Sempre fui um apaixonado pela publicidade e foi com ela que sempre ganhei a vida. Sou um gigolo de anúncios. E tenho muito orgulho disso. Não sou eu que estou a mudar, é a própria publicidade que está a transformar se.

Há quem diga que a publicidade portuguesa precisa de uma nova revolução. Considero esta afirmação algo mal formulada.
Uma nova revolução pressupõe que já houve uma outra revolução que precisa de ser substituída.Uma revolução pressupõe uma acção rápida e violenta. E o que na verdade houve na publicidade portuguesa nos últimos dez anos foi uma evolução contínua que permitiu o aparecimento de um novo padrão publicitário e de novos profissionais a actuar no sector. Alguns preconceitos foram derrubados, novas maneiras de comunicar foram descobertas. Houve mais espaço para a originalidade. E houve espaço para muitos erros também.

Sinceramente, a maior parte das coisas que vejo no panorama publicitário actual não carece de criatividade, carece é de consistência. Como se para um anúncio ser bom bastasse ter notoriedade, aparentar ser caro ou tentar ser engraçadinho. Trata se da forma e dá se com os pés no conteúdo. E uma publicidade infantilizada, formatada segundo os padrões de uma revista publicitária ligeiramente idiota chamada Archive, que é a bíblia de 99% dos criativos publicitários de vários países. O problema é que o género de coisas que pode sair na Archive é muito limitado, pode se dizer que bitolado e não abrange todo o espectro de possibilidades do discurso publicitário.

A publicidade portuguesa não precisa de uma revolução. Precisa é parar de pensar bobagens e dedicar se ao trabalho.

De qualquer forma, quem é esperto e competente sabe que o futuro da comunicação comercial passará pelo desenvolvimento das novas tecnologias de informação. O resto não passa de bullshit. E conversa para boi dormir.

Ou como diria o meu Tio Olavo: "A caravana ladra enquanto os cães passam."

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www.fuckedcompany.com

A dica apareceu domingo passado na coluna Manhatan Connections do DN. Afinal há uma página na Internet inteiramente dedicada aos casos de insucesso nos negócios da Web.
O endereço do site é o que titula esta crónica. Fui lá ver se a coisa prestava.
Presta. E é útil, quanto mais não seja por demonstrar com clareza que nem tudo o que reluz é ouro no universo digital.
O FuckedCompany.com brinca claramente com o grafismo da FastCompany, uma das mais brilhantes revistas sobre os negócios da chamada nova economia.
O problema da FastCompany (como também da Wired e outras publicações do género) é justamente fugir de um oIhar crítico e rigoroso sobre o que se passa na Web.
Como se fossem instrumentos de evangelização (e são no), interessa mais a essas revistas destacar os casos de sucesso, as novas tendências, os novos gurus e outras novidades igualmente felizes.
Está bem, está bem, de vez em quando até dão uma no cravo, mas, via de regra, contentam se em bater na ferradura do futuro radioso.
Como bem diz o povo, no meio é que está a virtude. Não estou aqui para falar mal de uma coisa que tenho a certeza está a ser fundamental na constru,cão de um novo mundo.
Mas detesto coisas que não sejam lógicas. Uma coisa é acreditar que a Web é um território fabuloso para o investimento. Outra coisa é fechar os olhos e ir directo para o precipício das boas vontades. O busílis da questão é que há muita gente por aí a não querer pensar no assunto. E a pôr o dinheiro em projectos sem pés nem cabeça só porque são moderninhos.
Assim, rapazes, a coisa não vai andar.
Não sei se você conhece as revistas sobre as quais estou a faIar. De qualquer forma, deveria. As coisas são tão rápidas na Web que é preciso fazer um grande esforço para não ficar desactualizado. Ler boas publicações sobre a Web é uma coisa fundamental para quem pensa investir ou ganhar dinheiro com as novas tecnologias de informação (já agora, acrescente à lista de revistas indispensáveis a Bussines 2.0 e a Shift
Quanto ao FuckedCompany.com vale a pena visitá lo para ver que, mesmo na Web, quem não tem competência não se estabelece.
Um bocadinho de más notícias nunca fez mal a ninguém. Prefiro saber que a Web é um negócio de risco do que ficar a acreditar que na Internet tudo são flores. Até porque não é. Nunca foi. Nunca vai ser.
Ou como diria o meu Tio Olavo: "Quando a esmola é de mais o santo desconfia."